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Evinis Talon

STJ: o roubo cometido em um só ato contra o patrimônio de várias vítimas configura concurso formal de crimes

10/12/2025

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STJ: o roubo cometido em um só ato contra o patrimônio de várias vítimas configura concurso formal de crimes

No REsp 1.960.300-GO, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que “o cometimento de crimes de roubo mediante uma única conduta e sem desígnios autônomos contra o patrimônio de diferentes vítimas, ainda que da mesma família, configura concurso formal de crimes (art. 70 do Código Penal)”.

Informações do inteiro teor:

A questão submetida a julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 1.036 do Código de Processo Civil, para formação de precedente vinculante previsto no art. 927, III, do Código de Processo Civil, é a seguinte: “definir se a prática de crimes de roubo mediante uma única conduta e com violação do patrimônio de diferentes vítimas, ainda que da mesma família, configura concurso formal de crimes.”.

O Tribunal de origem reconheceu a ocorrência de crime único de roubo, afastando o concurso formal de crimes, ao fundamento de que não seria possível individualizar os bens subtraídos na residência das vítimas, pertencentes à mesma família.

No entanto, a solução do problema depende de uma questão elementar: o objeto jurídico tutelado pelo crime de roubo é o patrimônio. Consequentemente, a ação do agente, o dolo e a consumação do crime passam, necessariamente, pelo liame constatado entre a escolha livre e consciente do agente e o direcionamento de sua conduta ao patrimônio violado.

O Direito Penal brasileiro adotou, como regra, a “Teoria da Vontade” para a caracterização do dolo, definido como a vontade livre e consciente de alcançar determinado desfecho, contida na expressão “quando o agente quis o resultado” disposta no art. 18, I, do Código Penal.

Já para o dolo eventual, a legislação pátria filiou-se à “Teoria do Assentimento” ou do “Consentimento”, configurando-se essa modalidade de dolo quando o agente, ainda que não pretendesse diretamente certo resultado, com ele consente, nos termos da expressão “assumiu o risco de produzi-lo [o resultado]”, existente na parte final do mesmo inciso I do art. 18 do Código Penal.

Nesse contexto, tratando-se o roubo de um crime contra o patrimônio e cometida a sua realização mediante uma única conduta, deverá o intérprete verificar se a vontade do agente se dirigiu contra o patrimônio de mais de uma vítima, ainda que tal direcionamento tenha se dado na forma de risco plausível de o patrimônio pertencer a diferentes pessoas (dolo eventual).

Portanto, se, com o objetivo de subtrair coisa alheia móvel mediante violência ou grave ameaça, o agente adentra uma residência na qual (i) reside mais de uma pessoa, (ii) encontra mais de uma pessoa ou, (iii) por qualquer outra forma, tem a consciência ou pode prever que está a violar o patrimônio de mais de uma pessoa, não é possível cogitar da ocorrência de crime único.

O raciocínio não pode ser excluído da situação em que os bens pertencem a diferentes pessoas de uma mesma família e vale para qualquer contexto em que praticados os crimes por meio da mesma ação ou omissão, tais como a abordagem de duas ou mais pessoas em via pública, em restaurante, em veículo ou em transporte coletivo.

Efetivamente, sempre que o bem jurídico violado pertencer a diferentes pessoas, cada qual constituído em patrimônio que recebe proteção legal própria, não se pode pensar na incidência do crime único.

A aplicação do concurso formal, aliás, veicula favor do legislador, que, mesmo quando praticado mais de um crime, e desde que presentes as condições legais, autoriza a aplicação de uma causa de aumento de pena em substituição ao somatório de penas do concurso material. Para tanto, deve estar caracterizado que o agente, “mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não”, exceto se “a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos”, conforme previsto no art. 70, caput, do Código Penal.

Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é há muito pacífica sobre o tema, mesmo quando os patrimônios atingidos sejam da mesma família. Nessa linha, seria absoluto contrassenso tornar a conduta mais branda pela simples razão de as vítimas serem da mesma família, distinção que, além de desproporcional e ofensiva ao princípio da proibição da proteção deficiente, não contaria com suporte legal.

Em suma, “ocorre concurso formal quando o agente, mediante uma só ação, pratica crimes de roubo contra vítimas diferentes, ainda que da mesma família, eis que caracterizada a violação a patrimônios distintos” (HC 207.543/SP, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 17/4/2012).

No caso, os agentes adentraram a residência das duas vítimas, que foram surpreendidas, ameaçadas e tiveram seus patrimônios violados. Diante disso, ao contrário do que concluiu o Tribunal de origem, é desnecessária a individualização dos bens de cada vítima no contexto fático, sendo obrigatória a exasperação oriunda do concurso formal próprio, previsto no art. 70 do Código Penal.

Referida aplicação, deve-se frisar, constitui benefício penal concedido aos agentes pelo legislador e permite a incidência de causa de aumento de pena em vez do concurso material, ainda que mais de um crime tenha sido praticado, porquanto, por outro lado, não ficou provada a existência de desígnios autônomos que faria incidir o concurso formal impróprio.

Ante o exposto, fixa-se a seguinte tese do Tema Repetitivo 1192/STJ: O cometimento de crimes de roubo mediante uma única conduta e sem desígnios autônomos contra o patrimônio de diferentes vítimas, ainda que da mesma família, configura concurso formal de crimes.

Leia a ementa:

DIREITO PENAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA N. 1.192 DO STJ. CRIMES DE ROUBO. CONDUTA ÚNICA. CONCURSO FORMAL DE CRIMES. VIOLAÇÃO DE PATRIMÔNIOS DISTINTOS. RECURSO PROVIDO. TESE FIXADA COM REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.  I. Caso em exame 1. Recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Goiás contra o acórdão do Tribunal de Justiça de Goiás que reconheceu a ocorrência de crime único de roubo, afastando o concurso formal de crimes, ao fundamento de que não seria possível individualizar os bens subtraídos na residência das vítimas, pertencentes à mesma família. 2. Fato relevante. Os agentes invadiram a residência de duas vítimas e subtraíram diversos bens móveis mediante grave ameaça. 3. Decisão recorrida. O Tribunal de origem afastou o concurso formal de crimes, considerando tratar-se de crime único, e excluiu a causa de aumento prevista no art. 70 do Código Penal. II. Questão em discussão 4. A questão em discussão consiste em saber se o cometimento de crimes de roubo mediante uma única conduta contra vítimas distintas, ainda que da mesma família, configura concurso formal de crimes. III. Razões de decidir 5. O concurso formal de crimes está configurado quando, mediante uma única conduta, o agente viola patrimônios distintos, de diferentes vítimas, ainda que integrantes da mesma família, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça. 6. A individualização dos bens subtraídos não é necessária para caracterizar a pluralidade de patrimônios violados, bastando que os bens pertençam a vítimas distintas. 7. O dolo do agente, ao assumir o risco de violar patrimônios de diferentes pessoas, autoriza a aplicação do concurso formal próprio, previsto no art. 70 do Código Penal, sendo irrelevante o vínculo familiar entre as vítimas. A jurisprudência nacional é pacífica ao concluir que a ofensa a mais de um patrimônio impede a configuração de crime único. 8. A pretensão recursal deve ser acolhida, bem como fixada tese para o Tema n. 1.192 do STJ, observados os arts. 927, III, e 1.036 do Código de Processo Civil, com reafirmação da jurisprudência. IV. Dispositivo e tese 9. Resultado do Julgamento: Recurso provido para reincluir na dosimetria da pena a majorante do concurso formal próprio de crimes, prevista no art. 70 do Código Penal. Questão realinhada e tese definida para o Tema n. 1.192 do STJ. Questão e tese para o Tema Repetitivo n. 1.192 do STJ: Questão afetada: Definir se a prática de crimes de roubo mediante uma única conduta e com violação do patrimônio de diferentes vítimas, ainda que da mesma família, configura concurso formal de crimes. Tese fixada: O cometimento de crimes de roubo mediante uma única conduta e sem desígnios autônomos contra o patrimônio de diferentes vítimas, ainda que da mesma família, configura concurso formal de crimes (art. 70 do CP). Dispositivos relevantes citados: CP, art. 70; CPC, arts. 927, III, e 1.036. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 152.690/SP, relator Ministro Jorge Scartezzini, Quinta Turma, julgado em 4/11/1999, DJ de 6/12/1999, p. 108; STJ, RvCr n. 717/SP, relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 10/8/2005, DJ de 14/9/2005, p. 189; STJ, AgRg no REsp n. 1.009.998/RS, de minha relatoria, Sexta Turma, julgado em 2/8/2011; STJ, HC 207.543/SP, relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 17/4/2012; STJ, AgRg no HC n. 752.776/SC, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 6/3/2023; STJ, AgRg no AREsp n. 2.654.780/MA, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 27/8/2024, DJe de 3/9/2024. (REsp n. 1.960.300/GO, relator Ministro Og Fernandes, Terceira Seção, julgado em 8/10/2025, DJEN de 15/10/2025.)

INFORMAÇÕES ADICIONAIS:

Legislação

Código Penal (CP), art. 18, I, e art. 70

Código de Processo Civil (CPC), art. 927, III

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Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) –  Edição nº 868, de 28 de outubro de 2025 (leia aqui).

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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