Notícia do dia 09/05/18, publicada no site do STJ (leia aqui). Opinião do prof. Evinis Talon no final.
Por unanimidade de votos, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso em habeas corpus interposto por um preso contra decisão que determinou sua transferência de Pernambuco para Santa Catarina.
Preso preventivamente por suposta participação em organização criminosa voltada para o tráfico internacional de drogas, o homem alegou que residia em Recife, cidade na qual também mora sua família e está situado o escritório de seus advogados.
Instrução criminal
Ao negar o pedido, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região entendeu que o direito do preso provisório de permanecer em estabelecimento próximo aos familiares não é absoluto, sobretudo quando a medida for necessária à instrução criminal.
Segundo o acórdão, “a magnitude da investigação, com pluralidade de fatos e réus, a demandar inúmeras diligências durante o processamento da ação, e o fato de que o sistema de videoconferência depende da disponibilidade limitada de sinais de satélite e de condições técnicas nem sempre disponíveis ao juiz da causa, demonstram que o recambiamento do preso provisório para estabelecimento prisional na sede do juízo mostra-se, de fato, necessário à célere e regular persecução criminal – a exemplo do que já ocorreu com outros investigados”.
Videoconferência
No STJ, o relator do recurso, ministro Nefi Cordeiro, entendeu de forma diferente. Segundo disse, a justificativa de facilitar o acompanhamento da ação penal não é suficiente para autorizar o deslocamento. Ele destacou ainda decisão da primeira instância que, no processo, determinou que os acusados presos irão acompanhar as audiências de inquirição das testemunhas por videoconferência.
“Tendo o magistrado definido que os acusados presos acompanharão as audiências de inquirição das testemunhas pelo sistema de videoconferência, torna-se ainda mais evidente que menos oneroso – ao Estado e ao paciente – será que também ele participe do ato por videoconferência no Recife, onde se encontra preso”, disse o ministro.
Apesar de tornar sem efeito a ordem de transferência, o ministro ressalvou que a decisão não impede nova e justificada decisão a respeito da necessidade da transferência durante o processo.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Opinião do prof. Evinis Talon:
Trata-se de uma brilhante decisão da Sexta Turma do STJ, que, pontualmente, traz um pouco de luz ao debate referente ao direito do preso de permanecer perto de sua família, seja durante o trâmite do processo, seja na execução da pena.
Infelizmente, muitas decisões são prolatadas diariamente com um critério utilitarista de “desafogar o Judiciário”, acelerar a pauta do Juiz, facilitar o andamento do processo ou evitar demora indevida. Não há nada contra esse tipo de decisão, desde que, para isso, não se esteja disposto a relativizar ou suprimir direitos.
Na prática forense, é comum, por exemplo, que os Magistrados queiram realizar audiências de instrução, ainda que sem a presença do réu preso. Nesses casos, a ausência decorre da falta de requisição ou do não cumprimento da requisição (normalmente, com a alegação de falta de agentes penitenciários que possam realizar o transporte do preso). Ora, se é um direito legalmente previsto, o critério utilitarista de “não atrasar a pauta” não pode ser invocado. Sobre esse tema, escrevi um texto anteriormente (leia aqui).
Da mesma forma, no que concerne à decisão em comento, é elogiável o entendimento do STJ. É inconcebível afastar o preso de sua família e do local onde estão seus Advogados apenas para facilitar o andamento da instrução.
Como muito bem foi decidido pelo STJ, não prospera a fundamentação do TRF da 4ª Região no sentido de que “o recambiamento do preso provisório para estabelecimento prisional na sede do juízo mostra-se, de fato, necessário à célere e regular persecução criminal – a exemplo do que já ocorreu com outros investigados”. A celeridade e a regularidade da persecução criminal podem ser respeitadas por meio da utilização de videoconferência, como, aliás, o Juiz de primeiro grau havia mencionado no caso concreto.