Decisão proferida pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça no HC 301.684/RS, julgado em julgado em 06/08/2015 (leia a íntegra do acórdão).
Confira a ementa:
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. DESCABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. POSSE DE DROGAS. CONFIGURAÇÃO DE FALTA GRAVE. DESNECESSIDADE DE AGUARDAR O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA PARA O RECONHECIMENTO DA FALTA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. – O Superior Tribunal de Justiça, seguindo a posição sedimentada pelo Supremo Tribunal Federal, uniformizou o entendimento no sentido de ser inadmissível o conhecimento de habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. Contudo, se constatada a existência de manifesta ilegalidade, é possível a concessão da ordem de ofício. (HC n.299.261/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 4/9/2014, DJe 18/09/2014) – Esta Corte possui jurisprudência no sentido de que a posse de drogas no interior do estabelecimento prisional, ainda que para o uso próprio, configura falta disciplinar de natureza grave, à luz do art. 52 da Lei de Execução Penal, não sendo requisito para o seu reconhecimento o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Precedentes. – Habeas corpus não conhecido. (HC 301.684/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 06/08/2015, DJe 28/08/2015)
Leia a íntegra do voto:
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (Relator):
Inicialmente, cumpre ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça, seguindo a posição sedimentada pelo Supremo Tribunal Federal, uniformizou o entendimento no sentido de ser inadmissível o conhecimento de habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. Contudo, se constatada a existência de manifesta ilegalidade, é possível a concessão da ordem de ofício.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ORDINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. RESPEITO AO SISTEMA RECURSAL PREVISTO NA CARTA MAGNA. NÃO CONHECIMENTO. 1. O Supremo Tribunal Federal, buscando dar efetividade às normas previstas na Constituição Federal e na Lei 8.038/90, passou a não mais admitir o manejo do habeas corpus originário em substituição ao recurso ordinário cabível, entendimento que foi adotado por este Superior Tribunal de Justiça. 2. O constrangimento apontado na inicial será analisado, a fim de que se verifique a existência de flagrante ilegalidade que justifique a atuação de ofício por este Superior Tribunal de Justiça. […] 4. Habeas corpus não conhecido. (HC 299.261/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 04/09/2014, DJe 18/09/2014)
Passo, portanto, à verificação da ocorrência de patente ilegalidade.
Compulsando os autos, verifico que o paciente cumpre uma pena de 14 (quatorze) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime fechado, tendo iniciado o cumprimento em 25/3/2008, com término previsto para 29/3/2022.
Conforme relatado, o Juízo da Execução reconheceu a prática de falta grave em razão da tentativa do paciente de adentrar no estabelecimento prisional na posse de crack. Eis o teor da decisão (fls. 30/34):
O apenado encontrava-se em regime semiaberto, com autorização de saída temeria., quando ao retomar para o presidio o agente penitenciário Jorge notou que po apenado tinha algo em suas mãos, sendo o mesmo revistado e encontrado uma bucha envolvida em um preservativo, contendo 31 Pedras de uma substancia semelhante a crack e mais uma quantia não fracionada (fi. 172). Houve a instauração e conclusão de PAD (fls. 179/184). Insaturado, também , o inquérito policiai por tráfico de drogas (fls. 188/1989). Realizada audiência de justificação (fl. 201). […] De plano, afasto a alegação de arbitrariedade do isolamento aventada pela defesa. Vejamos. O apenado cometeu, em tese, falta disciplinar de natureza grave, pois fora flagrado, ao retornar para o presídio, com 31 pedras de crak e mais uma quantia não fracionada. De acordo com o artigo 19, §4° do Regimento Disciplinar Penitenciário, a seguir transcrito, a autoridade administrativa está autorizada a aplicar a sanção administrativa. […] Assim, vai afastada a alegação de arbitrariedade no isolamento. No mérito. Disponibilizada a ampla defesa ao reeducando, este não trouxe aos autos prova razoável e suficiente que pudesse lhe afastar autoria do delito, pugnando a defesa fosse reconhecido apenas o porte de substância ser discutida, pois, neste momento, examina-se apenas o cometimento da falta grave em si, não havendo se falar noutro delito, senão aquele inicialmente capitulado, já que basta o cometimento de novo crime, conforme preceitua o artigo 52 da LEP. […] Ademais, eventual argumento de que só poderá ser considerado como falta grave, o delito no qual já houver sentença transitada em julgado nâo prospera, posto que. como antes referido, a Lei de Execuções Penais, em seu art. 52, caput, determina que a simples prática de fato definido como crime doloso, por si só já configura a falta grave inserida no art. 11. Inciso VIII do Regimento Disciplinar Penitenciário (Decreto n° 47.594/2010). […] Por tais razões, e ante a inexistência de provas aptas a justificar a falta, acolho a promoção ministerial e RECONHEÇO a prática de FALTA DE NATUREZA GRAVE pelo apenado, uma vez que não restou justificado o fato de ter praticado fato definido como crime doloso, e determino, observando o disposto no artigo 19 do RDP, que refere que: ‘Na aplicação da sanção disciplinar deverão ser considerados o comportamento e a conduta do preso durante o período de recolhimento, a causa determinante da infração, as circunstâncias atenuantes e agravantes e a relevância do resultado produzido’ […]
Em sede de agravo em execução, o Tribunal a quo manteve a decisão de primeiro grau, consignando o seguinte (fls. 88/102):
Após análise do expediente carcerário, verifico ter sido apreendido na posse do apenado 31 pedras de crack quando reingressava no presídio. Quando perguntado sobre o entorpecente, o reeducando referiu não ser sua a droga, não sabendo como foi parar ali. Evidencia-se através do caso concreto, não ser a justificativa do apenado plausível, capaz de afastar o fato e os efeitos da falta grave. […]
Por fim, o Tribunal a quo desacolheu os embargos infringentes opostos. Confiram-se trechos da decisão (fls. 131/135):
Garantida vênia do eminente Desembargador Diógenes Vicente Hassan Ribeiro, penso que razão assiste à douta maioria. Como bem referido pelo Desembargador Nereu José Giacomolli, condutor do douto voto majoritário: conforme expediente carcerário acostado aos autos, o apenado iniciou o cumprimento da pena em 25.03.2008, em fechado. Em razão da falta, o juízo a quo reconheceu a falta grave , determinou a regressão, alterou a data-base e decretou a perda dos dias remidos (…) Após análise do expediente carcerário, verifico ter sido apreendido na posse do apenado 31 pedras de crack quando reingressava no presídio. Quando perguntado sobre o entorpecente, o reeducando referiu não ser sua a droga, não sabendo como foi para ali. Evidencia-se através do caso concreto, não ser a justificativa do apenado plausível, capaz de afastar o fato e os efeitos da falta grave (fl. 64v). No caso, o embargante cumpria pena privativa de liberdade de 14 anos e 06 meses de reclusão, pela prática do delito de homicídio. Submetido a revista corporal, ao reingressar ao presídio, foram encontradas 31 pedras de crack e dinheiro em seu poder. Instaurado procedimento administrativo disciplinar, a justificativa apresentada pelo apenado não elidiu o cometimento da falta grave. Caracterizada a falta grave, a regressão do regime é impositiva, a teor do disposto no art. 52, combinado com o art. 118, inciso I, ambos da Lei de Execução Penal. […] Nestas condições, correta a decisão da douta maioria que manteve o reconhecimento da falta grave e seus consectários legais. Desacolho os embargos. É o voto.
Quanto ao tema, esta Corte possui jurisprudência no sentido de que a posse de drogas no interior do estabelecimento prisional, ainda que para o uso próprio, configura falta disciplinar de natureza grave, à luz do art. 52 da Lei de Execução Penal, não sendo requisito para o seu reconhecimento o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. POSSE DE DROGAS PARA USO PRÓPRIO. NATUREZA JURÍDICA DE CRIME. APLICABILIDADE DO ART. 52 DA LEI N.º 7.210/84. FALTA GRAVE. CARACTERIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. O art. 52, caput, da Lei de Execução Penal, considera como falta grave a prática de fato previsto como crime doloso. 2. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento de Questão de Ordem suscitada nos autos do RE 430.105 QO/RJ, rejeitou as teses de abolitio criminis e infração penal sui generis, afirmando a natureza de crime da conduta do usuário de drogas, não obstante a despenalização. 3. “A posse de substância entorpecente no interior do estabelecimento prisional, ainda que para uso próprio, constitui falta grave (art. 52 da LEP).” (STJ, HC 109.145/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 22/02/2010.) 4. Ordem denegada. (HC 151.435/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 03/05/2011, DJe 12/05/2011)
HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. EXECUÇÃO PENAL. COMETIMENTO DE CRIME. ART. 28 DA LEI 11.343/2006. CONFIGURAÇÃO DE FALTA GRAVE. 3. SANÇÃO DISCIPLINAR. ART. 53 DA LEP. REGRESSÃO DE REGIME. ART. 181, I, DA LEP. 4. ALTERAÇÃO DO REGIME. OFENSA À COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. 5. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando a racionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal, vinha se firmando, mais recentemente, no sentido de ser imperiosa a restrição do cabimento do remédio constitucional às hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal. Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal Federal passou a não mais admitir habeas corpus que tenha por objetivo substituir o recurso ordinariamente cabível para a espécie. Precedentes. Contudo, devem ser analisadas as questões suscitadas na inicial no intuito de verificar a existência de constrangimento ilegal evidente a ser sanado mediante a concessão de habeas corpus de ofício, evitando-se prejuízos à ampla defesa e ao devido processo legal. 2. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacificado no sentido de que a prática de crime descrito no art. 28 da Lei 11.343/2006, apesar de não mais cominar pena privativa de liberdade, constitui falta grave, apta a autorizar a regressão de regime. 3. Cometida a falta grave, o preso faltoso fica sujeito a uma das sanções disciplinares previstas no art. 53 da Lei de Execuções Penais. Além disso, conforme descrito no art. 118, I, da Lei de Execução Penal, a execução da pena privativa de liberdade também fica sujeita à forma regressiva quando o condenado praticar fato definido como crime doloso ou falta grave. 4. O cometimento de falta grave durante a execução da pena traz como consequência a regressão de regime e a perda dos dias remidos, sem que isso caracterize ofensa à coisa julgada. Precedentes. 5. Habeas corpus não conhecido. (HC 220.413/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 01/07/2013)
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO INTERNO NO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. 1. FALTA GRAVE CONSISTENTE NA PRÁTICA DE CRIME. DESNECESSIDADE DO TRÂNSITO EM JULGADO. 2. POSSE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. ART. 28 DA LEI DE TÓXICOS. IMPRESCINDIBILIDADE DE LAUDO PARA AFERIR A MATERIALIDADE. ART. 50, § 1º, DA LEI DE DROGAS. 3. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. É pacífica a orientação do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o cometimento de crime doloso no curso da execução caracteriza falta grave – conforme disposto no art. 52 da LEP -, independentemente do trânsito em julgado de eventual sentença penal condenatória. Contudo, o caso guarda particularidades, razão pela qual foi reconsiderada a decisão monocrática no julgamento do primeiro agravo regimental. 2. Cuidando-se de crime de porte de entorpecente para uso próprio, faz-se necessário, no mínimo, o laudo provisório, pois sem este sequer é possível dar início à ação penal. De fato, o art. 50, § 1º, da Lei de Drogas dispõe que para o estabelecimento da materialidade do delito é necessário o laudo de constatação da natureza e quantidade da droga. Portanto, tratando-se de conduta que apenas se configura se efetivamente verificada a existência de substância capaz de causar dependência, mostra-se, a meu ver, temerário reconhecer a prática de falta grave sem que tenha havido qualquer tipo de perícia no material apreendido. Ademais, diante do contexto apresentado pelas instâncias ordinárias, é possível que nem ao menos haja processo penal, porquanto imprescindível a demonstração de justa causa para dar início à ação penal, o que não se verifica ante a ausência de laudo de materialidade. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AgRg no AREsp 418.615/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 18/06/2014)
HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. FALTA DISCIPLINAR DE NATUREZA GRAVE. DISCUSSÃO SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DA INFRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. COMETIMENTO DE CRIME DOLOSO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE DE AGUARDAR O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. REGRESSÃO DE REGIME. POSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. Na via angusta do habeas corpus torna-se impossível o debate sobre a caracterização ou não da falta disciplinar se as instâncias originárias confirmaram a existência da infração. 2. O incidente executório de configuração de falta grave, decorrente do cometimento de crime doloso, não sofre interferência da necessidade de condenação transitada em julgado, porquanto é de cunho administrativo e obedece aos mesmos parâmetros da ampla defesa e do contraditório exigidos no processo penal. Portanto, possível a regressão de regime prisional. 3. Ordem denegada. (HC 171.143/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2012, DJe 13/08/2012)
Ante o exposto, não conheço do habeas corpus.
É o voto.
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