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Evinis Talon

O STJ e a prova emprestada no processo penal

07/03/2017

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O STJ e a prova emprestada no processo penal

No processo penal, a prova emprestada deve ser admitida com cautela. Isto porque, no processo penal, as provas devem ser propostas, admitidas e produzidas especificamente para demonstrar a presença ou não dos elementos do crime (fato típico, ilícito e culpável) e para demonstrar se, em relação ao acusado, há provas de autoria.

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o seu entendimento pela necessidade de autorização judicial para a utilização de prova emprestada, “in verbis”:

RESTITUIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL PELO STF PARA FINS DO ARTIGO 1.030, II, CPC PARA ADEQUAÇÃO AO RE 601.314/SP JULGADO EM REPERCUSSÃO GERAL. AUSÊNCIA DE DIVERGÊNCIA. MATÉRIA DISTINTA. DIREITO PROCESSUAL PENAL. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA COM BASE EM PROVA EMPRESTADA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. PROVA ILÍCITA.
[…]
2. No âmbito da matéria criminal, por outro lado, resulta incontroverso do constructo normativo, doutrinário e jurisprudencial pátrio que é peremptoriamente vedada a utilização no processo penal de prova emprestada – do procedimento fiscal – sem autorização judicial.
[…]
(REsp 1373498/SE, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 22/02/2017)

Considero, contudo, que quando as provas presentes em outro processo podem demonstrar a inocência do acusado ou, de alguma forma, beneficiá-lo, deve-se valorar tais provas, ainda que sem autorização judicial, com base no entendimento que afirma ser admitida a utilização (“rectius”: valoração) de provas ilícitas “pro reo”, com fulcro no princípio da proporcionalidade.

Quanto aos indivíduos que podem ser atingidos pelas provas emprestadas, o STJ tem entendimento consideravelmente amplo, porque não exige a presença das mesmas partes no processo em que foi produzida a prova que será emprestada ao processo penal:

[…]
3. Esta Corte Superior manifesta entendimento no sentido de que “a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto.
Independentemente de haver identidade de partes, o contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo” (EREsp 617.428/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Corte Especial, DJe 17/6/2014).
[…]
(HC 292.800/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2017, DJe 10/02/2017)

Admitindo-se uma heterogeneidade de partes de forma desregrada, ocorreriam situações em que o contraditório seria, no mínimo, mitigado, quando não suprimido. Exemplifico:

Imagine dois processos: em um processo criminal, um indivíduo responde por determinada infração penal; em outro processo, de natureza cível, esse indivíduo não tem nenhuma participação, mas uma das testemunhas refere-se a um fato criminoso praticado por ele. Como as partes do processo cível estavam mais preocupadas com a lide, deixaram de perguntar à testemunha sobre os detalhes do fato criminoso.

No processo criminal, a testemunha não é localizada. Assim, o Magistrado admite o depoimento dado no processo civil, que ingressa no processo penal como prova emprestada, em forma documental. Considerando que o acusado não integrou o processo civil, tampouco constituiu Advogado, naquele feito, para indagar à testemunha sobre a narrativa relacionada ao crime, qual é o contraditório existente?

Nesse caso, o contraditório seria limitado à eventual incidente de falsidade, que para parte da doutrina diz respeito somente à falsidade material, enquanto outros doutrinadores o admitem também para a falsidade ideológica. Ainda que se admita a possibilidade de declarar a falsidade do teor do documento – que são as declarações da testemunha -, a defesa não teve a possibilidade de atuar ativamente durante a produção dessa prova. Ela será admitida – e prejudicará o acusado – ou será declarada falsa – e desconsiderada -, mas, por não ter integrado o processo civil, o acusado não teve a oportunidade de, por seu Advogado, fazer perguntas à testemunha, não tendo a chance de tornar essa prova favorável as suas alegações.

Por esse motivo, é imperativo, para a utilização da prova emprestada no processo penal, que o acusado tenha participado da produção probatória no processo originário, sob pena de ofensa ao princípio do contraditório.

Em outras palavras, o fato de não se exigir a identidade de partes no processo originário e naquele em que se pretende utilizar a prova emprestada não significa que o acusado não precise ter participado dos dois processos. A sua participação é necessária no processo em que foi produzida a prova e no processo penal em que essa prova será utilizada.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça:

[…]
6. A jurisprudência é firme na compreensão de que admite-se, como elemento de convicção, a prova produzida em outro processo, desde que a parte a quem a prova desfavorece houver participado do processo em que ela foi produzida, resguardando-se, assim, o contraditório, e, por consequência, o devido processo legal substancial. Assim, produzida e realizada a prova em consonância com os preceitos legais, não há falar em decreto de nulidade.
[…]
(AgRg no HC 289.078/PB, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 15/02/2017)

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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