A mulher no cárcere
Nos livros, na graduação de Direito e na prática forense, reiteradamente se esquece da mulher no cárcere.
Quando a nossa legislação trata da mulher, quase sempre dispõe somente sobre a gestante, a lactante e a mãe, tratando a mulher presa preponderantemente a partir do papel materno.
Segundo dados do Infopen Mulheres de 2014 (clique aqui), entre 2000 e 2014, a população carcerária feminina no Brasil aumentou 567%. Naquela oportunidade, a quantidade de mulheres encarceradas era igual a 6,4% do total de encarcerados. A pesquisa também demonstrou a existência de apenas 103 unidades prisionais exclusivamente femininas e 203 mistas.
De qualquer forma, o baixo número de unidades prisionais femininas não é tão preocupante quando o descumprimento das condições legais pelas unidades existentes.
Explico: há previsões legais importantíssimas que raramente são observadas na prática.
Cita-se como exemplo o relevante art. 83, §2º, da LEP, que dispõe que os estabelecimentos penais para mulheres devem ter berçário, onde elas possam cuidar dos filhos e amamentá-los, no mínimo, até os 6 meses de idade.
Por sua vez, o art. 83, §3º, da LEP, afirma que os estabelecimentos penais destinados a mulheres devem ter agentes exclusivamente do sexo feminino. Certamente, essa previsão tem o escopo de evitar maus tratos, abusos sexuais e violação da intimidade das mulheres presas. Ocorre que, nos estabelecimentos penais mistos, é comum que agentes penitenciários do sexo masculino tenham acesso à área destinada às presas.
Quanto ao direito à saúde, o art. 14, §3º, da Lei de Execução Penal, prevê que será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.
Também é um importante direito a prisão domiciliar, substituindo a prisão preventiva, no caso de gestantes e mulheres com filhos de até 12 anos de idade incompletos (art. 318, IV e V, do CPP).
Aliás, se fosse realizado um filtro por meio de um mutirão carcerário, provavelmente muitas presas conseguiriam a prisão domiciliar. O problema é que, no dia a dia, os Juízes somente se preocupam com a prisão domiciliar de mulheres quando o domicílio tem vários quartos, salas e metros quadrados. Infelizmente, ainda é um direito de poucas afortunadas.
Obviamente, a crítica que exponho não é para restringir a prisão domiciliar das presas que tenham boas condições financeiras (como Adriana Ancelmo), mas para estendê-la faticamente a todas as apenadas que preencham os requisitos legais, considerando que o patrimônio deveria ser irrelevante para tutelar a condição da mulher presa.
Ademais, veda-se a utilização de algemas em mulheres durante o trabalho de parto, no trajeto entre o estabelecimento prisional e o hospital e após o parto, enquanto estiver hospitalizada, nos termos do art. 3º do Decreto 8.858/2016. Em sentido semelhante, o art. 292, parágrafo único, do Código de Processo Penal: “É vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto e durante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato.”
Tentando contribuir para a melhoria do sistema penitenciário feminino, foi editada a Portaria Interministerial 210, de 16/01/2014, que instituiu a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional.
É imprescindível que o Brasil desenvolva mais políticas prisionais destinadas às mulheres, cuidando não apenas da situação específica das apenadas mães, mas também daquelas que tenham outras necessidades. Assim, deve-se preocupar, por exemplo com o acompanhamento de ginecologista (assistência à saúde) e com o fornecimento de absorventes (assistência material), além do desenvolvimento de políticas que contribuam para a entrada – muitas presas são abandonadas pela família durante a execução da pena – ou a reinserção das apenadas no mercado de trabalho.
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