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Evinis Talon

STF: é defeso à Juíza-Presidente do Tribunal do Júri alertar os jurados quanto aos conteúdos emotivos

22/08/2019

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STF: é defeso à Juíza-Presidente do Tribunal do Júri alertar os jurados quanto aos conteúdos emotivos

Decisão proferida pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal no AI 855774, julgado em 07/08/2012 (leia a íntegra do acórdão).

Confira a ementa:

Agravo regimental em agravo de instrumento. 2. Penal e Processual Penal. 3. O tempo oportuno para pedir a realização de perícia em fita de vídeo apresentada no júri perpassa, necessariamente, pela análise do artigo 571, I, do Código de Processo Penal. 4. É defeso à Juíza-Presidente do Tribunal do Júri fazer o alerta pleiteado pela defesa – quanto ao conteúdo emotivo da fita exibida em plenário – em razão da exigência de imparcialidade, sob pena de tornar irrelevante a prova da acusação. 5. Indeferimento da utilização de outro processo em plenário, sem prévia juntada pela defesa. Necessidade de interpretação da regra descrita no art. 475 do CPP. Matéria infraconstitucional. 6. A negativa de oitiva de testemunhas com o intuito de demonstrar suposta inimizade em relação ao agravante fundamentada à saciedade. Contradita que já havia sido analisada durante a instrução criminal. 7. Supostas nulidades oriundas de falhas na quesitação. Necessária interpretação do artigo 484, V, do CPP (conforme redação do Decreto-Lei 3.689/41, alterada pela Lei 11.689/2008). Matéria infraconstitucional. De qualquer forma, vale consignar que da redação dos quesitos não se extrai possível prejuízo ao recorrente. 8. Agravo regimental ao qual se nega provimento. (AI 855774 AgR, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 07/08/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-162 DIVULG 16-08-2012 PUBLIC 17-08-2012)

Leia a íntegra do voto:

V O T O

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator): Verifico que as alegações da parte são impertinentes e decorrem de mero inconformismo com a decisão adotada. O agravante não trouxe argumentos suficientes para infirmar a decisão impugnada. Visa apenas à rediscussão da matéria já decidida em conformidade com a jurisprudência pacífica desta Corte.

Da leitura do acórdão que ensejou o recurso extraordinário, não se extrai flagrante nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri, tampouco afronta direta à Constituição Federal, ao contrário, verifica-se que as teses recursais foram afastadas pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais com esteio na legislação infraconstitucional.

No que diz respeito ao indeferimento da realização de perícia na fita de vídeo apresentada aos jurados, o Tribunal a quo teceu as seguintes considerações (fls. 3.055-3.056):

Quanto a tal alegação, resta-nos registrar, tão somente, que já foi objeto de análise no julgamento por esta Corte no Recurso em Sentido Estrito n. 1.0069.04.013444-2/001, onde deixei expressamente consignado em meu voto: ‘A apelação não poderia ser recebida, vez que o despacho atacado não encerrava decisão definitiva ou com força de definitiva, com bem ressaltou o combativo Promotor de Justiça Francisco Assis Santiago. (…) Ademais, conforme apontado em juízo de retratação, a Defesa já tinha conhecimento do arrolamento da fita de vídeo enquanto prova desde o judicium accusationis e, como não se manifestou em tempo hábil, conforme determina o art. 571, I, do Código de Processo Penal, operou-se a preclusão do direito de questioná-la (art. 572, I, do mencionado Codex)’. (grifo original).

Portanto, com fulcro no art. 572, I, do CPP, o Tribunal a quo afastou a alegação de nulidade, ao fundamento de que foi arguida a destempo. Assim, diante da afirmação da Corte mineira no sentido de que houve arrolamento prévio da fita de vídeo como meio de prova, não há de falarse de cerceamento de defesa pela negativa de realização de exame pericial, porque o tempo oportuno para pedir essa prova técnica perpassa, necessariamente, pela análise do artigo 571, I, do Código de Processo Penal, mencionado na fundamentação do acórdão recorrido.

No que diz respeito ao alerta pleiteado pela defesa – quanto ao conteúdo emotivo da fita exibida em plenário – o acórdão recorrido ressaltou ser defeso à Juíza-Presidente fazê-lo, em razão da exigência de imparcialidade diante do Júri. Em suma, fundamentou que a manifestação da Magistrada, nos moldes pleiteados pela defesa, poderia tornar irrelevante a prova praticada pela acusação (fl. 3061).

Relativamente ao indeferimento da utilização do Processo n. 069.02.006863-6 em plenário, sem prévia juntada pela defesa, o Tribunal a quo apontou a necessidade de juntada prévia aos autos com individualização das peças a serem lidas, apontando a regra descrita no art. 475 do CPP, segundo a qual durante o julgamento não será permitida a produção ou leitura de documento que não tiver sido comunicado à parte contrária, com antecedência, pelo menos, de 3 (três) dias, compreendida nessa proibição a leitura de jornais ou qualquer escrito, cujo conteúdo versar sobre matéria de fato constante do processo.

A propósito, transcrevo trecho relevante do acórdão:

Como bem salientou a ilustre Magistrada às fls. 2.689/2.692, ‘os documentos constantes dos referidos autos, cuja utilização em Plenário foi protestada previamente à fl. 2.453, além de não juntado aos autos, sequer foram individualizados, ‘de forma a permitir o conhecimento da parte contrária.’ Assim, a Corte mineira assentou ser inócuo o argumento de que se tratava de documento público, processo sem segredo de justiça, porquanto, “não fosse intenção do Causídico dificultar o conhecimento da parte contrária acerca destes, ter-lhes-ia juntado aos presentes autos”.

Portanto, constato que essa questão também demanda interpretação de regras concernentes à leitura de documentos em plenário, regras estas descritas em dispositivo de norma infraconstitucional.

No que tange ao indeferimento de oitiva da testemunha que visava comprovar a contradita, o recorrente alega que, na hipótese de a pessoa contraditada não confirmar os fatos impugnativos de seu depoimento, a parte pode apresentar para o juiz, no ato, documentos a respeito, ou levar a sua presença pessoas que possam, em breve depoimento, confirmar o conteúdo da contradita.

Por sua vez, a negativa de oitiva de testemunhas com o intuito de demonstrar suposta inimizade de Henrique César Louvisi em relação ao agravante foi fundamentada à saciedade.

O Tribunal a quo apontou que a referida testemunha fora ouvida em juízo e que, naquela oportunidade, ouviu-se também Ademias Carvalho e Jurami Alves da Silva, pessoas indicadas pela defesa como hábeis a demonstrar o alegado na contradita. Contudo, as testemunhas da defesa limitaram-se a referir-se a boatos ou informações por elas ouvidos, supostamente oriundas de pessoas que não puderam apontar (fl. 3059).

Tal fato, adicionado ao depoimento de Henrique César Louvisi no sentido de que nunca tinha visto o ora agravante e de que nunca havia sequer conversado com ele, levou a Corte estadual a anuir com conduta da Magistrada em ouvir a testemunha de forma compromissada, afastando a contradita oposta tanto na instrução criminal como em plenário.

Por fim, não merecem melhor sorte as alegações de supostas nulidades oriundas de falhas na quesitação. O ora agravante alega violação ao artigo 483, III, do Código de Processo Penal, o que demonstra a necessidade de interpretação de dispositivo de norma infraconstitucional. De qualquer forma, vale consignar que da redação dos quesitos não se extrai possível prejuízo ao recorrente. Nesse ponto, trago à baila as considerações do acórdão recorrido:

Pergunta-se: como a individualização do réu Ismael pelo nome, e não pela simples menção ‘terceira pessoa’, no primeiro e terceiro quesito, estaria a influir no ânimo dos jurados a ponto de modificar-lhes o entendimento dos fatos ? Forçoso concluir que, da resposta aos referidos quesitos, restou plenamente possível inferir o entendimento dos jurados acerca do que lhes foi indagado. Por outro lado, se o primeiro quesito versa sobre fato principal, mas não abarca a circunstância do suposto ‘pega’, é exatamente pelo fato de que teriam os jurados de responder a duas indagações ao mesmo tempo, acerca da autoria e da ocorrência do ‘pega’, hipótese em que se autoriza a separação das indagações, de forma a não torná-las complexas aos jurados. Registre-se ainda que a defesa insiste em enquadrar o recorrente na condição de partícipe, sendo que a tese acusatória lhe atribui a co-autoria. Enfim, vale enfatizar que os acusados, face das circunstâncias narradas na denúncia, somente poderiam ter assumido o risco de matar ‘alguém’ na forma indeterminada, porquanto não haveria como se prever que as vítimas dos presentes autos estariam dentro do veículo colidido (fls. 3065- 3066).

Como se vê, o núcleo da insurgência diz respeito à correta interpretação de normas infraconstitucionais, tais como os arts. 571, I; 475; 483, III, do Código de Processo Penal, razão pela qual as questões suscitadas não podem ser tratadas em recurso extraordinário, tendo em vista a ocorrência de violação meramente reflexa à Constituição Federal.

Sobre o reconhecimento de ofensa reflexa à Constituição em matéria afeta a julgamento realizado por Tribunal do Júri, confiram-se, entre inúmeros, o julgamento do AI-AgR 822.445/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, unânime, DJe 24.2.2011; do AI-AgR 808.345/SC, rel. Min. Ayres Britto, Segunda Turma, unânime, DJe 14.2.2011 e do AI-AgR 662.918/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, DJe 7.5.2010, cujas ementas seguem respectivamente transcritas:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL PENAL. NULIDADE DO JULGAMENTO. ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE AO ART. 5º, INC. LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. QUESITOS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONTRA ACÓRDÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MATÉRIA DISCUTIDA NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. PRECLUSÃO DAS QUESTÕES CONSTITUCIONAIS. CONTROVÉRSIA DECIDIDA À LUZ DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL E DO CONJUNTO FÁTICOPROBATÓRIO DOS AUTOS. 1. As questões constitucionais postas em discussão se encontram preclusas. É que o primeiro recurso extraordinário simultaneamente interposto ao recurso especial, o qual visava reformar a matéria constitucional que serviu de fundamento para o acórdão recorrido, não foi admitido pela Corte de origem, sendo que não houve a interposição de agravo de instrumento contra essa decisão. Precedentes: AI 134.793-AgR, 364.277-AgR e 145.589-AgR. 2. Caso em que entendimento diverso do adotado pelo aresto impugnado demandaria o reexame da legislação ordinária aplicada à espécie e a análise dos fatos e provas constantes dos autos. Providências vedadas na instância extraordinária. 3. Agravo regimental desprovido. AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO PENAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, XXXVIII, c, e LV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 279. A alegação de violação do art. 5º, LV, da Constituição Federal trata de matéria cuja suposta violação demandaria o exame prévio da legislação infraconstitucional, no caso, do Código de Processo Penal, de modo que se trata de hipótese de ofensa indireta ou reflexa ao texto constitucional. Precedentes. As razões recursais trazem questões constitucionais cuja análise implica reexame dos fatos e provas que fundamentaram as conclusões da decisão recorrida, o que é vedado pela Súmula 279 desta Corte. O agravante não demonstrou o desacerto da decisão ora agravada. Agravo regimental a que se nega provimento.

Nesse contexto, segundo pacífica jurisprudência desta Corte, não deve ser conhecido recurso extraordinário no qual se alega violação aos primados constitucionais do contraditório e da ampla defesa, quando a Constituição Federal for atingida apenas de forma mediata.

Portanto, mantenho a decisão pela qual neguei trânsito ao agravo de instrumento que objetivava o processamento do recurso extraordinário.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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