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Evinis Talon

Comentários à Lei nº 13.344/16 (tráfico de pessoas)

18/10/2016

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Comentários à Lei nº 13.344/16 (tráfico de pessoas)

Foi publicada no dia 7 de outubro de 2016 a Lei nº 13.344/16, que trata dos crimes de tráfico interno e internacional de pessoas.

Além de questões gerais e propedêuticas (princípios, forma de prevenção etc.), essa lei também tem importantes dispositivos penais e processuais.

Logo no art. 1º, a sobredita Lei estabelece a sua aplicação para o tráfico de pessoas cometido no território nacional contra vítima brasileira ou estrangeira e no exterior contra vítima brasileira. Portanto, não dispõe ser aplicável ao tráfico de pessoas cometido no exterior contra vítima estrangeira.

Outro ponto interessante e com enorme efeito prático está no art. 3º, VIII, quando aponta como diretriz do enfrentamento ao tráfico de pessoas a preservação do sigilo dos procedimentos administrativos e judiciais, nos termos da lei.

Em seu art. 5º, esse diploma legal prevê que a repressão ao tráfico de pessoas ocorrerá por meio da cooperação entre órgãos do sistema de justiça e segurança, nacionais e estrangeiros; da integração de políticas e ações de repressão aos crimes correlatos e da responsabilização dos dos seus autores; e da formação de equipes conjuntas de investigação.

Um dos aspectos mais significativos da nova Lei é a previsão no seu art. 6º de várias formas de proteção e atendimento, de forma semelhante à Lei Maria da Penha. Destaca-se, por exemplo, o atendimento humanizado, assim como as várias formas de assistência (jurídica, social, de trabalho e emprego e de saúde).

No que concerne às disposições processuais alteradas pela nova Lei, o art. 8º possibilita que o juiz, inclusive de ofício, determine medidas assecuratórias relacionadas a bens, direitos ou valores pertencentes ao investigado ou acusado, que sejam instrumento, produto ou proveito do crime de tráfico de pessoas.

Da mesma forma, a referida Lei acresce ao Código de Processo Penal os arts. 13-A e 13-B, que permitem, em linhas gerais, que o Ministério Público e o delegado de polícia requisitem dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos. Também nessa linha, o art. 13-B do CPP, inovação desta Lei, possibilita que o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia requisitem, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso.

No aspecto da execução penal, essa Lei altera o art. 83, V, do Código Penal, para exigir do condenado pelo crime de tráfico de pessoas o cumprimento de 2/3 da pena para que possa obter o livramento condicional. Assim, o tráfico de pessoas, sem ser um crime hediondo ou equiparado a hediondo, passa a exigir essa fração superior, da mesma forma que os crimes hediondos, de tráfico de drogas, de terrorismo e de tortura.

Por derradeiro, a mencionada Lei acresce ao Código Penal o tipo penal previsto no art. 149-A, “in verbis”:

Art. 149-A.  Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:

I – remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;

II – submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo;

III – submetê-la a qualquer tipo de servidão;

IV – adoção ilegal; ou

V – exploração sexual.

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

§ 1º A pena é aumentada de um terço até a metade se:

I – o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las;

II – o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência;

III – o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função; ou

IV – a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional.

§ 2º A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa.

 

Algumas observações sobre esse tipo penal:

– O “caput” do art. 149-A do Código Penal prevê 8 núcleos (agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher), sendo um tipo misto alternativo, o que significa que a prática de qualquer um desses verbos configura crime, de modo que, se praticados dois ou mais verbos no mesmo contexto fático, haverá crime único.

– Os cinco incisos previstos no art. 149-A são elementos do tipo penal, tratando-se de finalidade especial ou dolo específico. Portanto, somente haverá consumação do crime de tráfico de pessoas se o agente tiver alguma das finalidades legalmente previstas, independentemente de conseguir concretizá-las.

– As formas de execução do crime de tráfico de pessoas são taxativas, quais sejam: grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso.

Por fim, os arts. 231 e 231-A do Código Penal, que preveem, respectivamente, os crimes de tráfico internacional e interno de pessoa para o fim de exploração sexual, serão revogados pela nova Lei.

Impende asseverar que o art. 231, §2º, IV, bem como o art. 231-A, §2º, IV, ambos do Código Penal, em vigor durante o período de “vacatio legis” da Lei sobre o tráfico de pessoas, preveem como causas de aumento de pena o emprego de violência, a grave ameaça e a fraude, que, como destacado anteriormente, passam a ser elementos do tipo penal de tráfico de pessoas. Em outras palavras, esses três meios de execução, que antes eram causas de aumento, passarão a integrar o próprio tipo penal.

Destarte, houve um enfraquecimento punitivo, haja vista que, se as condutas descritas no art. 149-A do Código Penal não forem executadas mediante uma das formas previstas no tipo penal (grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso), o fato será atípico.

Se houve um enfraquecimento no que tange à tipicidade, o contrário ocorreu em relação ao preceito secundário (pena). Na sua modalidade simples e sem considerar as causas de aumento de pena, o tráfico internacional previsto no art. 231 do Código Penal cominava uma pena de 3 a 8 anos de reclusão, enquanto o tráfico interno (art. 231-A) estabelecia uma pena de 2 a 6 anos de reclusão. O tráfico de pessoas, que após o período de “vacatio legis” ocupará o art. 149-A do Código Penal, prevê pena de 4 a 8 anos de reclusão.

Uma curiosidade sobre o novo tipo penal é a opção do legislador de não incluí-lo no rol de crimes hediondos, o que ensejaria inúmeros efeitos, como a alteração da fração para progressão de regime e a prioridade de tramitação. A opção legislativa restringiu-se a aplicar ao tráfico de pessoas a exigência do cumprimento de 2/3 da pena para o livramento condicional.

A Lei nº 13.344/16 terá “vacatio legis” de 45 dias.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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