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Evinis Talon

STJ: é possível a transferência de execução de pena de brasileiro nato

10/04/2024

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STJ: é possível a transferência de execução de pena de brasileiro nato

No HDE 7.986-EX, julgado em 20/03/2024, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a transferência da execução de pena de brasileiro nato para ser cumprida no Brasil, imposta em outro país, não viola o núcleo do direito fundamental contido no art. 5º, inciso LI, da Constituição Federal.

Informações do inteiro teor:

O Governo da Itália apresentou pedido de transferência de execução da pena imposta a brasileiro nato condenado a nove anos de prisão por estupro contra uma mulher albanesa, na Itália, em 2013.

Inicialmente, pontua-se que o sistema de contenciosidade limitada adotado pelo Brasil em matéria de homologação de sentença penal estrangeira impede a rediscussão do mérito da ação penal que resultou na condenação do cidadão brasileiro.

A transferência de execução penal é instituto processual de cooperação internacional, previsto em tratados internacionais dos quais o Brasil é parte e está positivado na Lei n. 13.445/2017. Cuida de hipótese voltada à aplicação de pena privativa de liberdade, após seu regular reconhecimento pelo STJ, que for imposta no exterior a nacionais ou a estrangeiros que aqui tenham residência habitual.

A Constituição Federal veda a extradição de brasileiro nato, conforme o art. 5º, LI, o que não impede o deferimento do pedido de cooperação internacional, que trata de instituto diverso. A homologação de sentença estrangeira não consistirá na entrega de nacional brasileiro condenado criminalmente para cumprimento de pena em outro país.

Nesse sentido, o próprio governo brasileiro admitiu o processamento do pedido de transferência de pena, formulado pelo Governo da Itália, pois, por meio de tratados internacionais, a rede de proteção de cidadãos brasileiros foi fortalecida com a possibilidade de cumprimento de pena no seu próprio país, com isso, além da transferência de execução da pena, também se possibilita a própria transferência do preso que cumpre pena fora do território nacional.

Dessa forma, não há inconstitucionalidade na transferência de execução de pena, porque não há violação do núcleo do direito fundamental contido no art. 5º, LI, da CF. Pelo contrário, há um reforço do compromisso internacional do Brasil em adotar instrumentos de cooperação eficientes para assegurar a eficácia da jurisdição criminal.

Ademais, descabida a interpretação segundo a qual se aplicaria a transferência apenas nos casos em que cabível a extradição, pois praticamente seria letra morta na legislação. Naturalmente que o país requerente sempre daria preferência à extradição, relegando à inutilidade a previsão de transferência da execução. De outro lado, esse modelo de solução alternativa está posto em diversos Tratados Internacionais (como as Convenções de Viena, Palermo e Mérida), nos quais há previsão expressa de transferência da execução sempre que a extradição for recusada pelo critério da nacionalidade.

Destaca-se, ainda, que a negativa em homologar a sentença estrangeira geraria a impossibilidade completa de nova persecução penal, na medida em que não poderá ser novamente processado e julgado pelo mesmo fato que resultou em sua condenação na Itália.

Trata-se do instituto do non bis in idem, também contemplado no art. 100 da Lei n. 13.445/2017, que assim dispõe: “Nas hipóteses em que couber solicitação de extradição executória, a autoridade competente poderá solicitar ou autorizar a transferência de execução da pena, desde que observado o princípio do non bis in idem.“.

Sobre o tema, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no HC 171118 de relatoria do ministro Gilmar Mendes, ao interpretar os arts. 5º, 6º e 8º do Código Penal, assentou que a proibição da dupla incriminação também incide no âmbito internacional. Assim, no Brasil, não se admite que um cidadão seja novamente processado e julgado pelos mesmos fatos que resultaram em sua condenação definitiva no exterior.

Da mesma forma, o argumento de que a aplicação da Lei n. 13.445/2017 violaria o “princípio constitucional da irretroatividade da nova lei penal mais gravosa” não subsiste ante a natureza jurídica da cooperação internacional.

O STF já decidiu que as normas sobre cooperação internacional em matéria penal não têm natureza criminal, o que permite a aplicação imediata conforme art. 6º da LINDB. Com isso, a norma de cooperação internacional pode ser “imediatamente aplicável, seja em benefício, seja em prejuízo do extraditando”.

Com a edição do art. 100 da Lei n. 13.445/2017, não há mais dúvida acerca da possibilidade da transferência da execução da pena, pois houve mitigação do princípio da territorialidade das penas previsto no art. 9º do Código Penal. Como o novo instituto veda a propositura de nova ação penal sobre o mesmo fato no território nacional, assegurou-se maior efetividade da jurisdição criminal. Reconhece-se, assim, o princípio do non bis in idem no plano internacional.

Por fim, não é possível declarar a nulidade da ação penal que tramitou na Itália por inobservância de normas da legislação penal e processual brasileira. Nos tratados internacionais celebrados entre o Brasil e a Itália, não há norma que imponha o dever de o Poder Judiciário italiano aplicar as normas procedimentais brasileiras em processo que apura responsabilidade criminal de brasileiro.

Sendo assim, a homologação da transferência de execução da pena ao efetivar a cooperação internacional, tem o condão de, secundariamente, resguardar os direitos humanos das vítimas. A homologação da sentença não é um fim em si mesmo, mas um instrumento efetivação dos direitos fundamentais tanto do condenado como da vítima.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS:

LEGISLAÇÃO:

Constituição Federal (CF), art. 5º, LI

Código Penal (CP), arts. 5º, 6º e 8º

Lei n. 13.445/2017, art. 100 

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Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) –  Edição nº 805 – leia aqui.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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