STJ: HC não é adequado para analisar negativa de dolo
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no HC n. 763.953/RJ, decidiu que “o habeas corpus não é a via adequada para a análise da negativa de dolo, a qual demanda incursão vertical em provas”.
Confira a ementa relacionada:
HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. USO DE DOCUMENTO FALSO. TRANCAMENTO DO EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL. CRIME IMPOSSÍVEL NÃO CONFIGURADO. IMPOSSIBILIDADE, NA INICIAL FASE DO PROCESSO, DE APLICAR O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. As condições da ação têm natureza processual e não dizem respeito ao seu mérito. Na oportunidade do recebimento da denúncia, realiza-se análise hipotética sobre os fatos narrados, para verificação de sua tipicidade penal, sem incursão vertical sobre os elementos de informação disponíveis, porquanto a cognição é sumária e limitada. Esse não é o momento para afirmar se os fatos ocorreram, verdadeiramente, e se o réu, sem dúvida, é o seu autor. 2. No caso concreto, a denúncia narra o suposto uso de testamento falso para ajuizar ação de cumprimento de suas disposições, com a efetiva obtenção de sentença judicial favorável aos denunciados, autorizados pelo Poder Judiciário, por erro, a receber patrimônio objeto de herança jacente. 3. Não está caracterizada a inidoneidade absoluta do meio empregado, a ensejar o reconhecimento do crime impossível. Aplica-se ao caso a compreensão de que, quando não é viável ao magistrado, durante o curso do processo, ter acesso às informações que caracterizam a fraude, admite-se a configuração do crime de estelionato. 4. Uma vez realizada a fraude, com sucesso, a ausência de obtenção efetiva da vantagem ilícita não diz respeito à atipicidade da conduta, mas à consumação ou tentativa do estelionato, controvérsia não relacionada ao trancamento prematuro do exercício da ação penal. 5. O habeas corpus não é a via adequada para a análise da negativa de dolo, a qual demanda incursão vertical em provas. Apenas a reconstrução aproximada dos fatos, sob o contraditório, poderá revelar se a acusada tinha ciência de que a falecida havia deixado patrimônio sem herdeiros e da falsidade do testamento, ou se não agiu, conscientemente, com vontade de obter o resultado criminoso, nem assumiu o risco de produzi-lo. 6. Quando o falso se exaure o estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido, mas há registro de que o documento adulterado também é objeto de impugnação em ação anulatória promovida por ente público. Além disso, se Juiz absolver a ré da imputação do art. 171 do CP, não mais subsistirá o conflito aparente de duas normas penais incidentes sobre um único fato, a atrair o princípio da consunção, e persistirá válida a acusação relacionada ao art. 304 do CP. Assim, é precoce deliberar sobre a incidência da Súmula n. 17 do STJ , máxime quando os autos estão conclusos para sentença. 7. Quanto à assertiva de questão prejudicial externa, o “exame pelo Superior Tribunal de Justiça de matéria que não foi apreciada pelas instâncias ordinárias enseja indevida supressão de instância, com explícita violação da competência originária para o julgamento de habeas corpus (art. 105, I, c, da Constituição Federal)” (AgRg no HC n. 753.181/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, 5ª T., DJe 30/9/2022). 8. Habeas corpus denegado. (HC n. 763.953/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 14/2/2023, DJe de 17/2/2023.)
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