plenário júri

Evinis Talon

STJ: a nova decisão de pronúncia, destinada a incluir o crime conexo, não permite impugnar pontos preclusos

19/11/2025

Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no whatsapp

STJ: a nova decisão de pronúncia, destinada a incluir o crime conexo, não permite impugnar pontos preclusos

No REsp 2.197.114-MG, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que “a nova decisão de pronúncia, proferida em cumprimento a acórdão que reinclui crime conexo, não autoriza a impugnação de capítulos inalterados da decisão originária, já alcançados pela preclusão temporal”.

Informações do inteiro teor:

A controvérsia consiste em definir se a nova decisão de pronúncia, em cumprimento a acórdão que determinou apenas a reinclusão de crime conexo, possui eficácia substitutiva plena, autorizando a reabertura do prazo recursal para todos os capítulos, ou se sua eficácia é limitada aos pontos efetivamente alterados, preservando-se a preclusão temporal quanto às matérias inalteradas.

A decisão de pronúncia, prevista no art. 413 do CPP, encerra a fase de admissibilidade da acusação no procedimento do Tribunal do Júri e é impugnável por recurso em sentido estrito nos termos do art. 581, IV, do CPP. O regime da preclusão no processo penal impõe à parte o dever de se insurgir contra todos os pontos desfavoráveis no momento processual oportuno, sob pena de estabilização formal da decisão.

No caso, a decisão superveniente não apenas reintegrou o delito conexo de tráfico ilícito de entorpecentes à peça acusatória, mas reavaliou integralmente a denúncia, reafirmando e, por vezes, reformulando o enquadramento jurídico-penal das condutas descritas, bem como o substrato probatório que lhe dá suporte. Ao proceder a essa reapreciação global, o juízo de origem consolidou, em ato único e exauriente, todos os elementos necessários à submissão do acusado ao Tribunal do Júri, conferindo à nova deliberação eficácia substitutiva plena em relação à anterior.

A tese defensiva assenta-se na premissa de que a pronúncia, por ser ato jurisdicional uno, teria sua eficácia condicionada à versão mais recente proferida nos autos, razão pela qual a anulação da decisão originária implicaria, automaticamente, a abertura de novo prazo para interposição de recurso contra todos os seus capítulos.

Essa compreensão, no entanto, não se sustenta à luz do regime jurídico da preclusão. A unidade da pronúncia é conceito funcional: visa a preservar a coerência lógica e a integralidade do juízo de admissibilidade da acusação, mas não se presta a extinguir a estabilização formal decorrente da inércia recursal. Assim, a reforma parcial do ato, motivada por recurso exclusivo de uma das partes, não autoriza, por si só, a rediscussão de capítulos que permaneceram inalterados e já haviam sido objeto de preclusão consumativa.

Na hipótese em exame, a qualificadora de homicídio, o pedido de impronúncia em razão da legítima defesa e a desclassificação para homicídio culposo constaram de forma idêntica na decisão originária, contra a qual a defesa não se insurgiu. Inexistindo qualquer modificação substancial nesse ponto específico, não há motivo para reabrir a dialeticidade recursal. O sistema processual não admite a tese de que a repetição de matéria já estabilizada possa ser tratada como inovação capaz de gerar novo prazo, sob pena de esvaziar-se a função estabilizadora da preclusão.

A preclusão, aqui, não é mero tecnicismo processual. Constitui instrumento de segurança jurídica e de equilíbrio na litigância penal, impondo às partes o dever de manifestar-se no momento adequado sobre todos os aspectos da decisão que lhes sejam desfavoráveis. O seu afastamento somente se justificaria diante de alteração objetiva e relevante no conteúdo da imputação – como a inclusão, nesta segunda pronúncia, do crime de tráfico de drogas -, circunstância que, efetivamente, poderia ensejar nova insurgência defensiva. No tocante às demais teses defensivas, contudo, a defesa conformou-se expressamente ao deixar de recorrer quando lhe foi dada a primeira oportunidade, razão pela qual a nova decisão, ao apenas reproduzir o mesmo fundamento, não reabre prazo já consumado.

Ademais, cumpre destacar esse entendimento também se harmoniza com a lógica subjacente à vedação da reformatio in pejus indireta. Nessa linha, a orientação consolidada pelo STJ afasta a possibilidade de que a reforma parcial da decisão de pronúncia, motivada por recurso exclusivo de uma das partes, enseje reabertura do prazo recursal em relação a capítulos não modificados e já alcançados pela preclusão.

Nesse cenário, admitir que a impugnação defensiva, manejada apenas contra a segunda pronúncia, pudesse afastar matérias não impugnadas na primeira pronúncia implicaria reduzir o alcance da vantagem obtida pelo órgão acusador com o provimento de seu recurso.

Leia a ementa:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DO JÚRI. NOVA DECISÃO DE PRONÚNCIA PROFERIDA EM CUMPRIMENTO A ACÓRDÃO QUE REINCLUIU DELITO CONEXO. PRECLUSÃO TEMPORAL QUANTO A CAPÍTULOS INALTERADOS. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DA QUALIFICADORA DO HOMICÍDIO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso especial interposto por acusado pronunciado, inicialmente, apenas pelo crime de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, II, do CP), após exclusão do delito de tráfico ilícito de entorpecentes (art. 33, § 1º, III, da Lei 11.343/2006) por ausência de prova da materialidade. O Ministério Público, inconformado, interpôs recurso em sentido estrito, provido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que determinou a reinclusão do crime conexo e a prolação de nova decisão de pronúncia. 2. Em cumprimento ao acórdão, o juízo de origem proferiu nova pronúncia, mantendo o homicídio qualificado com a mesma qualificadora anteriormente fixada e incluindo novamente o tráfico. A defesa, então, interpôs recurso em sentido estrito visando à impronúncia do agente ou operada a desclassificação para crime menos grave, bem como afastar as qualificadoras imputadas ao réu. O Tribunal de Justiça não conheceu da insurgência, reconhecendo a preclusão temporal. 3. No recurso especial, a defesa sustenta que a nova decisão de pronúncia possui natureza una e indivisível, o que permitiria impugnar, de forma ampla, todos os seus capítulos, inclusive aqueles não modificados, como a qualificadora.  II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. A questão em discussão consiste em definir se a nova decisão de pronúncia, proferida em cumprimento a acórdão que determinou apenas a reinclusão de crime conexo, possui eficácia substitutiva plena, autorizando a reabertura do prazo recursal para todos os capítulos, ou se sua eficácia é limitada aos pontos efetivamente alterados, preservando-se a preclusão temporal quanto às matérias inalteradas.  III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A decisão de pronúncia, prevista no art. 413 do CPP, encerra a fase de admissibilidade da acusação no procedimento do Tribunal do Júri e é impugnável por recurso em sentido estrito nos termos do art. 581, IV, do CPP. 6. O regime da preclusão no processo penal impõe à parte o dever de se insurgir contra todos os pontos desfavoráveis no momento processual oportuno, sob pena de estabilização formal da decisão. 7. A eficácia substitutiva da decisão posterior restringe-se aos capítulos efetivamente alterados, não se estendendo às matérias reproduzidas de modo idêntico, já atingidas pela preclusão. A noção de unidade da pronúncia possui caráter funcional, voltado à preservação da coerência lógica do ato decisório, sem, contudo, afastar a incidência da preclusão quanto aos pontos que permaneceram inalterados. 8. Na hipótese, a qualificadora de homicídio, o pedido de impronúncia em razão da legítima defesa e a desclassificação para homicídio culposo constaram de forma idêntica tanto na decisão originária quanto na segunda pronúncia, inexistindo alteração substancial que justificasse a reabertura do prazo recursal. 9. Precedentes do STJ firmados no HC 91.216/DF e HC 30.560/RJ reforçam que a reforma parcial da pronúncia não autoriza a rediscussão de capítulos não modificados, seja para preservar a estabilidade processual, seja para evitar reformatio in pejus indireta. 10. No caso, a ausência de recurso contra a qualificadora de homicídio, o pedido de impronúncia em razão da legítima defesa e a desclassificação do delito para o crime de homicídio culposo na primeira decisão produziu efeito semelhante ao da coisa julgada formal, impossibilitando sua impugnação posterior.  IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Recurso especial a que se nega provimento. Tese de julgamento: “1. A nova decisão de pronúncia, proferida em cumprimento a acórdão que reinclui crime conexo, não autoriza a impugnação de capítulos inalterados da decisão originária, já alcançados pela preclusão temporal. 2. A eficácia substitutiva da nova pronúncia é restrita aos pontos efetivamente modificados, permanecendo intocados e estabilizados os demais capítulos. 3. A unidade da pronúncia não afasta o regime de preclusão, devendo prevalecer a segurança jurídica e a lealdade processual. Dispositivos relevantes citados: CP, art. 121, § 2º, II; Lei 11.343/2006, art. 33, § 1º, III; CPP, arts. 78, I, 413, 581, IV, e 617. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC nº 91.216/DF, rel. Min. Jane Silva, Sexta Turma, j. 25.02.2008, DJe 10.03.2008; STJ, HC nº 30.560/RJ, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, j. 09.12.2003, DJ 02.02.2004. (REsp n. 2.197.114/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 4/11/2025, DJEN de 19/11/2025.)

INFORMAÇÕES ADICIONAIS:

Legislação

Código de Processo Penal (CPP), art. 413 e art. 581, IV

Falo mais sobre esse assunto no Curso Talon. Clique aqui para saber mais.

Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) –  Edição nº 870, de 11 de novembro de 2025 (leia aqui).

Leia também:

STJ: a Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos possui eficácia vinculante e imediata

Tribunal do júri na prática: a decisão sobre os crimes conexos

Câmara: projeto pune divulgação indevida de fotos de autópsias

Precisa falar conosco? CONTATO: clique aqui

Siga o meu perfil no Instagram (clique aqui). Sempre que possível, vejo as mensagens no direct.

Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

COMPARTILHE

Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no whatsapp

EVINIS TALON


LEIA TAMBÉM

Telefone / Whatsapp: (51) 99927 2030 | Email: contato@evinistalon.com

× Fale com o Dr. Evinis Talon