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Evinis Talon

STJ: atipicidade no caso de posse de arma de fogo comprovadamente sem potencialidade lesiva, com laudo pericial atestando a sua ineficácia

24/12/2019

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Decisão proferida pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça no REsp 1451397/MG, julgado em 15/09/2015 (leia a íntegra do acórdão).

Confira a ementa:

RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PROIBIDO. ART. 16, CAPUT, DA LEI Nº 10.826/2003. INEFICÁCIA DA ARMA DE FOGO ATESTADA POR LAUDO PERICIAL. MUNIÇÕES DEFLAGRADAS E PERCUTIDAS. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.
1. A Terceira Seção desta Corte pacificou entendimento no sentido de que o tipo penal de posse ou porte ilegal de arma de fogo cuida-se de delito de mera conduta ou de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de seu efetivo caráter ofensivo.
2. Na hipótese, contudo, em que demonstrada por laudo pericial a total ineficácia da arma de fogo (inapta a disparar) e das munições apreendidas (deflagradas e percutidas), deve ser reconhecida a atipicidade da conduta perpetrada, diante da ausência de afetação do bem jurídico incolumidade pública, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio.
3. Recurso especial improvido. (REsp 1451397/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 15/09/2015, DJe 01/10/2015)

Leia a íntegra do voto da Ministra Maria Thereza de Assis Moura:

VOTO

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA(Relatora):

Consoante consignado em reiteradas decisões deste Superior Tribunal de Justiça, a Terceira Seção desta Corte pacificou entendimento no sentido de que o tipo penal de posse ou porte ilegal de arma de fogo cuida-se de delito de mera conduta ou de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de seu efetivo caráter ofensivo e, assim, desnecessária a realização de laudo pericial para atestar a potencialidade lesiva da arma de fogo ou da munição apreendida.

Confira-se, por oportuno, a ementa do aresto proferido pela Terceira Seção no julgamento dos Embargos de Divergência 1.005.300/RS, em 14/08/2013:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. EXAME PERICIAL. NULIDADE OU AUSÊNCIA. IRRELEVÂNCIA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. RECURSO REJEITADO. 1. Os crimes de perigo abstrato não implicam, em todos os casos, violação ao princípio da ofensividade, pois, tendo como objeto risco juridicamente reprovável criado sob uma perspectiva ex ante, diferenciam-se dos delitos de perigo concreto e dos delitos de lesão tão-somente quanto ao grau de proteção que conferem ao bem jurídico tutelado. 2. O legislador, ao criminalizar o porte clandestino de armas, preocupou-se, essencialmente, com o risco que a posse ou o porte de armas de fogo, à deriva do controle estatal, representa para bens jurídicos fundamentais, tais como a vida, o patrimônio, a integridade física, entre outros, levando em consideração que o porte, usualmente, constitui ato preparatório (delito de preparação) para diversas condutas mais graves, quase todas dotadas com a relevante contingência de envolver violência contra a pessoa. Assim, antecipando a tutela penal, pune essas condutas antes mesmo que representem qualquer lesão ou perigo concreto. 3. Tratando-se de crime de perigo abstrato, é prescindível a realização de laudo pericial para atestar a potencialidade lesiva da arma apreendida e, por conseguinte, caracterizar o crime de porte ilegal de arma de fogo. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. 4. Embargos de divergência rejeitados. (EREsp 1005300/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/ Acórdão Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2013, DJe 19/12/2013)

A hipótese dos autos, contudo, envolve peculiaridades que a meu juízo afastam a aplicação da jurisprudência mencionada, consubstanciadas no fato de que o laudo técnico efetuado na arma de fogo apontou a sua total ineficácia, ou seja, descartou, por completo, a sua potencialidade lesiva, bem como consignou que as munições encontravam-se percutidas e deflagradas.

A Corte local manifestou-se nos seguintes termos sobre o tema em apreço:

Após análise dos autos depreende-se que o laudo pericial de eficiência e prestabilidade da arma de fogo foi conclusivo quanto a impossibilidade da arma ser disparada.

“A arma de fogo encontrava-se apta a ofender a integridade física de outrem? Caso negativo, descreva o motivo da ineficiência.

Resposta: Efetuados os exames de eficiência na arma supracaracterizada constatou-se que esta na época dos exames, encontrava-se INEFICIENTE. O mecanismo de disparo da arma é constituído pelo cão, com seu percutor e alavanca de armar, gatilho, mola real, bem como pinos e molas relacionadas com estas peças. Este revólver possui percussão indireta, ou seja, o percutor está alojado na armação. Pode-se perceber durante os exames de eficiência que quando do acionamento do gatilho, não há o devido contato da região anterior do cão com o percutor, portanto, não sendo possível da percussão das munições, determinando a ineficiência da arma pelo seu mecanismo de disparo imperfeito.

As munições apreendidas são eficientes para ofender a integridade física de outrem?

Resposta: Não, uma vez que todas as munições encontravam-se percutidas e deflagradas.” (fl. 104/109)

Como se sabe, a arma de fogo, para ser considerada como tal, deve estar apta a disparar, sem o que ela perderá a potencialidade lesiva (capacidade de ferir ou casar dano), não podendo ser considerada para fins do art. 12 da Lei 10.826/03).

(…)

O fato de se tratar a posse de arma de fogo de delito de mera conduta indica que independe de resultado naturalístico para sua concretização, do dano efetivo, mas não prescinde da comprovação normativa da exposição a um potencial perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Em outras palavras, a resposta penal deve ser reservada às condutas que, de fato, lesem ou exponham a perigo o bem jurídico tutelado, o que não ocorre com a simples posse de arma inapta a disparar, que não representa risco para a segurança pública.

Ademais, a orientação doutrinária e jurisprudência mais moderna, é no sentido de exigir a comprovação do dano ou do perigo concreto ao bem jurídico tutelado, mesmo em se tratando de delitos de mera conduta, pois na linha dos princípios gerais de intervenção do Direito Penal, da necessidade e da ofensividade, não se deve tolerar a incriminação de condutas que não impliquem em lesão efetiva ou potencial ao bem protegido.

No caso sub examine, a arma apreendida é totalmente inapta a disparar, caracterizando-se a hipótese de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio. Fato atípico, portanto, nos termos do art. 17 do CP.

(…)

Desta forma, ante a ausência de materialidade, não há que se falar na ocorrência do delito de posse de arma, ante a atipicidade da conduta.

Dessarte, a tese firmada por esta Corte não se amolda ao presente feito, ante a particularidade da ineficácia da arma (e das munições), que não se confunde, à toda evidência, com arma sem munição.

Com efeito, nos termos do que proferia o ilustre Ministro aposentado Nilson Naves, “arma, para ser arma, há de ser eficaz; caso contrário, de arma não se cuida”. (AgRg no HC 149.191/RS). Isso porque, uma arma desmuniciada em conjunto com munição torna-se apta a realizar disparos; entretanto, uma arma ineficaz, danificada, quebrada, em contato com munição, não poderá produzir disparos, não passando, portanto, de um mero pedaço de metal.

Na espécie, portanto, verifica-se, à luz do Direito Penal do fato e da culpa, iluminado pelo princípio da ofensividade, que não houve afetação do bem jurídico incolumidade pública que, segundo MAGALHÃES NORONHA, “compreende o complexo de bens e interesses relativos à vida, à integridade corpórea e à saúde de todos e de cada um dos indivíduos que compõem a sociedade”. (Direto penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1977, v. 3, p. 352).

Do mesmo sentir é o escólio de Guilherme de Souza Nucci:

Arma quebrada e inapta a qualquer disparo: não é crime. Carregar uma arma desmuniciada é algo diverso de ter consigo arma completamente inapta a produzir disparo, afinal, cuida-se de delito impossível, a segurança pública não corre risco nesse caso; nem argumentemos com o fato de uma arma quebrada poder intimidar alguém, em caso de roubo, pois arma de brinquedo também pode e isso não significa ser figura enquadrável no art. 14 desta Lei. (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. São Paulo, Editora RT, 2010, p. 92).

Oportuno também trazer à baila o magistério de Roberto Delmanto, Roberto Delmanto Júnior e Fábio Machado de Almeida Delmanto:

Arma inapta, munição estragada, acessório inútil (exame de corpo de delito): Embora se trate de crime formal, o delito deste art. 14 (…) requer, para sua configuração, a ocorrência de lesão ou ameaça efetiva, palpável de de lesão ao bem juridicamente tutelado (resultado jurídico ou normativo). Daí porque a apreensão de arma de fogo inapta ao disparo, como no caso de relíquias ou antiguidades, não configura o crime. Igualmente, a apreensão de munição estragada ou de acessório inútil. (…) Tal entendimento, a nosso ver, deve permanecer vigorando para o crime de porte ilegal de arma de fogo previsto neste art. 14 (e para todos os demais crimes em que a arma de fogo integre o tipo penal), posto que o elemento normativo “arma de fogo” deve ser entendido somente como a arma de fogo apta a arremessar projéteis empregando a força expansiva dos gases gerados pela combustão de um propelente em uma câmera (art. 3º, XIII, do Decreto n. 3.665, de 20 de novembro de 2000). Na falta de qualquer desses elementos, não se terá uma arma de fogo para fins de configuração do tipo penal. Dessa forma, havendo laudo que ateste a impossibilidade de disparo da arma de fogo, cremos que não haverá o crime do caput, já que o bem jurídico tutelado não foi lesionado ou colocado em perigo. (…) Desta forma, diante da ausência de lesividade da arma de fogo inapta ao disparo, o seu porte, ainda que em desacordo com determinação legal ou regulamentar, não é típico. O mesmo se aplica para munição estragada ou acessório inútil (p. ex., coldres) para aumentar a eficiência de armas de fogo. (Leis Penais Especiais. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 794/795)

Seguem, em complemento, as lições de Valdir Sznick, em obra dedicada ao estudo do crime de porte de arma:

Não está armado quem porta arma sem condições. Assim a arma sem seus dispositivos especiais não pode ser considerada arma; arma de fogo sem seus elementos essenciais ofensivos descaracterizam a arma.

A inexistência de disparador, cão, gatilho, tambor, entre outras, tornam a arma imprestável por tirar-lhe a sua eficácia de arma. Se mantido o aspecto exterior de arma, pode, contudo, servir para a coação (como delitos violentos, tais como o roubo, o sequestro e outros).

Não é, porém, arma na sua concepção exata do termo e, pois, não se constitui em infração penal, no que se refere ao porte. (Crime de Porte de Arma. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda., 1997, p. 101).

Nessa linha de raciocínio, embora seja pacífico que a incidência da causa de aumento de pena pelo uso de arma de fogo no delito de roubo prescinde da sua apreensão e perícia, as Turmas de Direito Penal deste Superior Tribunal de Justiça consolidaram entendimento no sentido de que, caso atestada a ineficácia e inaptidão da arma, torna-se incabível a aplicação da majorante prevista no artigo 157, § 2º, inciso I, do Código Penal.

A esse respeito, cumpre trazer à baila os seguintes precedentes desta Corte:

HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ESPECIAL CABÍVEL. IMPOSSIBILIDADE. RESPEITO AO SISTEMA RECURSAL PREVISTO NA CARTA MAGNA. NÃO CONHECIMENTO. (…) EMPREGO DE ARMA DE FOGO. MAJORANTE. ARTEFATO SUBMETIDO À PERÍCIA. INAPTIDÃO PARA A REALIZAÇÃO DE DISPAROS. AUSÊNCIA POTENCIALIDADE LESIVA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. 1. Embora esta Corte Superior de Justiça, no julgamento dos EREsp 961.863/RS, tenha pacificado o entendimento de que a incidência da majorante referente ao emprego de arma no delito de roubo independe da sua apreensão e perícia, quando há nos autos laudo que atesta a sua ineficácia e inaptidão para a produção de disparos mostra-se inviável o seu reconhecimento. Precedentes. 2. No caso dos autos, consoante o laudo pericial produzido, a arma utilizada no crime não é apta a produzir disparos, pelo que se impõe a exclusão da causa de aumento prevista no artigo 157, § 2º, inciso I, do Código Penal. 3. As instâncias de origem não declinaram fundamentos concretos para o aumento da sanção com relação às causas de aumento de pena remanescentes, tendo utilizado o critério aritmético para o estabelecimento do patamar de acréscimo superior ao mínimo, procedimento que contraria o disposto no enunciado 443 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça. 4. Desse modo, o quantum do aumento deve ser redimensionado ao patamar legal mínimo de 1/3 (um terço), reduzindo-se a reprimenda do paciente para 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, além do pagamento de 13 (treze) dias-multa, mantido o regime fechado para o início do seu cumprimento. 5. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício apenas para reduzir a pena do paciente para 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida no regime inicial fechado, além do pagamento de 13 (treze) dias-multa, mantido o regime inicial fechado. (HC 294.148/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 09/09/2014, DJe 15/09/2014)

HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. (1) WRIT COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO ESPECIAL. VIA INADEQUADA. (2) CAUSA DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ART. 157, § 2.º, I, DO CÓDIGO PENAL. PERÍCIA. REALIZADA. ARMA INAPTA A PRODUZIR DISPAROS E DESMUNICIADA. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA MAJORANTE. ILEGALIDADE. (3) REGIME INICIAL FECHADO. PENA INFERIOR A 8 ANOS DE RECLUSÃO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. ADEQUAÇÃO. (4) WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM DE OFÍCIO. 1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso especial. 2. A utilização de arma sem potencialidade lesiva, atestada por perícia, como forma de intimidar a vítima no delito de roubo, caracteriza a elementar grave ameaça, porém, não permite o reconhecimento da majorante de pena (emprego de arma). Na espécie, foi constatado pelo auto de apreensão e pela perícia que a arma era ineficaz para produção de disparos, bem como estava desmuniciada, fato que evidencia a ausência da potencialidade lesiva do instrumento, sendo, de rigor, o afastamento a referida majorante. 3. Nos termos do artigo 33 do Código Penal, fixada a pena em patamar inferior a 8 (oito) anos de reclusão, a estipulação do regime inicial fechado é apropriada, eis que existe circunstância judicial desfavorável, tanto que a pena-base foi fixada acima do mínimo legal. 4. Ordem não conhecida, mas concedida de ofício para afastar a causa de aumento de pena prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal, diminuindo as penas dos pacientes para 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, mais 13 (treze) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença e do acórdão. (HC 257.856/SP, de minha relatoria, SEXTA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 07/04/2014)

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. ARMA DE FOGO DESMUNICIADA E INEFICAZ PARA REALIZAÇÃO DE DISPAROS. NECESSÁRIO AFASTAMENTO DA MAJORANTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. – Este Superior Tribunal de Justiça, na esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, tem amoldado o cabimento do remédio heróico, adotando orientação no sentido de não mais admitir habeas corpus substitutivo de recurso ordinário/especial. Contudo, a luz dos princípios constitucionais, sobretudo o do devido processo legal e da ampla defesa, tem-se analisado as questões suscitadas na exordial a fim de se verificar a existência de constrangimento ilegal para, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício. – A utilização de arma de fogo desmuniciada e sem potencialidade para realização de disparo serve unicamente como meio de intimidação e caracterização da elementar grave ameaça, porém não se admite a sua utilização para o reconhecimento da causa de aumento de pena. Comprovado por meio de perícia que a arma era inapta para efetuar disparos, deve ser afastada a causa do aumento de pena prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para restabelecer a sentença de primeiro grau. (HC 276.175/SP, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), SEXTA TURMA, julgado em 07/11/2013, DJe 20/11/2013)

Cumpre ainda consignar que, quanto ao tema ora em debate, a Quinta Turma desta Corte há pouco tempo teve a oportunidade de enfrentar situação fática similar à presente, de porte de arma de fogo periciada e totalmente ineficiente, tendo asseverado aquele Colegiado que o objeto apreendido não se enquadraria no conceito técnico de arma de fogo, razão pela qual reformou o decreto condenatório. A ementa do aresto foi sintetizada nos termos abaixo:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. FUNDAMENTOS INSUFICIENTES PARA REFORMAR A DECISÃO AGRAVADA. INAPTIDÃO DO INSTRUMENTO. LAUDO PERICIAL ATESTANDO A TOTAL IMPROPRIEDADE DO OBJETO PARA REALIZAR DISPAROS. PERÍCIA ESTATAL CONCLUSIVA. CONDUTA ATÍPICA. RECURSO IMPROVIDO. 1. O agravante não apresentou argumentos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada, razão que enseja a negativa de provimento ao agravo regimental. 2. É típica a conduta de portar arma de fogo sem autorização ou em desconformidade com determinação legal ou regulamentar por se tratar de delito de perigo abstrato, cujo bem jurídico protegido é a incolumidade pública, independentemente da existência de qualquer resultado naturalístico. 3. A classificação do crime de porte ilegal de arma de fogo como de perigo abstrato traz, em seu arcabouço teórico, a presunção, pelo próprio tipo penal, da probabilidade de vir a ocorrer algum dano pelo mau uso da arma. 4. Flagrado o recorrido portando um objeto eleito como arma de fogo, temos um fato provado – o porte do instrumento – e o nascimento de duas presunções, quais sejam, de que o objeto é de fato arma de fogo, bem como tem potencial lesivo. 5. Sendo a tese nuclear da defesa o fato de o objeto não se adequar ao conceito de arma, por estar quebrado e, consequentemente, inapto para realização de disparo, circunstância devidamente comprovada pela perícia técnica realizada, temos, indubitavelmente, o rompimento da ligação lógica entre o fato provado e as mencionadas presunções. Nesse contexto, impossível a manutenção do decreto condenatório por porte ilegal de arma de fogo. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 397.473/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 25/08/2014)

Desse modo, conclui-se que arma de fogo pressupõe artefato destinado e capaz de ferir ou matar, de maneira que, na espécie, deve ser reconhecida a atipicidade da conduta de possuir arma de fogo inapta a disparar e munições deflagradas e percutidas, ante a ausência de potencialidade lesiva, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.

É como voto.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca – cursando), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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