Sobre o que escrever?
No fundo, muitos querem escrever, deixando textos que permaneçam intactos após o fim de suas vidas. Os textos eternizam seus autores.
A publicação do primeiro artigo e do primeiro livro, a venda da primeira obra, o primeiro autógrafo… são momentos incríveis para um autor, especialmente se ele é, acima de tudo, um leitor. Quando o autor é um leitor apaixonado, provavelmente tem seus autores favoritos e sabe como alguém fica emocionado ao ter um livro de que gosta nas mãos.
Entretanto, há muitas pessoas que, conquanto queiram escrever, não conseguem ter um ponto de partida. A escolha do tema é uma das maiores dificuldades.
Em outros textos (veja aqui), sugeri inúmeros temas para artigos e trabalhos de conclusão de curso sobre Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional e Execução Penal. Assim, não repetirei, neste texto, as indicações de temas, mas sim abordarei como definir novos temas ou qual foco eles podem ter.
Uma das dúvidas é: textos atemporais ou relacionados a algum aspecto do nosso tempo (ou que tem relevância apenas nesta semana)?
Um texto sobre a denúncia contra o Presidente Michel Temer, por exemplo, terá pouca relevância se, futuramente, ele for condenado. A sucessão de fatos gera uma contínua alteração na importância de textos relacionados a um momento histórico específico.
Entretanto, há temas atuais que merecem ser comentados.
Um dos meus textos mais lidos, por exemplo, foi a análise que fiz sobre o Decreto do Indulto no dia de sua publicação (veja aqui). Certamente, um artigo sobre esse tema teria pouca relevância se fosse publicado vários meses depois.
As mudanças de entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto a (a)tipicidade do desacato, o debate sobre a execução provisória da pena e a análise da decisão relativa à atipicidade do aborto são temas que precisam ser comentados, ainda que saibamos da possibilidade de que, em um futuro próximo, sejam superados por entendimentos contrários em razão da mudança na composição dos Tribunais.
Portanto, o escritor não precisa escolher apenas temas atemporais. Caso contrário, seus escritos permanecerão alheios a assuntos de grande impacto na atualidade.
Na minha experiência, opto por escrever sobre algo que vejo, penso, sinto, atuo, leio ou imagino. Normalmente, meus textos dizem respeito a algo que me foi indagado por algum aluno, colega ou leitor.
Escrevendo mais de um texto por dia (neste site e nas colunas), seria difícil definir um novo tema a cada dia partindo do zero. Utilizo, portanto, ideias que surgem a partir de leituras, indagações, casos práticos, conversas ou aulas. Nada é escrito sem uma pequena semente plantada anteriormente.
Ademais, se o autor escrever sobre algo que, de alguma forma, fez parte do seu dia, possivelmente desenvolverá um texto mais envolvente e com informações mais interessantes, relevantes e precisas.
Além das críticas à jurisprudência e à doutrina, tenho uma inclinação para escrever dicas sobre aspectos práticos e relacionados à carreira. Não tive quem me orientasse sobre concursos e, posteriormente, quanto ao início na Advocacia, tampouco tive algum mentor que me orientasse em relação às dúvidas que surgiam continuamente no início – e agora com menor frequência –, o que me faz pensar em levar essas lições ao máximo possível de pessoas por meio dos meus textos. Assim, acredito que o autor de um texto deve conhecer os desafios que enfrentou e, a partir deles, produzir textos para pessoas que enfrentam os mesmos dilemas que o autor já enfrentou e superou.
Dessa forma, quando escrevo sobre júri, por exemplo, lembro-me de algum caso anterior em que aquela informação que pretendo inserir no texto teria sido útil. Em outras palavras, estabeleço um diálogo com uma indagação do eu-presente ao eu-passado, pensando o que pode ser útil ao tu-presente. Essa me parece ser a melhor forma de escrever textos que realmente sejam úteis aos leitores.
Em suma, as principais escolhas que devem ser feitas quando se começa a escrever são: a atualidade do tema (tema atemporal ou de relevância em determinado momento?), o tema em si (escreva preferencialmente sobre um tema que chamou sua atenção recentemente e sobre o qual você tem domínio) e o foco pretendido (legislação, doutrina, jurisprudência etc.).
Escrever algo é melhor que não escrever nada. Destarte, é importante “entrar em campo”, ainda que acredite não estar pronto. Somente se aprende a escrever com repetição, acertos, erros e, principalmente, busca de experiência. Para chegar a um texto satisfatório, passa-se por muitos textos ruins. O escritor não começa a escrever de forma envolvente já no primeiro texto.
Por fim, também é preferível ter uma matriz teórica utilizada para seus escritos, mas isso será tema de um artigo futuro.
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