Falamos muito sobre a qualificação e a valorização de profissionais que demonstram conhecimento, principalmente na área jurídica. Tenho dito que a propalação de conhecimento tangível é a melhor forma de demonstrar a qualidade de um profissional.
Em artigo recente, publicado na minha coluna do Canal Ciências Criminais (leia aqui), abordei como seria, na minha opinião, a preparação para ser Advogado Criminalista. No texto, narrei dois fatos que presenciei, quando profissionais jurídicos sofreram embaraços em razão da falta de conhecimento/experiência.
Acredito não haver mais necessidade de mencionar o quanto o profissional jurídico – especialmente o Advogado Criminalista – deve anteferir a busca pelo conhecimento em seu percurso. É o mínimo que se espera de alguém que defenderá a liberdade alheia.
Contudo, deve-se articular também sobre a inferiorização e o embaraçamento daquele que patenteia o seu desconhecimento jurídico. Essa abordagem presta-se tanto aos atores jurídicos que atuam na defesa (Advogados Criminalistas e Defensores Públicos) quanto aos agentes de acusação (Promotores).
Não raramente se observa um ator jurídico fazendo asseverações que demonstram desconhecimento jurídico. Quem, corrigindo-o, demonstra conhecimento jurídico, também potencializa o descrédito da outra parte.
Lembro-me de um júri em que o acusador enunciou uma frase habitualmente dita por populares. Na minha intervenção, salientei que aquela frase tinha autoria, dizendo quem era o criador daquela afirmação. Para minha sorte, havia lido um livro com aquela frase algumas semanas antes. Para o azar do acusador, o autor daquela frase era considerado repugnante, tanto pelas suas ideias, quanto pelas suas atitudes históricas.
Durante minha intervenção, quando disse quem era o autor da frase, afirmei que preferia acreditar que o acusador desconhecia sua autoridade. Disse que seria preferível acreditar no desconhecimento dele acerca da autoria da frase do que pensar que ele estava defendendo conscientemente aquele autor naquele contexto.
Assim, surgiu um dilema na mente do acusador: dizer que sabia quem era o autor da frase e, então, sofrer a aversão dos jurados ou afirmar que desconhecia a autoria e, por consequência, demonstrar que estava citando algo que desconhecia completamente? Nas duas opções, cairia em descrédito, seja por aversão (1ª opção), seja por desconhecimento (2ª opção).
O objetivo desta análise, portanto, é demonstrar como o realce e a saliência do desconhecimento jurídico da outra parte pode resultar em descrédito dela, favorecendo a parte que a corrige. Nos júris, é algo desestabilizador e que certamente influenciará a decisão dos jurados. Nos processos julgados por Magistrado, esse descrédito terá a propensão de colocar em dúvida as alegações feitas pela parte corrigida.
Essa estratégia defensiva pode gerar alguns desencadeamentos interessantes, na linha das estratégias propostas por Arthur Schopenhauer.
Schopenhauer (1997, p. 141) ressalta como uma das estratégias do debate a provocação da cólera do adversário, ou seja, deixá-lo em fúria, de modo que perca a capacidade de raciocinar corretamente. Acredito que ressaltar os erros e o desconhecimento jurídico do adversário durante o júri, principalmente durante a fala dele, tem o condão de deixá-lo momentaneamente irracional, desmontado, sem capacidade de continuar argumentando como fazia antes de ser interrompido com uma correção.
Ademais, pode-se corrigir o adversário por meio da estratégia da “incompetência irônica”, precisamente descrita por Schopenhauer (1997, p. 172). Trata-se da afirmação, de forma irônica, que aquilo que o outro diz é tão complexo que ultrapassa a nossa débil capacidade de compreensão. Isso transmite a ideia de que o que foi dito pela outra parte é algo insensato. Essa estratégia pode resultar na estratégia anterior, ou seja, pode encolerizar o adversário.
Evidentemente, para ressaltar o desconhecimento jurídico da parte contrária, é imperioso que o Advogado Criminalista tenha certeza da incorreção da informação, preferencialmente citando doutrinadores, julgados, páginas do processo ou qualquer outro argumento de autoridade que comprove a sua afirmação frontalmente contrária à fala da outra parte. Deve-se evitar, em qualquer hipótese, a utilização de achismos e, principalmente, de informações falsas. A falsidade da informação, além de antiética, constitui fator de absoluto descrédito.
Em suma, entendo como estratégia defensiva eficaz a demonstração de conhecimento fático e jurídico próprio conjugada com a adução do desconhecimento da parte adversa, devendo este ser realçado, quando possível, durante a fala da parte, principalmente em júris.