Decisão proferida pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça no A AgRg no AREsp 635778/PE, julgado em julgado em 10/12/2015 (leia a íntegra do acórdão).
Confira a ementa:
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. REVISÃO CRIMINAL. RETRATAÇÃO DA VÍTIMA. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A retratação da vítima hábil à instauração da revisão criminal impõe a inexistência de dúvidas quanto à falsidade da prova produzida e que o seu afastamento seja relevante a ponto de modificar o convencimento do juízo sentenciante. 2. No presente caso, o acórdão impugnado assentou que o depoimento da vítima que embasou a condenação foi corroborada por depoimentos indiretos, cuja relevância decorre das declarações prestadas pelo adolescente. 3. Alterar o entendimento da instância ordinária quanto à suficiência da justificação judicial para absolver o paciente ou anular parte da ação penal demandaria análise de matéria fático-probatória, o que encontra óbice na Súmula 7 desta Corte. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 635.778/PE, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 10/12/2015, DJe 17/02/2016)
Leia a íntegra do voto:
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator):
A irresignação não merece prosperar.
A jurisprudência desta Corte admite a utilização da retratação dos depoimentos da vítima promovida através de justificação criminal como elemento apto a fundamentar pedido de revisão criminal, desde que não existam dúvidas quanto à falsidade da prova produzida e que o afastamento da prova (depoimento alegadamente falso) seja relevante a ponto de modificar o convencimento do juízo sentenciante.
Nesse sentido:
RECURSO EM HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. JUSTIFICAÇÃO CRIMINAL VISANDO A PRODUÇÃO DE PROVA PARA INSTRUIR REVISÃO CRIMINAL. REINQUERIMENTO DA VÍTIMA JÁ OUVIDA NA AÇÃO PENAL. RETRATAÇÃO. 1. A justificação criminal serve para colher prova nova a fim de instruir ação revisional. 2. No caso, configura constrangimento ilegal o indeferimento de pedido de justificação criminal para reinquirição da vítima, porquanto sua retratação – já declarada – é prova substancialmente nova. Diante do princípio da verdade real, não há por que não garantir ao condenado a possibilidade de confrontar essa retratação – se confirmada em Juízo -, na revisão, com os demais elementos de convicção coligidos na instrução criminal. 3. Recurso provido. (RHC 58.442/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 25/08/2015, DJe 15/09/2015)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA EM RAZÃO DA IDADE. REVISÃO CRIMINAL. RETRATAÇÃO DA VÍTIMA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. REANÁLISE DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acompanhando a orientação da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, firmou-se no sentido de que o habeas corpus não pode ser utilizado como substituto de recurso próprio, sob pena de desvirtuar a finalidade dessa garantia constitucional, exceto quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício. 2. A retratação da vítima pode ensejar a revisão criminal. Todavia, é necessário que não existam dúvidas quanto à falsidade da prova produzida e que o afastamento dela seja relevante a ponto de modificar o convencimento do juízo sentenciante. 3. No presente caso, o acórdão impugnado levanta algumas dúvidas sobre a falsidade do depoimento da vítima no processo originário, destacando que a nova versão não se coaduna com as demais provas presente nos autos. 4. Alterar o entendimento da instância ordinária quanto à suficiência da justificação judicial para absolver o paciente ou anular parte da ação penal demandaria análise de matéria fático-probatória, o que não se coaduna com a via estreita do writ. 5. Habeas corpus não conhecido. (HC 293.191/PE, minha relatoria, QUINTA TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 18/05/2015)
In casu, esse juízo prévio foi feito pelo Tribunal ordinário que, ademais, admitiu a ação e julgou procedente a revisão criminal para absolver o ora recorrido, afirmando que o depoimento declaradamente falso serviu de alicerce fundamental à condenação, apenas guarnecida por depoimentos indiretos que teriam relevância somente em função das declarações prestadas pela vítima.
Segundo anotado no acórdão recorrido, a retratação foi produzida no curso da justificação com a presença de representantes do Ministério Público, o que afasta a alegação de ausência de contraditório. Uma vez que as declarações da vítima foram fundamentais à condenação, a sua retificação através da retratação serviria como alicerce à absolvição, conforme se pode verificar em trecho extraído do voto do relator da ação revisional:
Compulsando os autos, constata-se que o requerente foi denunciado e condenado pelo suposto cometimento de crime previsto no art. 217-A, c/c o art. 14, ambos do Código Penal, mesmo afirmando que não praticou nenhum ato libidinoso contra a vítima, esta declarou, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, de forma segura, que houve o referido crime, o que, juntamente com os demais elementos probatórios, alicerçou, de forma inequívoca o convencimento do magistrado a quo. Ocorre que, em sede de justificação judicial, a referida vítima declarou que o requerente [D. de S. B.] não praticou nenhum ato libidinoso contra a sua pessoa. Afirmou ainda que ele simplesmente o abraçou, e que, com medo saiu gritando, e daí surgiu a história da tentativa de atentado violento ao pudor. Não negou antes a história com medo de apanhar de sua genitora. Consta ainda, nos autos da referida ação, que a vítima somente teve a consciência da gravidade da acusação quando o requerente foi condenado e preso pelo referido delito, estando profundamente arrependido do que fez, pois não acreditava que ele pudesse ser processado e muito menos condenado. […] Observa-se que o depoimento acima mencionado se deu em processo cautelar, com plena observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Portanto, trata-se de prova plenamente hábil a formar o convencimento deste juízo. Ressalte-se que apalavra da vítima deve ser levada em extrema consideração, visto que, em crimes sexuais, suas declarações consistem prova de grande importância. Deste modo, se o depoimento da vítima serve de alicerce à condenação, de igual forma deve ocorrer quanto absolvição. Logo, considerando que a condenação se deu, sobretudo, pela declaração da vítima que, no processo originário, afirmou que o requerente praticou ato libidinoso contra a sua pessoa, vindo, posteriormente, a se retratar em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, não há alternativa que não deferir o pleito revisional e desconstituir a sentença condenatória proferida contra o requerente (fls. 105/107)
Dessa forma, como anotado na decisão monocrática, entendo que a pretensão recursal tendente a desconstituir a conclusão adotada pela corte ordinária quanto à suficiência da retratação promovida pela vítima, através da via adequada da justificação e submetida ao contraditório, encontra óbice na Súmula 7 do STJ.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo regimental.
É como voto.
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