Breve análise da denúncia
Por meio da ação penal, instrumentalizada na denúncia ou queixa, a acusação é delimitada, o que constitui uma importante garantia para a defesa.
O art. 41 do Código de Processo Penal prevê que a denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
O dispositivo legal supracitado é normalmente ignorado, mas é um dos artigos do Código de Processo Penal mais importantes para os advogados criminalistas, porquanto delimita a acusação. Quanto mais delimitado o fato imputado ao réu, melhor a defesa conseguirá desempenhar o seu papel. Para a defesa, é melhor uma denúncia que diga que alguém praticou determinado crime no dia 05/05/2015, às 8:25, na rua X da cidade Y do que uma denúncia que diga que alguém praticou um crime “possivelmente entre 2013 e 2015, em local incerto”.
Assim, é recomendável que a defesa sempre avalie se é caso de postular a nulidade do processo por inépcia da denúncia (leia aqui) ou o trancamento do processo em razão da ausência de descrição de fato típico.
Fala-se que o réu se defende dos fatos narrados na denúncia, pois os arts. 383 e 384 do Código de Processo Penal flexibilizariam a classificação jurídica do fato, possibilitando que alguém seja condenado por tipo penal diverso daquele explicitado na denúncia.
Os Advogados precisam reconhecer que a tipificação é inseparável do fato. Em outras palavras, uma advocacia artesanal exige a impugnação conjunta em relação ao fato (provando álibi, demonstrando a ausência de materialidade etc.) e ao Direito (propondo a desclassificação para tipo penal diverso, por exemplo).
De qualquer forma, é evidente que precisamos exigir do órgão acusador uma denúncia que narre claramente todos os elementos fáticos e proponha uma subsunção ao tipo penal que reflita os elementos narrados.
Nesse diapasão, é divergente a possibilidade de oferecimento de denúncia alternativa, isto é, uma denúncia que, em relação ao mesmo contexto fático, impute ao réu dois crimes. Um exemplo seria imputar a alguém que estava na posse de objeto roubado o crime de roubo (fulano subtraiu mediante violência…) ou, alternativamente, o crime de receptação (fulano recebeu coisa que sabe ser produto de crime). Como se percebe, as condutas são totalmente diferentes.
Ora, uma denúncia alternativa tornaria inviável o exercício da defesa, pois, no exemplo acima, o advogado deveria, concomitantemente, produzir provas que afastem o elemento “subtrair” e a violência – em relação ao roubo – e, quanto à receptação, teria que combater o dolo (“sabe ser produto de crime”) e outros elementos totalmente distintos do tipo penal referente ao roubo.
Assim, a maioria da doutrina entende ser inadmissível a denúncia alternativa. Entrementes, há um posicionamento minoritário, capitaneado por Afrânio Silva Jardim, que considera cabível a denúncia com imputações alternativas.
Para o Advogado atuante na área criminal, a ação penal reflete importantes aspectos práticos defensivos.
A defesa deve estar atenta para alegar a inépcia da denúncia – peça que formaliza a ação penal -, especialmente em caso de ausência de individualização da conduta quando há vários réus ou quando a denúncia não menciona o verbo nuclear do tipo penal. Também é importante aferir se a denúncia especifica cada um dos elementos do tipo penal. Assim, se a denúncia imputa ao acusado o crime de roubo, deve especificar claramente em que consiste a violência ou quais foram os termos que produziram uma ameaça à vítima.
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