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Evinis Talon

“Deseja representar contra o autor do fato?”

09/05/2017

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“Deseja representar contra o autor do fato?”

Entre as diversas espécies de ação penal, tem-se a ação penal pública condicionada à representação do ofendido, prevista no art. 24 do Código de Processo Penal.

Alguns dos crimes condicionados à representação são: perigo de contágio venéreo (art. 130 do Código Penal), ameaça (art. 147 do Código Penal), violação de correspondência comercial (art. 152 do Código Penal), invasão de dispositivo informático (art. 154-A do Código Penal) e furto de coisa comum (art. 156 do Código Penal). A ação penal do crime de estupro (art. 213 do Código Penal) também era condicionada à representação, mas, com a recente alteração pela Lei 13.718/18, passou a ser ação penal pública incondicionada. Para ver o histórico quanto à natureza da ação penal dos crimes sexuais, clique aqui.

A prática tem admitido que a representação do ofendido tenha caráter informal, isto é, desprovido de requisitos formais, sendo desnecessário um documento específico.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal: “[…] Nos crimes de ação penal pública condicionada, como a ameaça, descabe impor forma especial relativamente à representação. A postura da vítima, a evidenciar a vontade de ver processado o agente, serve à atuação do Ministério Público (Inq 3.714, rel. min. Marco Aurélio, j. 15-9-2015, 1ª T, DJE de 29-9-2015).

Infelizmente, tem sido admitida como representação a mera inserção da frase “deseja representar contra o autor do fato” ao final do boletim de ocorrência ou do termo de depoimento. Nessa linha, surgem algumas perguntas:

– Pode ser admitida a inserção dessa frase no termo de depoimento sem destaque (negrito, sublinhado, letras garrafais)?

– Na prática, os depoentes leem atenciosamente o termo de depoimento ou apenas assinam rapidamente?

– Todos os policiais explicam aos depoentes o que significa a representação ou apenas perguntam se desejam representar contra o autor do fato, sem maiores explicações?

A questão é extremamente importante, considerando que não é possível que seja iniciado o inquérito policial sem a representação (art. 5º, §4º, do Código de Processo Penal).

Em julgamento recente – março de 2017 –, o Superior Tribunal de Justiça, em um caso de suposta ameaça a policiais, reiterou o seu entendimento no sentido de que a representação independe de formalidades. Entretanto, como não havia menção expressa da suposta vítima da infração penal, entendeu que não havia representação, “in verbis”:

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. 2. CRIME DE AMEAÇA CONTRA POLICIAIS. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA. REPRESENTAÇÃO QUE DISPENSA FORMALIDADES. 3. TERMO CIRCUNSTANCIADO COM RELATO POLICIAL. AUSÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO DA VÍTIMA NO TC E NA DENÚNCIA. NÃO SE IDENTIFICA A QUEM FOI DIRIGIDA A AMEAÇA NEM QUEM SE SENTIU AMEAÇADO. SITUAÇÃO QUE INVIABILIZA A EXISTÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO.
[…]
2. Prevalece no STJ e no STF que a representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, não exige maiores formalidades, sendo suficiente a demonstração inequívoca de que a vítima tem interesse na persecução penal. Dessa forma, não há necessidade de que exista nos autos peça processual com esse título, sendo suficiente que a vítima ou seu representante legal leve ao conhecimentos das autoridades o ocorrido.
3. Os policiais que sofreram a suposta ameaça registraram termo circunstanciado, não apontando qual ou quais policiais foram ameaçados, não constando sequer a identificação destes, mas apenas o relato dos agentes. A suposta ameaça não foi dirigida a todos os policias, pois o paciente afirma “ainda vou te achar sem farda”.
Contudo, a vítima não é identificada. Nesse contexto, embora a representação no crime de ação penal pública condicionada não exija maiores formalidades, é imprescindível que se identifique a vítima, a pessoa que, na hipótese, se sentiu ameaçada, o que não consta do termo circunstanciado nem da denúncia, não se vislumbrando, assim, quem representou, motivo pelo qual não há se falar em representação.
[…]
(HC 385.345/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 05/04/2017)

Portanto, ainda que a jurisprudência não exija formalidades ou peça específica para a constatação da representação, é necessário que se identifique o ofendido em relação ao delito para que, de fato, haja representação.

Ademais, salienta-se que o art. 25 do Código de Processo Penal determina que a representação é irretratável, depois de oferecida a denúncia. Assim, após o oferecimento da denúncia, ainda que antes de seu recebimento pelo Juiz, não é possível a retratação.

Entrementes, considero que é possível que o suposto ofendido declare, ainda que posteriormente ao recebimento da denúncia, que não foi cientificado sobre o significado da representação, tendo assinado o termo de depoimento ou boletim de ocorrência sem o pleno conhecimento das consequências dessa representação. Nesse caso, teria ocorrido vício de vontade na declaração do ofendido, o que afasta a representação e inviabiliza o prosseguimento do processo criminal.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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