O habeas corpus na execução penal
O habeas corpus é um remédio constitucional importantíssimo para quem atua na área criminal.
Tem o seu fundamento basilar no art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, nos seguintes termos: “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.
O art. 647 do Código de Processo Penal define: “dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar”.
Como se observa, a ofensa – efetiva ou potencial – à liberdade é um requisito do habeas corpus. Por sua vez, a execução penal é o auge da ofensa à liberdade, haja vista que, como regra, ocorrerá a sua privação, salvo se a pena for substituída por pena restritiva de direitos.
Portanto, a princípio, parece ser natural o cabimento do habeas corpus na execução penal. Contudo, a resposta não é tão simples.
Da simples leitura do art. 648 do Código de Processo Penal extraímos várias hipóteses em que o habeas corpus poderia ser impetrado na execução penal, como quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei (inciso II), quando o processo for manifestamente nulo (VI) e quando extinta a punibilidade (VII).
Ocorre que os pedidos (de progressão, livramento condicional, indulto etc.) são feitos ao Juiz da Execução Criminal e, caso ocorra sua negativa, será cabível a interposição de agravo em execução, nos termos do art. 197 da Lei de Execução Penal. Noutras palavras, o agravo em execução é o recurso adequado contra as decisões do Magistrado.
Assim, na fase da execução penal, não é recomendável a impetração do habeas corpus como substitutivo ao recurso específico e legalmente previsto.
Após a decisão do Magistrado, caso a defesa considere que a situação é urgente, deve, em primeiro lugar, interpor agravo em execução, com o desiderato de não perder o prazo. Logo após a interposição do agravo, é possível impetrar habeas corpus, que tem preferência no julgamento e pode ter sua liminar concedida rapidamente.
Nesse caso, o agravo em execução é utilizado para evitar a preclusão das decisões, nas hipóteses em que há indeferimento do pedido de progressão de regime ou livramento condicional, conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade etc.
Por sua vez, a posterior impetração do habeas corpus teria o escopo de evitar os frequentes atrasos no julgamento dos agravos em execução. Normalmente, o julgamento do agravo demora vários meses. Dependendo do objeto do recurso, a situação gravosa, ao se prolongar, pode afetar significativamente a liberdade, como no caso de agravo em execução contra a decisão que converteu a pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade.
Ademais, segundo entendimento jurisprudencial, a existência de recurso específico (agravo em execução) inviabiliza o conhecimento do habeas corpus – que seria substitutivo de recurso – para a aferição de eventual ilegalidade na fase de execução da pena. De qualquer forma, no caso de flagrante ilegalidade, apesar do não conhecimento do habeas corpus, os Tribunais, como regra, concedem a ordem de ofício:
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. EXECUÇÃO PENAL. CRIME HEDIONDO. REGIME INICIAL FECHADO. OBRIGATORIEDADE. QUESTÃO NÃO ANALISADA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. WRIT IMPETRADO NA ORIGEM. OCORRÊNCIA DE ILEGALIDADE, ABUSO DE PODER OU TERATOLOGIA. CABIMENTO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Ressalvada pessoal compreensão pessoal diversa, uniformizou o Superior Tribunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a concessão da ordem ante a constatação de ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia. […] (STJ, Sexta Turma, HC 294.929/SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 16/09/2014)
Em suma, é imprescindível ampliar a utilização do habeas corpus na execução penal, conquanto exista recurso legalmente previsto, pois se trata da área em que a liberdade do indivíduo é mais atingida e onde ocorrem as maiores violações dos direitos fundamentais.
Considerando o entendimento jurisprudencial, não se deve deixar de interpor o agravo em execução para apenas impetrar o habeas corpus. Caso se pretenda utilizar o remédio constitucional – diante da sua celeridade –, é recomendável que, antes disso, cumpra-se o prazo de interposição do agravo em execução. Dessa forma, caso o habeas corpus não seja conhecido porque existe um recurso próprio, não terá ocorrido a preclusão, haja vista a interposição do agravo.
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