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Evinis Talon

Exame criminológico: faculdade ou obrigatoriedade?

09/01/2018

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Exame criminológico: faculdade ou obrigatoriedade?

Se tem algo que os Juízes da Execução Penal precisam entender é que o exame criminológico é uma faculdade, e não uma obrigatoriedade. Pelo critério do art. 112 da Lei de Execução Penal, nem deveria ser uma possibilidade, considerando que não se trata de um requisito legal.

Assim, não seria possível condicionar a progressão de regime à realização de exame criminológico, cabendo ao Juiz somente avaliar os critérios objetivos e subjetivos previstos na legislação.

De qualquer forma, muitos Juízes exigem a realização do exame criminológico para a progressão de regime, tratando essa exigência como se fosse uma regra.

Se o Magistrado entender necessária a realização do exame, sua decisão deverá ser fundamentada, o que nem sempre é visto na prática.

Destaca-se que a mera gravidade abstrata do crime e a extensão da pena não são suficientes para a determinação da realização do exame criminológico, não podendo condicionar a progressão a esse exame criminológico.

Nesse sentido:

EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO, ROUBO MAJORADO E AMEAÇA. PROGRESSÃO DE REGIME. EXAME CRIMINOLÓGICO. DESNECESSIDADE. FACULDADE DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS MEDIANTE DECISÃO MOTIVADA. SÚMULA N. 439/STJ E SÚMULA VINCULANTE N. 26. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO E LONGA PENA A CUMPRIR. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. […] II – Com as inovações trazidas pela Lei n. 10.792/03, alterando a redação do art. 112 da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal), afastou-se a exigência do exame criminológico para fins de progressão de regime. Por outro lado, este Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que o magistrado de primeiro grau, ou mesmo o eg. Tribunal a quo, diante das circunstâncias do caso concreto, podem determinar a realização da referida prova técnica para a formação de seu convencimento, desde que essa decisão seja adequadamente motivada. III – Entendimento consolidado na Súmula n. 439/STJ (“Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada”) e na Súmula Vinculante n. 26 (“Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico”). IV – A Corte estadual, ao cassar a r. decisão agravada e determinar a realização do exame criminológico para aferir o mérito do sentenciado à progressão do regime prisional, embasou-se, genericamente, na gravidade abstrata do crime pelo qual o paciente foi condenado e na quantidade de pena a cumprir, não apontando elementos concretos dos autos que pudessem justificar a necessidade do exame técnico para a formação de seu convencimento. Habeas Corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para cassar o v. acórdão proferido nos autos do Agravo em Execução n. 7003547-08.2016.8.26.0344, e restabelecer a r. decisão do MM. Juízo de primeiro grau que deferiu o pedido de progressão de regime prisional do paciente.(STJ, Quinta Turma, HC 374.466/SP, Relator Ministro Felix Fischer, julgado em 06/04/2017)

Ademais, é evidente que a equivocada exigência da realização do exame criminológico torna o processo de execução penal ainda mais “bagunçado” e contribui para a superlotação dos presídios e lentidão das decisões na execução penal, porque atrasa a concessão da progressão de regime e do livramento condicional daqueles que já têm tais direitos.

Ora, o art. 112 da Lei de Execução Penal dispõe:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.

Percebe-se que o art. 112 da LEP, na sua redação atual, nem menciona o exame criminológico.

Também é relevante destacar o teor da súmula vinculante 26 do STF:

Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.

Aqui, duas observações são importantes: a um, a súmula vinculante não prevê a obrigatoriedade do exame criminológico, mas a mera possibilidade, mediante decisão fundamentada; a dois, o enunciado menciona somente “crime hediondo, ou equiparado”, o que significa que não deve ser admissível a extensão dessa súmula a crimes de natureza diversa.

Para crimes que não sejam hediondos ou equiparados, os Juízes fundamentam na súmula 439 do STJ, que, evidentemente, não tem natureza vinculante, tampouco cria uma obrigatoriedade da realização do exame criminológico.

De qualquer forma, pelo viés defensivo, observa-se que, para a progressão de regime, deveria ser suficiente o cumprimento do requisito objetivo (temporal) e o bom comportamento carcerário, comprovado por meio de atestado emitido pelo diretor do estabelecimento prisional. Impor ao apenado a realização do exame criminológico é criar um requisito não previsto na Lei de Execução Penal.

Ocorre que algo não previsto na lei tem sido utilizado com frequência. E pior: algo que, no mínimo, deveria ser exceção virou regra, como se fosse requisito obrigatório.

O irônico é que, quando os Juízes da Execução Penal determinam a realização do exame criminológico, estão questionando a própria efetividade do sistema em que eles atuam. Noutras palavras, se o Juiz quer saber se o réu está ou não no caminho da sua ressocialização, significa que o próprio Juiz não acredita muito no sistema em que está inserido (ou talvez não acredite no trabalho que vem desenvolvendo na comarca).

Destaca-se que o Juiz não fica vinculado ao laudo decorrente do exame criminológico, conquanto, quase sempre, os Juízes sigam cegamente as conclusões dos peritos.

Por fim, urge citar um interessante julgado que considera possível a realização do exame criminológico. Todavia, em razão do possível prejuízo ao preso, consistente na demora na análise do direito, a exigência foi suspensa liminarmente:

EXECUÇÃO PENAL. EXAME CRIMINOLÓGICO. FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA VINCULANTE 26. 1. É possível a requisição de exame criminológico que subsidie, em caso específico, a apreciação de benefício da execução penal. 2. Para que tal ocorra, entretanto, deve o juiz fundamentar-se em dados concretos, não parecendo adequada a mera alusão a crime praticado mediante violência ou grave ameaça. […] Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.” 2. Segundo a parte reclamante, o Juízo de origem “requisitou, ex officio, à direção do presídio em que se encontra recolhido o sentenciado a realização de exame criminológico por tratar-se de pessoa ‘cumprindo pena por crime praticado com violência ou grave ameaça.’” Alega que o Supremo Tribunal Federal exige fundamentação concreta para a realização do exame criminológico. Requer, assim, “a procedência desta Reclamação, a fim de cassar a decisão impugnada, para afastar a exigência de exame criminológico na análise do pedido de progressão de regime, ante a patente falta de fundamentação, e especialmente para determinar-se ao MM Juízo de Presidente Prudente que cesse de, em casos futuros, descumprir enunciados vinculantes do STF”. 3. É o relatório. Passo a decidir o pedido liminar. 4. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que é possível a exigência do exame criminológico, desde que haja fundamentação idônea, conforme se vê no seguinte julgado: “Prevalece nesta Corte o entendimento no sentido de que a alteração do artigo 112 da LEP pela Lei 10.792/2003 não proibiu a realização do exame criminológico, quando necessário para a avaliação do sentenciado, tampouco proibiu a sua utilização para a formação do convencimento do magistrado sobre o direito de promoção para regime mais brando. II  O entendimento desta Corte, consubstanciado na Súmula Vinculante 26, é de que, Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2.º da Lei n.º 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização do exame criminológico . III  […] 9. Presente a plausibilidade do direito invocado e a possibilidade de dano de difícil reparação, consistente na postergação da apreciação de benefícios ao preso, defiro a liminar, para que o juízo reclamado se abstenha de exigir o exame criminológico mediante a mera alusão a crime praticado mediante violência ou grave ameaça. 10. Comunique-se ao reclamado, requisitando-se-lhe informações, no prazo de 10 (dez) dias. Após, dê-se vista ao Ministério Público Federal para que possa se manifestar. Publique-se. Brasília, 08 de abril de 2015. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO Relator Documento assinado digitalmente (STF, MC Rcl 20089/SP, Relator Min. Roberto Barroso, julgado em 08/04/2015)

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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