Decisão proferida pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça no AgRg no REsp 1618955/RS, julgado em julgado em 01/12/2016 (leia a íntegra do acórdão).
Confira a ementa:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TEMPESTIVIDADE. COMPROVAÇÃO. RECONSIDERAÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 74, § 1º, E 413, CAPUT E § 1º, AMBOS DO CPP. DECISÃO DE PRONÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA. RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. ART. 121, § 2º, IV, DO CP. QUALIFICADORA QUE NÃO É MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE SENTENÇA. Agravo regimental provido para reconsiderar a decisão agravada. Recurso especial provido para restabelecer a qualificadora prevista no art. 121, § 2º, IV, do Código Penal, disposta na sentença de pronúncia. (AgRg no REsp 1618955/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 14/12/2016)
Leia a íntegra do voto:
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR (RELATOR):
Em razão da alteração da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, esta Corte Superior passou a admitir também a comprovação da tempestividade do recurso por ocasião do agravo regimental contra a decisão que o considerou intempestivo (AgRg no AREsp n. 137.141/SE, Ministro Antônio Carlos Ferreira, Corte Especial, DJe 15/10/2012).
No caso, conforme comprovam os documentos juntados por ocasião do regimental (fls. 771/783), houve a suspensão dos prazos processuais no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entre 15/10/2015 e 23/10/2015.
Dessa forma, intimada a parte do acórdão proferido na apelação em 30/9/2015, fica evidenciada a sua tempestividade.
Prossegue-se, portanto, na análise da viabilidade do recurso especial.
O recorrente sustenta, em síntese, que houve violação dos arts. 121, parágrafo 2º, inciso IV, do Código Penal, e dos arts. 74, § 1º e 413, caput e § 1º, ambos do Código de Processo Penal. Alega que havendo vertente probatória apta a respaldar a incidência da qualificadora do uso de recurso que dificultou a defesa do ofendido, não poderia o Tribunal de origem reformar a sentença de pronúncia, uma vez que tal decisão interlocutória consubstancia mero juízo de suspeita, em que a aplicação do principio in dúbio pro societate determina que a resolução de eventuais dúvidas deva ser postergada e reservada à apreciação Tribunal do Júri (fl. 719).
Pede, por fim, que seja determinada a inclusão, na pronúncia, da qualificadora do uso de recurso que dificultou a defesa do ofendido.
Razão assiste ao recorrente.
De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é defeso ao Tribunal, ao examinar recurso em sentido estrito contra decisão de pronúncia, excluir qualificadoras, valorando provas e aspectos particulares do caso, porquanto tal competência pertence ao Conselho de Sentença, juiz natural da causa, sob pena de se usurpar as atribuições singulares do Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII, da CF).
A propósito:
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PRONÚNCIA. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA. EXCLUSÃO. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. 1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que a exclusão de qualificadoras constantes na pronúncia somente pode ocorrer quando manifestamente improcedente, sob pena de usurpação da competência do Tribunal do Júri, juiz natural para julgar os crimes dolosos contra a vida. 2. Pela leitura da sentença de pronúncia e do acórdão recorrido, não é manifestamente improcedente a incidência da qualificadora da surpresa. O fato de a vítima, ao receber voz de prisão, ter reagido apontando uma faca para os réus, momento em que foi alvejada, por si só, não exclui a qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa do ofendido. Assim, havendo na r. decisão de pronúncia menção expressa às provas que indicam terem os acusados, em tese, cometido o delito de homicídio, mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, não se revela despropositada a submissão, ao Conselho de Sentença, da imputação, nela incluída a qualificadora insculpida no art. 121, § 2º, inciso IV, do CP. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp n. 1.491.996/GO, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 1º/6/2016)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HOMICÍDIO. PRONÚNCIA. QUALIFICADORA. RECURSO QUE DIFICULTOU OU TORNOU IMPOSSÍVEL A DEFESA DA VÍTIMA. EXCLUSÃO. NÃO CABIMENTO. SOBERANIA DO JÚRI. 1. Segundo a jurisprudência desta Corte de Justiça, somente podem ser excluídas da sentença de pronúncia as circunstâncias qualificadoras manifestamente improcedentes, uma vez que não se pode usurpar do Tribunal do Júri o pleno exame dos fatos da causa, por ser constitucionalmente o Juiz natural dos crimes dolosos contra a vida. 2. A qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do artigo 121 do Código Penal caracteriza-se pelo comportamento insidioso do agente, no sentido de criar para a vítima uma situação imprevisível, que torne difícil ou impossível a sua defesa, a fim de obter maior êxito na empreitada delituosa. 3. No caso, a existência de eventuais desavenças anteriores não afasta, por si só, a possibilidade de aplicação da referida qualificadora, mormente quando existem elementos indicativos nos autos de que a ação criminosa ocorreu mediante surpresa, quando a vítima estava em seu quarto, na cama, dormindo. 4. Assim, existindo indícios de que a agravante agiu de modo a dificultar ou impossibilitar a defesa do ofendido, não há como decotar a qualificadora em questão, impondo-se a submissão dos fatos à Corte popular. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp n. 765.638/BA, Ministro Gurgel de Faria, Quinta Turma, DJe 28/10/2015 – grifo nosso)
Observa-se que o Tribunal a quo não justificou devidamente a exclusão da qualificadora, a qual não reputo como manifestamente improcedente.
Dispôs a Corte estadual que, no caso, não há como incidir a qualificadora do uso de recurso que dificultou a defesa da vítima, porque quatro dias antes do homicídio, a vítima já fora alvo de disparos proferidos pelo acusado.
Ocorre que, independentemente do fato ocorrido quatro dias atrás, no momento do crime, como bem relatado pela Desembargadora que teve seu voto vencido, o ofendido estava em sua casa, acompanhado de seus filhos e, por volta das 23h45min, o réu, de inopino, passou a desferir inúmeros disparos contra Clóvis, surpreendendo a vítima, ceifando sua vida (fl. 704).
Sendo assim, uma vez que a qualificadora não é manifestamente improcedente, deverá ser submetida ao Tribunal do Júri.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo regimental para reconsiderar a decisão agravada e dar provimento ao recurso especial para restabelecer a qualificadora prevista no art. 121, § 2º, IV, do Código Penal, disposta na sentença de pronúncia.
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