16 teses do STF sobre o princípio da insignificância
O princípio da insignificância é uma das teses mais utilizadas na defesa penal, em que pese não haja previsão desse princípio no Código Penal.
Por ser uma construção exclusivamente doutrinária e jurisprudencial, há situações em que a aplicação ou não do princípio da insignificância permanece numa zona cinzenta.
Lembro-me, por exemplo, de um caso em que, para o juízo de 1º grau, o furto de balas e 1 pacote de salgadinhos, com o valor total de R$14,00, era considerado típico e, inclusive, fundamentava a PRISÃO PREVENTIVA!
Posteriormente, após a impetração de habeas corpus, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul considerou que a prisão era ilegal e o fato era atípico em virtude do princípio da insignificância (clique aqui para ler a notícia). Perceba a diferença gritante entre as duas posições adotadas.
Para auxiliar os colegas criminalistas que atuam na defesa, acusação ou julgamento de casos que envolvam o princípio da insignificância, bem como os estudantes de Direito e candidatos de concursos públicos, organizei 16 entendimentos recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre esse tema.
1.
O delito de descaminho reiterado e figuras assemelhadas impede o reconhecimento do princípio da insignificância, ainda que o valor apurado esteja dentro dos limites fixados pela jurisprudência pacífica desta Corte para fins de reconhecimento da atipicidade (HC 122348 AgR, Relator(a): Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 09/11/2016).
2.
O elevado grau de reprovabilidade de conduta criminosa praticada por militar no interior de organização militar impede a aplicação do princípio da insignificância (HC 135674, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 27/09/2016).
3.
Descabe cogitar da insignificância do ato praticado uma vez imputado o crime de circulação de moeda falsa (HC 126285, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 13/09/2016).
4.
O princípio da insignificância não incide na hipótese de contrabando de cigarros, tendo em vista que, além do valor material, os bens jurídicos que o ordenamento jurídico busca tutelar são os valores éticos-jurídicos e a saúde pública (HC 129382 AgR, Relator(a): Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 23/08/2016).
5.
A habitualidade delitiva revela reprovabilidade suficiente a afastar a aplicação do princípio da insignificância (ressalva de entendimento da Relatora) (HC 133956 AgR, Relator(a): Min. Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 21/06/2016).
6.
Excepcionalmente, adotou-se o princípio da insignificância ao delito de porte de munição de uso restrito, tipificado no art. 16 da Lei n. 10.826/2003 (HC 133984, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 17/05/2016).
7.
Não se pode aplicar o princípio da insignificância a crime com violência contra a mulher (RHC 133043, Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 10/05/2016).
8.
ESTELIONATO – SEGURO-DESEMPREGO – INSIGNIFICÂNCIA. Descabe, em se tratando de bem protegido a partir do interesse público, como é o seguro-desemprego, cogitar da insignificância da prática delituosa presente o valor envolvido (HC 108352, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 10/11/2015).
9.
O princípio da insignificância é inaplicável para o crime militar de posse de substância entorpecente (ARE 918616 AgR, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 03/11/2015).
10.
O caso envolve a prática do crime de contrabando de veículo usado, comportamento dotado de intenso grau de reprovabilidade, dados os bens jurídicos envolvidos, o que impede a aplicação do princípio da insignificância (HC 114315, Relator(a): Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, julgado em 15/09/2015).
11.
Furto (artigo 155, § 4º, inciso IV, do CP). Bens de pequeno valor (sucata de peças automotivas, avaliadas em R$ 4,00). Condenação à pena de 2 anos e 4 meses de reclusão. 3. Registro de antecedentes criminais (homicídio). Ausência de vínculo entre as infrações. Não caracterização da reincidência específica. 4. Aplicação do princípio da bagatela. Possibilidade (HC 126866, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 02/06/2015).
Obs.: esta decisão demonstra que, não havendo vínculo entre o fato ao qual se pretende aplicar o princípio da insignificância e o fato delituoso anterior, é possível o reconhecimento da atipicidade.
12.
A informação incontroversa de que os pacientes são infratores contumazes e com personalidade voltada à prática delitiva obsta a aplicação do princípio da insignificância, na linha da pacífica jurisprudência contemporânea da Corte (HC 127795 AgR, Relator(a): Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, julgado em 26/05/2015)
13.
No crime de descaminho, o Supremo Tribunal Federal tem considerado, para a avaliação da insignificância, o patamar de R$ 20.000,00 previsto no art. 20 da Lei nº 10.522/2002, atualizado pelas Portarias nº 75 e nº 130/2012 do Ministério da Fazenda (HC 126191, Relator(a): Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 03/03/2015).
14.
Não tem pertinência o princípio da insignificância em crime de furto qualificado cometido mediante rompimento de obstáculo (HC 121760, Relator(a): Min. Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 14/10/2014).
15.
A subtração de munições de uso restrito, de propriedade das Forças Armadas, não permite a aplicação do princípio da insignificância penal (HC 108168, Relator(a): Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 19/08/2014).
16.
“Serviço de Rádio Cidadão”. Exploração clandestina de atividade de telecomunicações. 3. Aplicação do princípio da insignificância. Impossibilidade. Periculosidade social da ação (HC 122535, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 12/08/2014).
Obs.: há decisões do STF em que, diante das peculiaridades do caso concreto, é aplicado o princípio da insignificância ao tipo penal supracitado.
CRÍTICA
Deixo, por fim, uma crítica: por que a habitualidade/reiteração delitiva impede a aplicação do princípio da insignificância? Se o princípio da insignificância é causa de exclusão da tipicidade DO FATO, por que considerar não apenas o fato, mas também a vida regressa do agente em sua totalidade?
Trata-se de um equívoco (ou seria atecnia?) ainda não superado por alguns julgadores, que, infelizmente, aplicam o Direito Penal do autor em detrimento do Direito Penal do fato. Nesses casos, entendem, de forma equivocada, pela inaplicabilidade do princípio da insignificância a um fato em razão de anteriores práticas delituosas do agente, como se para aferir a tipicidade (subsunção fato – tipo penal) de um crime fosse necessária uma análise de todos os outros fatos da vida do agente.
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