Decisão proferida pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal no Rcl 25123, julgado em 18/04/2017 (leia a íntegra do acórdão).
Confira a ementa:
Ementa: RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME: POSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DAS PENAS DO REGIME SEMIABERTO EM ESTABELECIMENTO QUE NÃO SE CARACTERIZA COMO COLÔNIA DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO VERBETE VINCULANTE 56 DESTE SUPREMO TRIBUNAL. RECLAMAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. I – É certo que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, entretanto, não há que se descartar a possibilidade de cumprimento das penas do regime semiaberto em estabelecimento que não se caracteriza como colônia de trabalho, desde que respeitados os parâmetros estipulados por esta Suprema Corte. II – Não há que se falar em desrespeito ao enunciado da Súmula Vinculante 56, pois a decisão combatida harmoniza-se com a orientação jurisprudencial desta Suprema Corte. III – Reclamação à qual se julga improcedente. (Rcl 25123, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 18/04/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-168 DIVULG 31-07-2017 PUBLIC 01-08-2017)
Leia a íntegra do voto do Ministro Ricardo Lewandowski:
V O T O
O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator):
Bem examinados os autos, entendo que a pretensão não merece acolhida.
O Verbete Vinculante 56 desta Corte enuncia que:
“A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS”.
Muito bem. No julgamento do RE 641.320/RS, Relator o Ministro Gilmar Mendes, no qual a súmula em questão faz referência expressa, os Ministros deste Supremo Tribunal estabeleceram o seguinte regramento, a ser obrigatoriamente observado pelos magistrados incumbidos da execução penal:
“Cumprimento de pena em regime fechado, na hipótese de inexistir vaga em estabelecimento adequado a seu regime. Violação aos princípios da individualização da pena (art. 5º, XLVI) e da legalidade (art. 5º, XXXIX). A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso. 3. Os juízes da execução penal poderão avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como ‘colônia agrícola, industrial’ (regime semiaberto) ou ‘casa de albergado ou estabelecimento adequado’ (regime aberto) (art. 33, § 1º, alíneas ‘b’ e ‘c’). No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado. 4. Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados: ( i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado. 5. Apelo ao legislador. A legislação sobre execução penal atende aos direitos fundamentais dos sentenciados. No entanto, o plano legislativo está tão distante da realidade que sua concretização é absolutamente inviável. Apelo ao legislador para que avalie a possibilidade de reformular a execução penal e a legislação correlata, para: ( i ) reformular a legislação de execução penal, adequando-a à realidade, sem abrir mão de parâmetros rígidos de respeito aos direitos fundamentais; (ii) compatibilizar os estabelecimentos penais à atual realidade; (iii) impedir o contingenciamento do FUNPEN; (iv) facilitar a construção de unidades funcionalmente adequadas – pequenas, capilarizadas; ( v ) permitir o aproveitamento da mão-de-obra dos presos nas obras de civis em estabelecimentos penais; (vi) limitar o número máximo de presos por habitante, em cada unidade da federação, e revisar a escala penal, especialmente para o tráfico de pequenas quantidades de droga, para permitir o planejamento da gestão da massa carcerária e a destinação dos recursos necessários e suficientes para tanto, sob pena de responsabilidade dos administradores públicos; (vii) fomentar o trabalho e estudo do preso, mediante envolvimento de entidades que recebem recursos públicos, notadamente os serviços sociais autônomos; (viii) destinar as verbas decorrentes da prestação pecuniária para criação de postos de trabalho e estudo no sistema prisional. 6. Decisão de caráter aditivo. Determinação que o Conselho Nacional de Justiça apresente: ( i ) projeto de estruturação do Cadastro Nacional de Presos, com etapas e prazos de implementação, devendo o banco de dados conter informações suficientes para identificar os mais próximos da progressão ou extinção da pena; (ii) relatório sobre a implantação das centrais de monitoração e penas alternativas, acompanhado, se for o caso, de projeto de medidas ulteriores para desenvolvimento dessas estruturas; (iii) projeto para reduzir ou eliminar o tempo de análise de progressões de regime ou outros benefícios que possam levar à liberdade; (iv ) relatório deverá avaliar (a) a adoção de estabelecimentos penais alternativos; (b) o fomento à oferta de trabalho e o estudo para os sentenciados; (c) a facilitação da tarefa das unidades da Federação na obtenção e acompanhamento dos financiamentos com recursos do FUNPEN; (d) a adoção de melhorias da administração judiciária ligada à execução penal. 7. Estabelecimento de interpretação conforme a Constituição para (a) excluir qualquer interpretação que permita o contingenciamento do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), criado pela Lei Complementar 79/94; b) estabelecer que a utilização de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) para financiar centrais de monitoração eletrônica e penas alternativas é compatível com a interpretação do art. 3º da Lei Complementar 79/94. 8. Caso concreto: o Tribunal de Justiça reconheceu, em sede de apelação em ação penal, a inexistência de estabelecimento adequado ao cumprimento de pena privativa de liberdade no regime semiaberto e, como consequência, determinou o cumprimento da pena em prisão domiciliar, até que disponibilizada vaga. Recurso extraordinário provido em parte, apenas para determinar que, havendo viabilidade, ao invés da prisão domiciliar, sejam observados ( i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada do recorrido, enquanto em regime semiaberto; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado após progressão ao regime aberto” (grifos no original).
Conforme se verifica, é certo que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, entretanto, não há que se descartar a possibilidade de cumprimento das penas do regime semiaberto em estabelecimento que não se caracteriza como colônia agrícola ou industrial.
Decidiu esta Suprema Corte que os juízes da execução penal poderão avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes, como se dá na espécie.
E, nessa hipótese, são aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como colônias agrícola ou industrial para o regime semiaberto e, ainda, casa de albergado ou estabelecimento adequado para o regime aberto. A ressalva é de que não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado. Isso não acontece no presente caso.
Com efeito, o ato impugnado tem os seguintes fundamentos:
“[…]
A prisão domiciliar é benefício previsto aos apenados em regime aberto que possuírem mais de 70 (setenta) anos ou estiverem acometidos por doença grave, e, exclusivamente no caso das apenadas, durante a gestação ou no caso de possuírem filho menor ou deficiente físico ou mental (art. 117 da Lei de Execução Penal).
O apenado, contudo, não juntou aos autos documento hábil a comprovar quaisquer das hipóteses taxativas de concessão de prisão domiciliar previstas da legislação vigente.
Ademais, o requisito objetivo para a progressão ao regime aberto será preenchido somente em 30.09.2016, conforme a previsão de benefícios de fls. 148/151.
Não se olvida que o apenado tenha direito de cumprir a reprimenda em estabelecimento adequado ao regime imposto, porém a concessão da prisão domiciliar ou do regime aberto, no caso concreto, não se afigura como solução viável diante do regramento previsto na Lei de Execução Penal.
[…]
Outrossim, não há notícias de que o apenado esteja recolhido juntamente com detentos de regime mais gravoso ou que as garantias inerentes ao regime semiaberto não lhe estejam sendo asseguradas na unidade prisional, sendo que, em casos semelhantes ao dos autos, a jurisprudência do nosso Tribunal vem se posicionando no sentido de conceder prazo razoável para a adequada alocação do apenado pelo DEAP, haja vista o colapso do sistema prisional, inclusive no que toca ao número de vagas para o regime semiaberto .
[…]
In casu, porém, o apenado que até então estava recolhido no presídio foi transferido para a penitenciária, para seguir cumprindo a pena em ala exclusiva de semiaberto, tendo todos seus diretos assegurados. Destarte, não mais existe qualquer irregularidade” (págs. 52-54 do documento eletrônico 11 – grifei).
Registre-se, ainda, que, ao opinar quanto ao pedido do ora reclamante, o membro do Ministério Público do Estado de Santa Catariana manifestou-se nos seguintes termos:
“Diante do pleito de concessão de regime aberto ou prisão domiciliar em razão do apenado não estar em Colônia Penal, solicitou-se informação à unidade prisional em que o sentenciado se encontra, a qual esclareceu que embora esteja na Penitenciária desta Capital, o reeducando está em local destinado apenas a internos do regime semiaberto, sendo que todos os benefícios inerentes a tal regime estão lhe sendo garantidos .
Pois bem, não estando o apenado recolhido com detentos de outros regimes e não havendo informação de que seus direitos como de alimentação, visita, banho de sol, trabalho, saída temporária, higiene e outros estejam sendo tolhidos, ressalta-se a possibilidade dos reeducandos do regime semiaberto ficarem alojados em compartimento coletivo e/ou em estabelecimento similar à Colônia Agrícola ou Industrial, conforme dispõe art. 91 e 92 da LEP, portanto, não se vislumbra irregularidades quanto a alocação do sentenciado ” (pág. 50 do documento eletrônico 11 – grifei).
Conforme se verifica, não há que se falar em desrespeito ao enunciado da Súmula Vinculante 56, pois a decisão combatida harmoniza-se com a orientação jurisprudencial desta Suprema Corte.
Isso posto, julgo improcedente esta reclamação.
É como voto.
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