O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem uma edição de teses jurisprudenciais sobre a apelação criminal e o recurso em sentido estrito, contendo alguns dos seus entendimentos sobre esses recursos. Essas teses estão na edição nº 66.
São elas (comentarei algumas):
1. O efeito devolutivo amplo da apelação criminal autoriza o Tribunal de origem a conhecer de matéria não ventilada nas razões recursais, desde que não agrave a situação do condenado (AgRg no HC 320398/MT, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, Julgado em 28/06/2016, DJE 01/08/2016).
COMENTÁRIO: trata-se da possibilidade de análise de ofício de certas matérias pelo Tribunal, desde que respeitada a vedação a “reformatio in pejus”.
2. A apresentação extemporânea das razões não impede o conhecimento do recurso de apelação tempestivamente interposto (HC 281873/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, Julgado em 07/04/2016, DJE 15/04/2016).
COMENTÁRIO: o entendimento vigente é de que a interposição do recurso de apelação dentro do prazo, com posterior apresentação das razões fora do prazo de 8 dias (art. 600 do CPP), consiste em mera irregularidade. Portanto, deve-se respeitar o prazo de interposição, não havendo óbice ao conhecimento do recurso se as razões foram apresentadas extemporaneamente.
3. O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão. (Súmula 347/STJ) (HC 095186/MG, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Julgado em 18/08/2015, DJE 31/08/2015).
4. Verificada a inércia do advogado constituído para apresentação das razões do apelo criminal, o réu deve ser intimado para nomear novo patrono, antes que se proceda à indicação de defensor para o exercício do contraditório (HC 302586/RN, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Julgado em 10/05/2016, DJE 19/05/2016).
COMENTÁRIO: essa tese é muito importante. Caso o advogado constituído deixe de apresentar as razões recursais em relação ao recurso interposto, não pode o Juiz, diretamente, remeter os processos à Defensoria Pública ou nomear defensor dativo. Antes, deve intimar o réu para que tenha ciência da inércia do seu advogado e, se for o caso, constituir novo defensor. Trata-se de medida que confere maior efetividade ao princípio da ampla defesa, possibilitando que o réu escolha um advogado de sua confiança.
5. Não cabe mandado de segurança para conferir efeito suspensivo ativo a recurso em sentido estrito interposto contra decisão que concede liberdade provisória ao acusado (HC 352998/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, Julgado em 24/05/2016, DJE 01/06/2016)
COMENTÁRIO: trata-se de decisão relevante do ponto de vista garantista.
Cabe recurso em sentido estrito contra a decisão que concede liberdade provisória, relaxa prisão em flagrante ou revoga prisão preventiva, assim como no caso de indeferimento do pedido de prisão preventiva (art. 581, V, do CPP). Caso o Ministério Público interponha o recurso nesses casos, não poderá pleitear, em mandado de segurança, o efeito suspensivo ativo, ou seja, uma liminar para que o acusado permaneça preso.
6. O efeito devolutivo da apelação contra decisões do Júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição (Súmula 713/STF) (HC 266092/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Julgado em 19/05/2016, DJE 31/05/2016)
COMENTÁRIO: essa tese prevê a necessidade de vinculação do recurso de apelação contra decisão do júri a uma das situações previstas nas alíneas do art. 593, III, do CPP.
7. A ausência de contrarrazões ao recurso em sentido estrito interposto contra decisão que rejeita a denúncia enseja nulidade absoluta do processo desde o julgamento pelo Tribunal de origem (HC 257721/ES,Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Julgado em 25/11/2014, DJE 16/12/2014).
COMENTÁRIO: contra a decisão que rejeita a denúncia, o Ministério Público pode interpor recurso em sentido estrito (art. 581, I, do CPP). Após a interposição do recurso e a apresentação das respectivas razões, deve a Defesa ser intimada para apresentar contrarrazões recursais, ou seja, manifestar-se para que a decisão que rejeitou a denúncia seja mantida, o que é interesse da Defesa.
Não sendo apresentadas as contrarrazões ao recurso, há nulidade absoluta.
8. Aplica-se o princípio da fungibilidade à apelação interposta quando cabível o recurso em sentido estrito, desde que demonstrada a ausência de má-fé, de erro grosseiro, bem como a tempestividade do recurso (AgInt no REsp 1532852/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Julgado em 07/06/2016, DJE 22/06/2016)
COMENTÁRIO: em outras palavras, a apelação interposta equivocadamente no lugar do recurso em sentido estrito será recebida, desde que presentes os requisitos mencionados.
9. A decisão do juiz singular que encaminha recurso em sentido estrito sem antes proceder ao juízo de retratação é mera irregularidade e não enseja nulidade absoluta (HC 216944/PA, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Julgado em 04/12/2012, DJE 18/12/2012).
COMENTÁRIO: esse entendimento é criticável.
O juízo de retratação no recurso em sentido estrito está previsto no art. 589 do CPP. Entendo que considerar como mera irregularidade a omissão dessa etapa, que permite ao juiz avaliar os fundamentos do recurso e se retratar, é preocupante, pois há evidente prejuízo (utilizando a expressão de Processo Civil normalmente empregada nas nulidades processuais penais).
Contudo, em outros casos, como no recurso em sentido estrito interposto contra a revogação da prisão preventiva, há benefício para a Defesa em caso de omissão da etapa de retração, haja vista que a retratação resultaria no retorno à prisão.
10. O adiamento do julgamento da apelação para a sessão subsequente não exige nova intimação da defesa (HC 353526/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, Julgado em 14/06/2016,DJE 21/06/2016).
11. Inexiste nulidade no julgamento da apelação ou do recurso em sentido estrito quando o voto de Desembargador impedido não interferir no resultado final (HC 352825/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Julgado em 10/05/2016, DJE 20/05/2016).
12. O acórdão que julga recurso em sentido estrito deve ser atacado por meio de recurso especial, configurando erro grosseiro a interposição de recurso ordinário em habeas corpus (RHC 042394/SP,Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA,Julgado em 10/03/2016,DJE 16/03/2016).
COMENTÁRIO: por esse entendimento, a interposição equivocada de recurso ordinário em habeas corpus quando se trata de julgamento de recurso em sentido estrito fará com que o recurso não seja conhecido, isto é, o RHC não será recebido como recurso especial. Nessa hipótese, não é aplicado o princípio da fungibilidade recursal, porque o RHC tem suas hipóteses de cabimento constitucionalmente descritas.
13. O julgamento de apelação por órgão fracionário de tribunal composto majoritariamente por juízes convocados não viola o princípio constitucional do juiz natural (HC 324371/RN, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, Julgado em 19/05/2016, DJE 27/05/2016).
COMENTÁRIO: apesar de ser entendimento amplamente adotado, entendo que a questão merece maior discussão, principalmente sobre a extensão do princípio do juiz natural, ou seja, se ele se refere apenas ao órgão ou se atinge também sua composição.
14. É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro. (Súmula 708/STF) (HC 329263/BA, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Rel. p/ Acórdão Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Julgado em 16/06/2016, DJE 01/07/2016).
COMENTÁRIO: trata-se de entendimento semelhante ao da tese nº 4. Em virtude do princípio constitucional da ampla defesa, o réu tem o direito de ser intimado da renúncia de seu advogado para que, querendo, constitua novo procurador ou opte pela assistência da Defensoria Pública.
15. A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da apelação por este interposta. (Súmula 705/STF) (RHC 061365/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, Julgado em 03/03/2016, DJE 14/03/2016).
COMENTÁRIO: entendimento importante que consagra o princípio da ampla defesa, fazendo prevalecer o recurso interposto pelo advogado em detrimento da renúncia do réu ao direito de apelar, normalmente manifestada ao oficial de justiça por meio de um formulário que acompanha o mandado.
A questão é relevante porque muitos acusados ficam com receio de apresentarem recurso e, posteriormente, terem a pena majorada. Desconhecem, portanto, a vedação a “reformatio in pejus”. Não havendo possibilidade de prejuízo ao réu em virtude do recurso interposto pela Defesa, deve prevalecer o recurso.