A aplicação da lei penal no tempo é regida por alguns princípios.
De início, temos o princípio da anterioridade (art. 5º, XXXIX, da Constituição, e art. 1º do Código Penal), o qual dispõe que não há infração penal sem lei anterior que o defina, tampouco pena sem prévia cominação legal. Portanto, indo além do princípio da legalidade – que exige a tipificação por lei –, há uma exigência de que o crime e a pena sejam definidos por uma lei prévia.
Da mesma forma, o princípio da irretroatividade da lei penal (art. 5º, XL, Constituição Federal) dispõe que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.
Portanto, a retroatividade da lei mais benéfica é de extrema importância, considerando que as normas mais brandas sempre retroagem, ainda que tenha havido o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Sobre a lei penal no tempo, também dispõe o art. 2º do Código Penal que:
Art. 2º – Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Parágrafo único – A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
Conforme o “caput” do supracitado dispositivo legal, a “abolitio criminis” (lei posterior que descriminaliza determinada conduta) retroage para beneficiar os agentes que tenham praticado a conduta descriminalizada, pouco importando se já há sentença condenatória.
A aplicação da lei benéfica (“lex mitior”), conforme se extrai do parágrafo único do art. 2º do Código Penal, pode ocorrer até mesmo durante a execução penal.
Nesse caso, de acordo com a Súmula 611 do STF, compete ao juízo da execução sua aplicabilidade: “transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.”
Além disso, deve-se enfatizar que a lei nova que cria algum tipo penal, aumenta penas ou, de qualquer forma, é mais gravosa, somente será aplicada aos fatos praticados após a sua entrada em vigor, o que significa que não atinge as condutas referentes ao seu período de “vacatio legis”.
De qualquer sorte, um questionamento oportuno diz respeito à (im)possibilidade de aplicação da lei penal mais gravosa (“lex gravior”). Haveria algum caso em que seria admissível, no conflito intertemporal, a aplicação da lei penal mais grave?
Tecnicamente, não existe. Afinal, a Constituição não excepciona a irretroatividade da lei penal mais grave. Entretanto, a criticável súmula 711 do STF afirma que “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.”
A súmula acima deve ser entendida no sentido de que a lei penal mais gravosa se aplica somente aos crimes continuados e permanentes, desde que a lei nova (mais grave) entre em vigor ainda durante o período de permanência ou de continuidade. Assim, de certa forma, a lei nova não retroage para atingir uma conduta anterior a ela, mas sim uma conduta que ainda estava ocorrendo quando essa nova lei entrou em vigor.
Como se vê, a súmula só se aplica aos crimes permanentes (aqueles em que a conduta se prorroga no tempo, inclusive sendo possível a prisão em flagrante durante todo o período, como no sequestro) e aos crimes continuados (delitos semelhantes que, isoladamente, são crimes autônomos, mas, em decorrência das semelhanças e das condições de tempo, lugar e execução, são considerados como crime único para fins de exasperação da pena).
Destarte, aplica-se, nesses casos, a nova lei, ainda que ela seja mais grave para o réu.
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