STJ: vítima deve ser ouvida para apurar a necessidade de prorrogação das medidas protetivas
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui a seguinte tese fixada envolvendo julgamentos com perspectiva de gênero: “A vítima de violência doméstica deve ser ouvida para que se verifique a necessidade de prorrogação/concessão das medidas protetivas, ainda que extinta a punibilidade do autor”.
Confira uma ementa relacionada:
RECURSO ESPECIAL. LEI MARIA DA PENHA. MEDIDAS PROTETIVAS. NATUREZA JURÍDICA INIBITÓRIA. INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO-CRIME EM CURSO. DESNECESSIDADE. MEDIDAS QUE ACAUTELAM A OFENDIDA E NÃO O PROCESSO. VALIDADE DAS MEDIDAS ENQUANTO PERDURAR A SITUAÇÃO DE PERIGO. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. NECESSIDADE DE PRÉVIO CONTRADITÓRIO ANTES DE SE DECIDIR PELA MODIFICAÇÃO OU REVOGAÇÃO DO REFERIDO INSTRUMENTO PROTETIVO. REVISÃO PERIÓDICA. POSSIBILIDADE. PRAZO QUE DEVE SER FIXADO PELO MAGISTRADO SINGULAR, QUE LEVARÁ EM CONSIDERAÇÃO AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. SITUAÇÃO DOS AUTOS. REVOGAÇÃO DAS MEDIDAS COM BASE EM MERAS SUPOSIÇÕES. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA QUE IMPÔS AS MEDIDAS. CABIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. As medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha buscam preservar a integridade física e psíquica da vítima, prescindindo, assim, da existência de ação judicial ou inquérito policial. Considerando essas características, vê-se que as referidas medidas possuem natureza inibitória, pois têm como finalidade prevenir que a violência contra a mulher ocorra ou se perpetue. Nesse sentido: “[…] Lei Maria da Penha. Desnecessidade de processo penal ou cível. 3. Medidas que acautelam a ofendida e não o processo” (STF, HC 155.187 AgR, Rel. Ministro GILMAR MENDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/04/2019, DJe 16/04/2019). 2. Reconhecida a natureza jurídica de tutela inibitória, a única conclusão admissível é a de que as medidas protetivas têm validade enquanto perdurar a situação de perigo. A decisão judicial que as impõe submete-se à cláusula rebus sic stantibus, ou seja, para sua eventual revogação ou modificação, mister se faz que o Juízo se certifique de que houve a alteração do contexto fático e jurídico. 3. Os referidos entendimentos se coadunam com o atual texto da Lei 11.340/06, conforme previsão expressa contida no art. 19, §§5.º e 6. º, acrescentados recentemente pela Lei n.º 14.550/23. 4. Nesse cenário, torna-se imperiosa a instauração do contraditório antes de se decidir pela manutenção ou revogação do referido instrumento protetivo. Em obediência ao princípio do contraditório (art. 5.º, inciso LV, da Constituição da República), as partes devem ter a oportunidade de influenciar na decisão, ou seja, demonstrar a permanência (ou não) da violência ou do risco dessa violência, evitando, dessa forma, a utilização de presunções, como a mera menção ao decurso do tempo, ou mesmo a inexistência de inquérito ou ação penal em curso. 5. Não pode ser admitida a fixação de um prazo determinado para a vigência das medidas aplicadas (revogação automática), sem qualquer averiguação acerca da manutenção daquela situação de risco que justificou a imposição das medidas protetivas, expondo a mulher a novos ataques. […] 8. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem revogou as medidas protetivas sem indicar elementos concretos que apontassem a mudança daquela situação de perigo anteriormente constatada pelo Juízo singular. Foi ressaltada a inexistência de inquérito ou ação penal em curso e utilizada mera suposição (longo decurso de tempo). Cabível, dessa maneira, o restabelecimento da sentença que impôs as medidas protetivas previstas no art. 22, inciso III, alíneas a, b, e c da Lei n. 11.340/2006, pois, naquela oportunidade, o Magistrado singular destacou a situação de perigo (ameaça de morte com arma de fogo e descumprimento das medidas protetivas fixadas) e, em audiência realizada posteriormente, a Ofendida reiterou a necessidade de manutenção das medidas, pois ainda presente a situação de risco. 9. Recurso especial provido para restabelecer as medidas protetivas impostas em favor da Ofendida, podendo o Juiz singular, de ofício ou mediante notícia de alteração fática, revisar a necessidade de manutenção das medidas, no prazo que entender mais adequado na hipótese, desde que garantida a prévia manifestação das Partes. (REsp n. 2.036.072/MG, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/8/2023, DJe de 30/8/2023.)
Outros julgados sobre o tema:
Acórdãos
- AgRg no REsp 1775341/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 12/04/2023, DJe 14/04/2023
Decisões Monocráticas
- HC 826313/MG, Rel. Ministra DANIELA TEIXEIRA, QUINTA TURMA, julgado em 26/02/2024, publicado em 27/02/2024
- AREsp 2482056/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 29/01/2024, publicado em 19/02/2024
- HC 816981/MG, Rel. Ministro TEODORO SILVA SANTOS, SEXTA TURMA, julgado em 02/02/2024, publicado em 05/02/2024
- RHC 184987/GO, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 21/11/2023, publicado em 23/11/2023
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Fonte: Jurisprudência em Teses do STJ – Edição nº 231 (acesse aqui).
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