Advocacia Criminal: ninguém disse que seria fácil
Hoje, dia da primeira fase do exame da Ordem dos Advogados do Brasil, pensei em refletir um pouco sobre a Advocacia, mormente a Criminal.
Ainda nos bancos da faculdade, alguns já desejam exercer a Advocacia no futuro. Os desafios e obstáculos parecem inexistentes. Muitos professores – inclusive eu – tentam incentivar os alunos a seguirem na carreira privada, e não no tão difundido e glamourizado mundo dos concursos públicos.
Para aquele que já tem uma preferência pela área criminal durante a faculdade, as outras disciplinas podem parecer verdadeiros rituais de tortura.
O curso de Direito está terminando. O graduando se inscreve no exame da Ordem dos Advogados do Brasil para que, quando se formar, já possa exercer a profissão imediatamente, sem demora.
Intensifica os estudos por alguns meses e, no dia da prova, depara-se com questões que cobram prazos e outras decorebas que estão descritas na lei e que, para a prática profissional, não precisam ser decoradas. E ele(a) passa!
Agora, inicia-se a rotina de estudos para a segunda fase. O graduando treina peças processuais, estuda julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça e aprende os principais conceitos doutrinários. No dia da correção do gabarito, acha inacreditável como o espelho de correção, uma espécie de tipo ideal (Max Weber) das respostas da segunda fase, não menciona todas as teses possíveis. Ainda assim, consegue passar!
Neste momento, o graduando acredita que a parte difícil de sua trajetória já passou. Mas está enganado.
Começa a exercer a Advocacia e percebe a dificuldade de obter clientes. As contas chegam, os lucros não. Sente o desconforto da cobrança – principalmente a autocobrança – por resultados. Sabe que os boletos vencem hoje, mas não sabe se até amanhã terá clientes que viabilizarão o pagamento das despesas do escritório.
Surgem os primeiros prospectos, isto é, pessoas que procuram o jovem Advogado. Nos primeiros contatos, no momento em que é procurado, o Advogado decide cobrar pelas consultas. Ouve “ahhh, tá” e nada mais. A animação de uma ligação recebida ou da abertura da porta do escritório se transforma em desânimo… os prospectos não querem pagar pela consulta.
Contrariando tudo que os mais experientes dizem, o jovem Advogado para de cobrar pela consulta. Os prospectos ressurgem. Ele(a) conversa por uma hora com os prospectos, diz todas as teses possíveis, os documentos necessários, o que e como deve ser feito etc. Ao final, diz o valor dos honorários para atuar na defesa do processo penal ou fazer os pedidos na execução criminal. O prospecto, que ouviu tudo com atenção, diz que voltará no dia seguinte. Mas não volta.
Algum tempo depois, o Advogado entra em contato com esse prospecto. Ele diz que já contratou outro Advogado, que era alguém que devia algum favor ou aceitou realizar a defesa em troca de dois sacos de cimento. E volta o desânimo do Jovem Advogado.
Sem opções, o jovem Advogado diminui o valor dos seus honorários, conseguindo fechar o primeiro contrato. Atua com enorme dedicação e vive para esse processo criminal. Pensa nas teses defensivas desse processo durante 24 horas por dia. Entretanto, o cliente não paga seus honorários. Agora, o jovem Advogado percebe que há algo pior do que não ter serviço: trabalhar, ter despesas (combustível, folhas, estacionamento etc.) e não receber nada por isso.
Esses fatos são fictícios, mas acontecem diariamente com todos que estão iniciando na Advocacia Criminal. Apenas quem supera esses desafios iniciais consegue se destacar.
Depois de tudo isso, não há mais dificuldades para obter clientes, fechar contratos e cobrar por consultas.
Ocorre que o Advogado passa a sofrer nos inquéritos policiais e nos processos penais, enfrentando pseudoautoridades que dependem da prepotência para alimentarem um pretenso status que acreditam ter. Os obstáculos passam a ser outros. Dificuldade para ter acesso aos autos do inquérito policial, criminalização da defesa, privilégios da acusação etc. E esses desafios nunca terminam.
Repito: não é fácil. Ninguém disse que seria fácil. Mas insisto: vale a pena.
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