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Evinis Talon

STJ: coleta ilegal de material orgânico (Informativo 750)

14/10/2022

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STJ: coleta ilegal de material orgânico (Informativo 750)

No RHC 162.703-RS, julgado em 13/09/2022, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que “é nula, para fins de identificação criminal, a coleta compulsória de material orgânico não descartado de pessoas definitivamente não condenadas”.

Informações do inteiro teor:

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral na questão constitucional aludida no Recurso Extraordinário 973.837/MG (Tema n. 905/STF), em relação ao art. 9º-A da Lei n. 7.210/1984, que “prevê a identificação e o armazenamento de perfis genéticos de condenados” por delitos violentos ou hediondos em banco de dados estatal.

A Lei n. 13.964/2019 não excluiu dos preceitos normativos vigentes o art. 5º-A (incluído pela Lei n. 12.654/2012 à norma de 2009, Lei n. 12.037/2009), que trouxe ao ordenamento jurídico a viabilidade de coleta de material orgânico de suspeitos para fins de identificação criminal.

Nada obstante, cumpre consignar que, mesmo no tocante a condenados, definitivamente, por delitos violentos e graves, entendeu o STF, no Recurso Extraordinário 973.837/MG, que há razão bastante para a discussão acerca dos “limites dos poderes do Estado de colher material biológico”, de “traçar o respectivo perfil genético, de armazenar os perfis em bancos de dados e de fazer uso dessas informações”, diante dos relevantes argumentos quanto à eventual “violação a direitos da personalidade” e à “prerrogativa de não se autoincriminar”.

No caso, a infração praticada não deixa vestígios, tampouco a autoridade policial noticiou de que forma a providência restritiva traria utilidade às investigações, e não há denúncia contra o investigado, quanto mais sentença condenatória.

Não se olvida que há precedentes desta Corte Superior, no sentido de que a extração de saliva não representa método invasivo da intimidade. Sem embargo, são hipóteses em que o referido material genético se achava em objetos descartados – vale dizer, o exame do elemento orgânico não envolveu violação ao corpo do indivíduo (ilustrativamente, o suspeito fumou e desprezou cigarros, ou a saliva foi recolhida de copos ou talheres de plástico utilizados e eliminados) – ou se a arrecadação do material biológico é consentida (RHC 104.516/RN, Ministro Sebastião Reis Júnior, DJe 07/02/2020; HC 495.694/SP, Ministra Laurita Vaz, DJe 07/03/2019).

A propósito, há dezenas de precedentes desta Casa que não confrontam com o caso em comento, porquanto aludem à coleta de elementos orgânicos de sentenciados e sujeitos à execução – como o HC 536.114/MG, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 10/2/2020, e o HC 476.341/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 9/9/2019 – ou remetem a circunstâncias em que há consentimento do acusado com o recolhimento do material biológico ou fornecimento voluntário do dado perquerido – como o HC 651.424/BA, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 31/5/2022, e o AgRg no REsp 1.979.815/PE, Rel. Ministro Jesuíno Rissato, Quinta Turma, DJe 16/3/2022.

Com efeito, o Pacto de San José da Costa Rica (aderido à legislação pátria pelo Decreto n. 678/1992) prevê, como garantia de toda pessoa acusada, que ninguém é obrigado a se autoincriminar e assegura ao acusado/réu o direito a não depor contra si mesmo, nem a declarar-se culpado (art. 8º, item “2”, alínea “g”).

O direito à não se inculpar também está previsto na Constituição da República, em seu art. 5º, LXIII, segundo o qual “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado”. Ainda, o Código de Processo Penal dispõe, em seu art. 186, a possibilidade de o réu ficar em silêncio, quando interrogado.

Dessa forma, declara-se a nulidade da coleta compulsória de material orgânico e da inserção dos respectivos dados biológicos no Banco Nacional de Perfis Genéticos na hipótese dos autos, em que: I. não há sentença contra o investigado; II. não há proporcionalidade na medida invasiva, não há denúncia em seu desfavor; III. não há dúvida acerca da identificação do investigado; IV. o delito pelo qual se determinou a providência restritiva não deixa vestígios; V. não há comprovação bastante de que a identificação genética do investigado é essencial para a investigação criminal; VI. não se trata de material biológico descartado; VII. a coleta dos dados orgânicos depende da intervenção no corpo do indivíduo, não consentida; VIII. o investigado, em princípio, é primário, de modo que não há motivo idôneo, ao menos por ora, para a inclusão do seu perfil biológico em banco estatal de dados genéticos; IX. há discussão relevante no Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de atos semelhantes ao ora impugnado violarem direito à personalidade de pessoas definitivamente condenadas, bem como a prerrogativa de os réus não se autoincriminarem (conforme, inclusive, orientação da Corte Européia de Direitos Humanos); e X. a espécie não se adequa aos precedentes do STJ, que se reportam a sentenciados, a material descartado ou ao consentimento da provisão dos dados biológicos pelos réus.

 Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) –  Edição 750 – leia aqui. 

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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