Notícia publicada no site do Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 16 de outubro de 2019 (leia aqui), referente ao RE 817338.
Por seis votos a cinco, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a possibilidade de revogação das anistias concedidas a cabos da aeronáutica atingidos por portaria do ministro da Aeronáutica que, em 1964, estabeleceu prazo máximo de permanência em serviço para cabos não concursados. De acordo com a decisão, porém, é garantido ao anistiado a defesa administrativa e a não devolução das verbas recebidas de boa-fé.
A questão foi analisada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 817338, com repercussão geral reconhecida, concluído nesta quarta-feira (16) com o voto de desempate do ministro Luiz Fux, que acompanhou o entendimento do relator do RE, ministro Dias Toffoli. De acordo com Fux, o decurso do prazo decadencial de cinco anos não é obstáculo para que a administração pública reveja atos que preservem situações inconstitucionais.
Com esse voto, prevaleceu o entendimento de que, mesmo após decorrido o prazo legal de cinco anos (decadência), é possível que a administração pública faça a revisão de atos administrativos caso seja constatada flagrante inconstitucionalidade. Segundo a maioria, a portaria do Ministério da Aeronáutica, por si só, não constitui ato de exceção, e é necessária a comprovação caso a caso da existência de motivação político-ideológica para a exclusão das Forças Armadas, único fator que possibilita a concessão de anistia. Os ministros entenderam, ainda, que notas técnicas emitidas pela AGU em 2003 e 2006 teriam interrompido o prazo decadencial. Seguiram essa corrente também os ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
Para a corrente minoritária, a revisão não seria possível em razão da incidência do prazo decadencial. Segundo a divergência, pareceres administrativos internos e genéricos, como as notas técnicas da AGU, têm caráter opinativo e não interrompem o prazo decadencial para anulação de ato administrativo, especialmente se não forem editados por autoridade competente para a revisão ou revogação do ato e sem a possibilidade de defesa da parte interessada. Essa corrente foi integrada pelos ministros Edson Fachin, que abriu a divergência, Celso de Mello, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Rosa Weber.
Revisão de anistia
A Portaria 1104/1964 do Ministério da Aeronáutica mudou a regra em vigor antes do início do regime militar para determinar a dispensa dos cabos contratados (não concursados) por mais de oito anos. Em novembro de 2002, a Comissão de Anistia entendeu que a medida configurava ato de exceção de natureza exclusivamente política, o que autorizava o reconhecimento da condição de anistiado dos atingidos com base no dispositivo constitucional que concedeu anistia a perseguidos políticos. Em fevereiro de 2011, o ministro da Justiça e o advogado-geral da União instituíram um grupo de trabalho para revisar as anistias concedidas com fundamento unicamente na Portaria 1.104/1964, o que resultou na anulação de diversos atos.
No caso dos autos, um cabo que obteve anistia em 2003 teve o ato revisto e anulado em 2011, com o fundamento de que não teria sido comprovada a motivação política e que a portaria de 1964 se limitara a disciplinar o tempo máximo de serviço dos militares por ela atingidos.
Em julgamento de mandado de segurança contra a revogação, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, ultrapassado o prazo de cinco anos, fica consumada a decadência administrativa.
No recurso ao STF, a União alegava ofensa ao artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), pois a dispensa, que atingiu a outros 2,5 mil cabos, não teria motivação exclusivamente política, como exigido textualmente nesse dispositivo para justificar a anistia.
Repercussão geral
A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: No exercício de seu poder de autotutela, poderá a administração pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964 quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas recebidas.
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