STJ: reembolso de despesas não configura corrupção passiva
No HC 541.447-SP, julgado em 14/09/2021, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, “para tipificação do art. 317 do Código Penal – corrupção passiva -, deve ser demonstrada a solicitação ou recebimento de vantagem indevida pelo agente público, não configurada quando há mero ressarcimento ou reembolso de despesa”.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A questão que se coloca é se o recebimento de ressarcimento pelos gastos decorrentes do uso do equipamento de videolaparoscopia, técnica cirúrgica não coberta pelo SUS, configura ou não vantagem indevida para fins penais.
Na dicção do art. 317 do CP, configura o crime de corrupção passiva a conduta de “solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.
Não se ignora que a Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (Lei n. 8.080/1990) e a Portaria n. 113/1997 do Ministério da Saúde vedam a cobrança de valores do paciente ou familiares a título de complementação, dado o caráter universal e gratuito do sistema público de saúde, entendimento reforçado pelo STF no julgamento do RE n. 581.488/RS, com repercussão geral, em que se afastou a possibilidade de “diferença de classe” em internações hospitalares pelo SUS (relator Ministro Dias Toffoli, Plenário, DJe de 8/4/2016).
Assim, sob o aspecto administrativo, se eventualmente comprovada a exigência de complementação de honorários médicos ou a dupla cobrança por ato médico realizado, estaria configurada afronta à legislação citada, bem como aos arts. 65 e 66 do Código de Ética Médica.
Todavia, a tipificação do art. 317 do CP exige a comprovação de recebimento de vantagem indevida pelo médico, não configurada quando há mero ressarcimento ou reembolso de despesas, conquanto desatendidas as normas administrativas.
Com efeito, o uso da aparelhagem de videolaparoscopia importam em custos de manutenção e reposição de peças, não sendo razoável obrigar o médico a suportar tais gastos, em especial quando houver aquiescência da vítima à adoção da técnica cirúrgica por lhe ser notoriamente mais benéfica em relação à cirurgia tradicional ou “aberta”.
Desse modo, o reembolso dos gastos pelo uso do equipamento não representa o recebimento de vantagem pelo acusado, não demonstrada a elementar normativa do art. 317 do Código Penal.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
DOUTRINA
“a indiferença sobre a licitude ou ilicitude do ato objeto da conduta ativa ou omissiva do funcionário venal […] reside na gravidade do tráfico do comércio da função, que acarreta o descrédito e a degradação da administração pública perante a coletividade” (BITENCOURT, Cezar Roberto Tratado de Direito Penal: Parte Especial: crimes contra a administração pública e crimes praticados por prefeitos ? arts. 312 a 359-H e Lei n. 10.028/2000 [e-book]. v. 5. 15ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 58).
LEGISLAÇÃO
art. 317 do Código Penal; Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (Lei n. 8.080/1990); Portaria n. 113/1997 do Ministério da Saúde; arts. 65 e 66 do Código de Ética Médica.
SÚMULAS
Súmula n. 648/STJ: A superveniência da sentença condenatória prejudica o pedido de trancamento da ação penal por falta de justa causa feito em habeas corpus.
Fonte: Informativo de Jurisprudência – Edição Especial de Direito Penal nº 4 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – leia aqui.
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