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Evinis Talon

STJ: aplicação da Lei nº 13.491/2017 que amplia a competência da Justiça Militar

02/07/2020

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No CC 161.898-MG, julgado em 13/02/2019, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é possível a aplicação imediata da Lei n. 13.491/2017, que amplia a competência da Justiça Militar e possui conteúdo híbrido (lei processual material), aos fatos perpetrados antes do seu advento, mediante observância da legislação penal (seja ela militar ou comum) mais benéfica ao tempo do crime.

Informações do inteiro teor:

Inicialmente, cumpre destacar que a Lei n. 13.491/2017 não tratou apenas de ampliar a competência da Justiça Militar, também ampliou o conceito de crime militar, circunstância que, isoladamente, autoriza a conclusão no sentido da existência de um caráter de direito material na norma.

Esse aspecto, embora evidente, não afasta a sua aplicabilidade imediata aos fatos perpetrados antes de seu advento, já que a simples modificação da classificação de um crime como comum para um delito de natureza militar não traduz, por si só, uma situação mais gravosa ao réu, de modo a atrair a incidência do princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa (arts. 5º, XL, da Constituição Federal e 2º, I, do Código Penal).

Por outro lado, a modificação da competência, em alguns casos, pode ensejar consequências que repercutem diretamente no jus libertatis, inclusive de forma mais gravosa ao réu.

É inegável que a norma possuiu conteúdo híbrido (lei processual material) e que, em alguns casos, a sua aplicação retroativa pode ensejar efeitos mais gravosos ao réu. Tal conclusão, no entanto, não impossibilita a incidência imediata, sendo absolutamente possível e desejável conciliar sua aplicação com o princípio da irretroatividade de lei penal mais gravosa.

A jurisprudência desta Corte não admite a cisão da norma de conteúdo híbrido (AgRg no REsp n. 1.585.104/PE, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 23/4/2018). Ocorre que a aplicação imediata, com observância da norma penal mais benéfica ao tempo do crime, não implicaria uma cisão da norma, pois, o caráter material, cujo retroatividade seria passível de gerar prejuízo ao réu, não está na norma em si, mas nas consequências que dela advém.

Logo, é absolutamente possível e adequado a incidência imediata da norma aos fatos perpetrados antes do seu advento, em observância ao princípio tempus regit actum (tal como decidido no julgamento do CC n. 160.902/RJ), desde que observada, oportunamente, a legislação penal (seja ela militar ou comum) mais benéfica ao tempo do crime. Ademais, importante ressaltar que tal ressalva é inafastável da declaração de competência. Primeiro, porque a solução do julgado dela depende.

Segundo, porque a simples declaração de competência em favor da Justiça Militar, sem a ressalva acima estabelecida, poderia dar azo a ilegalidade futura, decorrente de eventual inobservância da norma penal mais benéfica.

Confira a ementa:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA MILITAR E JUSTIÇA COMUM. AÇÃO PENAL. ABUSO DE AUTORIDADE. FATO PERPETRADO ANTES DO ADVENTO DA LEI N 13.491/2017. DISSENSO ESTABELECIDO ACERCA DA INCIDÊNCIA DA NORMA, SOB A PERSPECTIVA DE QUE OSTENTA CONTEÚDO HÍBRIDO, CUJO EFEITO, POR ENSEJAR PREJUÍZO AO RÉU, SERIA PASSÍVEL DE AFASTAR A SUA APLICABILIDADE, POR IMPLICAR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI PENAL MAIS GRAVOSA. QUESTÃO DEBATIDA NO CC N. 160.902/RJ, SOB O ASPECTO PROCESSUAL. DISSENSO QUE RECLAMA O EXAME DA QUESTÃO SOB A PERSPECTIVA INTEGRAL DA NORMA. CARÁTER HÍBRIDO RECONHECIDO. POSSIBILIDADE DE CONFORMAÇÃO ENTRE A INCIDÊNCIA IMEDIATA E A OBSERVÂNCIA DA NORMA PENAL MAIS BENÉFICA AO TEMPO DO CRIME. DECLARAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO JUÍZO MILITAR COM RESSALVA.
1. A aplicação da Lei n. 13.491/2017 aos delitos perpetrados antes do seu advento foi objeto de julgado recente da Terceira Seção, no qual se concluiu pela aplicação imediata da norma, em observância ao princípio tempus regit actum (CC n. 160.902/RJ, Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, DJe 18/12/2018).
2 . A solução do dissenso reclama uma discussão que vai além do aspecto processual, notadamente porque há posições doutrinárias que, sob a premissa de que a norma possui conteúdo híbrido, afastam sua aplicabilidade aos fatos anteriores ao seu advento.
3. A Lei n. 13.491/2017 não tratou apenas de ampliar a competência da Justiça Militar, também ampliou o conceito de crime militar, circunstância que, isoladamente, autoriza a conclusão no sentido da existência de um caráter de direito material na norma. Tal aspecto, embora evidente, não afasta a sua aplicabilidade imediata aos fatos perpetrados antes de seu advento, já que a simples modificação da classificação de um crime como comum para um delito de natureza militar não traduz, por si só, uma situação mais gravosa ao réu, de modo a atrair a incidência do princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa (arts. 5º, XL, da CF e 2º, I, do CP).
4. A modificação da competência dela decorrente, em alguns casos, enseja consequências que repercutem diretamente no jus libertatis, inclusive de forma mais gravosa ao réu, tais como: 1) a possibilidade de cúmulo material das penas, mesmo em crimes perpetrados em continuidade delitiva (art. 80 do Código Penal Militar); 2) o afastamento das medidas despenalizadoras previstas na Lei n. 9.099/1995 (ante a vedação prevista no art. 90-A da Lei n. 9.099/1995); e 3) a inaplicabilidade da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos (nos moldes previstos no art. 44 do CP).
5. A existência de um caráter híbrido na norma não afasta a sua aplicabilidade imediata, pois é possível conformar sua incidência com o princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa, mediante observância, pelo Juízo Militar, da legislação penal (seja ela militar ou comum) mais benéfica ao tempo do crime.
6. A solução não implica uma cisão da norma, repudiada pela jurisprudência, notadamente porque o caráter material, cuja retroatividade é passível de gerar prejuízo ao réu, não está na norma em si, mas nas consequências que dela advêm.
7. Ressalva inafastável da declaração de competência, já que a solução do julgado dela depende, além do que a simples declaração da Justiça Militar pode dar azo a ilegalidade futura.
8. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 2ª Auditoria da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais, o suscitante, nos moldes explanados no voto condutor. (CC 161.898/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/02/2019, DJe 20/02/2019)

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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