STJ: a reincidência, por si só, não impede a prisão domiciliar
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no AgRg no HC 679.489/SP, decidiu que “a reincidência não impossibilita, por si só, a concessão da prisão domiciliar”.
Confira a ementa relacionada:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. LEGITIMIDADE. PRISÃO DOMICILIAR. MÃE DE FILHO MENOR DE DOZE ANOS DE IDADE. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS. PRINCÍPIOS DA FRATERNIDADE (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PREÂMBULO E ART. 3º) E DA PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA. HC COLETIVO N. 143.641/SP (STF). FLAGRANTE ILEGALIDADE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. AGRAVADO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O regime jurídico da prisão domiciliar, especialmente no que concerne à proteção da integridade física e emocional dos filhos do agente, e as inovações trazidas pelas recentes alterações legislativas, decorrem, indiscutivelmente, do resgate constitucional do princípio da fraternidade (Constituição Federal: preâmbulo e art. 3º). 2. Cumpre destacar que o tema foi analisado com acuidade pelo Eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello, em 4/4/2016, ao decidir o HC n. 134.734/SP. Ao conceder o habeas corpus, foi lembrado que o art. 318 do Código de Processo Penal, que permite a prisão domiciliar da mulher gestante ou mãe de filhos com até 12 anos incompletos, foi instituído para adequar a legislação brasileira a um compromisso assumido internacionalmente pelo Brasil nas Regras de Bangkok. Essa alteração no Código de Processo Penal foi dada pelo Estatuto da Primeira Infância (Lei n. 13.257/2016). 3. Efetivamente, as disposições legislativas insculpidas nos art. 318, V, do Código de Processo Penal, incluído pela Lei n. 13.257/2016, e no inciso III do art. 117 da LEP não condiciona a prisão domiciliar da mãe com filho menor de 12 anos à comprovação de outros requisitos, como quis o legislador no caso do pai (inciso VI do art. 319 do CPP). 4. Ressalte-se que o deferimento da prisão domiciliar não significa libertar a ré, que continua presa, com o seu direito de ir e vir limitado, como se infere da regra inserta no art. 317 do CPP: A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial. 5. No caso, a paciente possui um filho menor de 12 anos e o crime a ela imputado (receptação) não envolve violência ou grave ameaça. Com efeito, no caso, além de se presumir a necessidade dos cuidados maternos em relação à referida criança, não se deve ignorar que não há indicativo de que esteja associada com organizações criminosas, circunstâncias essas que, em conjunto, ensejam, por ora, a atenuação da situação prisional da acusada. 6. Impende registrar, ainda, que, segundo entendimento jurisprudencial consolidado nesta Superior Corte de Justiça, a reincidência não impossibilita, por si só, a concessão da prisão domiciliar. Precedentes. 7. Prevalecem, pois, neste momento, as razões humanitárias, não se podendo descurar que a prisão domiciliar é instituto previsto tanto no art. 318, inciso V, do Código de Processo Penal, para substituir a prisão preventiva de mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; quanto no art. 117, inciso III, da Lei de Execuções Penais, que se refere à execução provisória ou definitiva da pena, para condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental. Uma interpretação teleológica da Lei n. 13.257/2016, em conjunto com as disposições da Lei de Execução Penal, e à luz do constitucionalismo fraterno, previsto no art. 3º, bem como no preâmbulo, da Constituição Federal, revela ser possível se inferir que as inovações trazidas pelo novo regramento podem ser aplicadas também à fase de execução da pena, conforme já afirmado pela Quinta Turma. Precedentes. 8. Ainda sobre o tema, é preciso recordar: a) o princípio da fraternidade é uma categoria jurídica e não pertence apenas às religiões ou à moral. Sua redescoberta apresenta-se como um fator de fundamental importância, tendo em vista a complexidade dos problemas sociais, jurídicos e estruturais ainda hoje enfrentados pelas democracias. A fraternidade não exclui o direito e vice-versa, mesmo porque a fraternidade, enquanto valor, vem sendo proclamada por diversas Constituições modernas, ao lado de outros historicamente consagrados como a igualdade e a liberdade; b) o princípio da fraternidade é um macroprincípio dos Direitos Humanos e passa a ter uma nova leitura prática, diante do constitucionalismo fraternal prometido na Constituição Federal, em especial no seu art. 3º, bem como no seu preâmbulo; c) O princípio da fraternidade é possível de ser concretizado também no âmbito penal, através da chamada Justiça restaurativa, do respeito aos Direitos Humanos e da humanização da aplicação do próprio direito penal e do correspondente processo penal. Doutrina: BRITTO, Carlos Ayres. O Humanismo como categoria constitucional. Belo Horizonte: Forum, 2007; VIEIRA, Cláudia Maria Carvalho do Amaral; VERONESE, Josiane Rose Petry. Crianças Encarceradas: A Proteção Integral da criança na execução penal feminina da pena privativa de liberdade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015; MACHADO, Carlos Augusto Alcântara. A Fraternidade como Categoria Jurídica: fundamentos e alcance (expressão do constitucionalismo fraternal). Curitiba: Appris, 2017. 9. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC 679.489/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 28/09/2021, DJe 04/10/2021)
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