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Evinis Talon

A criminalização do recebimento dos honorários advocatícios

26/02/2019

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A criminalização do recebimento dos honorários advocatícios

Os ataques contra a Advocacia não são mais uma novidade (clique aqui). Além da constante violação das nossas prerrogativas na prática forense (negativa de acesso aos autos, por exemplo), há uma tendência de implementação de medidas contra a Advocacia, como o monitoramento das conversas entre presos e Advogados, a realização de busca e apreensão em escritórios e a interceptação telefônica de conversas que não tenham conteúdo criminoso, mas apenas o atendimento regular do cliente.

Agora, as medidas passam a ter como foco o recebimento dos honorários.

Há autoridades que simplesmente não concordam com o fato de que Advogados recebam de acordo com a qualidade de seus serviços, e não apenas pela quantidade de horas à disposição, como é o caso dessas autoridades. Há aqueles que não aceitam que um Advogado, com seu espírito empreendedor e enfrentando os desafios da iniciativa privada, tenha uma remuneração superior àquela oferecida pelo serviço público (clique aqui). Alguns tentam disfarçar essa vontade de estar do outro lado – acompanhada da falta de coragem para deixar o cargo – com o arbitramento dos honorários dos dativos em valores ínfimos.

De qualquer forma, pesquisando nos sites da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, encontramos um nítido direcionamento contra o recebimento de honorários advocatícios. Há inúmeros projetos de lei com o desiderato de impossibilitar a atuação de Advogados particulares e, por conseguinte, impedir que os réus contratem Advogados nos quais confiem.

Inicialmente, destaca-se o recente PL 1065/2019 (clique aqui), de autoria do Deputado Federal José Medeiros (PODE/MT), que, segundo a ementa:

Altera a Lei nº 8.479, de 2 de junho de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa), o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986 (Lei do Colarinho Branco), e a Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro), para determinar que, em ações de improbidade administrativa e em ações penais por crimes contra a administração pública, contra o sistema financeiro e de lavagem de dinheiro, o réu comprove a origem lícita dos recursos utilizados no pagamento de honorários advocatícios.

Percebe-se que o foco não é, diretamente, criminalizar o recebimento dos honorários, mas sim tornar obrigatório que o réu comprove a origem ilícita dos honorários pagos ao Advogado. Indiretamente, atinge a Advocacia, porque cria um obstáculo para a contratação de Advogados sem que o mesmo se estabeleça em relação a outros profissionais (médicos, engenheiros, comerciantes, contadores etc.).

Na justificação do projeto de lei, observa-se que há uma “cutucada” na Advocacia, ao falar sobre o sigilo, mas, em seguida, destaca-se a presumida boa-fé dos Advogados:

Não se pode olvidar que o pagamento de verdadeiras fortunas a título de honorários advocatícios pode servir para a lavagem de dinheiro, e o pior, sob a proteção do sigilo profissional assegurado pelos arts. 7º, XIX, e 34, VII, ambos da Lei nº 8.906, de 1990 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB) e do próprio direito à ampla defesa (que inclui a escolha do advogado), garantido pela Constituição Federal (CF).

É preciso que haja transparência!

O advogado é indispensável à administração da justiça e inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei (art. 131, CF). Assim, sobre ele deve prevalecer a presunção de boa-fé. No caso do investigado ou réu, no entanto, como já existem indícios da prática de ato de improbidade ou de crime, é preciso que sobre ele recaia a obrigação de provar a origem lícita dos recursos utilizados para o pagamento de sua defesa.

Entretanto, nada é mais preocupante do que o PL 442/2019 (clique aqui), de autoria do Deputado Federal Rubens Bueno (PPS/PR).

Esse projeto acrescenta o inciso III no art. 1º, §2º, da Lei n.º 9.613/98, para criminalizar como lavagem a conduta do Advogado que receba honorários em determinadas situações. Precisamente, o dispositivo legal passaria a dispor que incorre na mesma pena do crime de lavagem quem “receba honorários advocatícios, tendo conhecimento ou sendo possível saber a origem ilícita dos recursos com os quais será remunerado.”

A redação desse projeto tem vários problemas, além de ser uma afronta à Advocacia, que é essencial à administração da justiça (art. 133 da Constituição Federal).

De início, questiona-se: por que criminalizar apenas a conduta do Advogado? Os outros profissionais (médicos, corretores de imóveis, engenheiros, comerciantes, vendedores etc.) não respondem por lavagem quando prestam serviços ou vendem bens a quem faz pagamentos com recursos de origem ilícita?

O que significa “sendo possível saber a origem ilícita”? O Advogado deverá exigir a declaração do imposto de renda, contratar contadores e fazer uma análise minuciosa da existência de recursos lícitos que bastem para o pagamento dos honorários? Seria um dolo eventual? Como será a diferenciação entre a culpa consciente (fato atípico) e essa modalidade de dolo eventual nesse crime de lavagem idealizado pelo projeto? Quais são as chances de responsabilização criminal do Advogado que apenas foi negligente (ou até enganado pelo cliente) na avaliação da origem ilícita dos recursos?

Entendo que esse projeto constrange a Advocacia e atinge o direito de defesa, tentando intimidar investigados/réus e Advogados. Se esse projeto de lei for aprovado, a Defensoria Pública passará a atuar frequentemente na defesa de pessoas que tenham recursos financeiros, mas não consigam comprovar a origem lícita dos bens ou que tenham um patrimônio tão confuso que seja praticamente impossível encontrar um Advogado que queira arriscar-se na defesa, diante das chances reais de virar réu por crime de lavagem.

O objetivo dessas medidas contra o recebimento dos honorários não é proteger bens jurídicos. Trata-se apenas de criminalizar a Advocacia, reduzir o direito de defesa e gerar constrangimentos e obstáculos ao exercício da profissão que mais luta pelo respeito aos direitos e às garantias fundamentais.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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