Ordem de serviço na investigação criminal defensiva
As ordens de serviço são muito comuns em investigações policiais. Frequentemente, na portaria de instauração do inquérito, os Delegados inserem diligências a serem realizadas pelos policiais. Também é frequente a determinação de ordens de serviço em fases mais avançadas da investigação, a partir de alguma necessidade que tenha surgido, como, por exemplo, para subsidiar uma representação que tenha como objetivo uma busca e apreensão.
Em alguns casos, antes de representar ao Juiz pela busca e apreensão, o Delegado de Polícia, por uma ordem de serviço, determina que os agentes policiais se desloquem até o local e monitorem se o investigado utiliza o imóvel, quanto tempo normalmente fica lá e outras informações que facilitem a futura busca. A partir de uma diligência mais simples, fundamenta-se o pedido de uma diligência mais complexa.
Assim, o cumprimento de uma diligência pode:
- por si só, trazer informações;
- auxiliar na decisão sobre quais devem ser as próximas diligências;
- fundamentar o pedido de alguma diligência no inquérito ou no processo.
No desenvolvimento da investigação criminal defensiva, o Advogado poderá atuar pessoalmente ou por meio de colaboradores, como outros Advogados, peritos, contadores, estagiários, funcionários administrativos do escritório ou qualquer outra pessoa que execute as tarefas relacionadas à investigação.
Considerando que a investigação defensiva poderá demandar uma delegação de tarefas aos colaboradores, a ordem de serviço terá a finalidade de organizar essa distribuição.
Na ordem de serviço, o Advogado que instaura e preside a investigação criminal defensiva formaliza e define as diligências que devem ser realizadas, especificando quem cumprirá a ordem e qual será o prazo para essa finalidade.
Conforme sugere a nomenclatura, a ordem de serviço é uma determinação para que alguém faça algo. Deve-se ter coerência para que, havendo necessidade, a ordem seja dada a quem tenha o conhecimento ou as habilidades para o serviço delegado. Caso não exija conhecimentos específicos (tirar fotografias de um local, sem finalidade pericial), a delegação pode ser feita a qualquer pessoa, como outro Advogado do escritório, um estagiário, um fotógrafo ou um prestador de serviço externo.
Aliás, caso precise encontrar o profissional com o conhecimento especializado para determinada diligência, pode-se formalizar uma ordem de serviço direcionada a alguém do escritório para que pesquise profissionais que tenham a habilidade exigida. Teria, por exemplo, um trecho afirmando: “determino a realização de perícia contábil para analisar se houve supressão de tributos e, para tanto, determino ao Advogado X que pesquise contadores com experiência em ____”.
Nessa situação, será necessário pesquisar profissionais na área exigida, fazer orçamentos e decidir quem será o profissional contratado.
No exemplo acima, havendo necessidade de revisar determinados registros contábeis, deve-se delimitar o período, quais são os tributos (de acordo com a persecução penal) e o que se pretende provar por meio dessa diligência. Essa delimitação do objeto é importante para procurar o profissional adequado ao serviço e para obter um orçamento, assim como para a própria revisão dos registros. Aliás, para demonstrar a seriedade da diligência, recomenda-se informar ao profissional contratado que aquilo que será elaborado por ele poderá ser juntado em um processo criminal e que, havendo necessidade, ele será arrolado como testemunha.
Em que pese a ordem de serviço não seja uma imposição ou um documento imprescindível, recomenda-se a sua utilização.
Por mais que pareça dispensável – e talvez tolo – inserir na investigação defensiva uma ordem de serviço para que um funcionário do escritório obtenha orçamentos e contrate um profissional externo ou para que o estagiário pesquise determinadas certidões na internet, trata-se de uma formalidade que pode ser relevante para a delegação das atividades. Portanto, não se trata de mera burocracia despropositada e irrefletida.
A documentação das delegações de atos por meio da ordem de serviço faz com que a atividade seja levada a sério, atribuindo um caráter de importância. Uma ordem oral, de modo informal, parece ter pouca urgência, especialmente em um escritório com uma grande estrutura e inúmeras demandas. Todavia, a mesma ordem, entregue por escrito, com a assinatura de quem delegou o ato e a confirmação – também por assinatura – de quem a recebeu, contendo um prazo para seu cumprimento, tem maior respeitabilidade e até sisudez.
Outrossim, a documentação por escrito, com a assinatura de quem recebeu a delegação, de modo símil a uma intimação, passa a ter o atributo da exigibilidade.
Com o devido reconhecimento da importância e das vantagens da ordem de serviço, o próximo passo é entender sua estrutura, isto é, quais informações devem compor esse documento.
A primeira informação consiste na individualização do ato, por meio de uma numeração única (OS n. 1/2020, por exemplo), assim como a numeração dos autos da investigação criminal defensiva (AID n. 2/2020, por exemplo). Se for o caso, a numeração da ordem de serviço pode conter a numeração da investigação defensiva, ficando, por exemplo, assim: OS n. 1/2/2020. Nesse caso, seria a ordem de serviço 1 da investigação defensiva 2 do ano de 2020.
Em seguida, deve-se inserir a descrição da diligência a ser realizada. Por razões óbvias, essa é a parte mais importante, exigindo detalhamento sobre o que deve ser feito, como e com qual finalidade.
As finalidades podem ser procurar o endereço de alguém, tirar fotos de um local, vigiar a movimentação de uma pessoa, analisar documentos etc.
Na ordem de serviço, também deve constar o nome do profissional que deverá cumprir a tarefa, assim como a sua qualificação e, se for o caso, o endereço profissional, além do número de registro no órgão de classe competente. Tratando-se de um funcionário do escritório, a qualificação poderá ser resumida, como “será cumprida por Fulano, estagiário deste escritório”. Quando a tarefa incumbir a um profissional especializado, a qualificação poderá mencionar títulos acadêmicos e cursos frequentados.
Outro ponto de enorme importância – sobretudo prática – é a previsão de um prazo para a conclusão da diligência e, se for o caso, a apresentação de relatório pormenorizado dos meios utilizados e resultados obtidos. A definição de prazos evita o acúmulo de diligências pendentes e demonstra a formalidade do ato. O prazo pode variar de 24 horas (tarefas simples) a algumas semanas (elaboração de laudos, pesquisas complexas etc.).
Na estrutura da ordem de serviço, Bulhões (2019, p. 140) também sugere “as recomendações expressas no sentido de assegurar a legalidade e constitucionalidade da diligência, em especial nos direitos e garantias de terceiros”.
Sugere-se, portanto, a especificação de algumas proibições, principalmente aquelas que podem caracterizar crimes, o que pode ser fundamental quando a diligência for praticada por alguém sem conhecimento jurídico.
Após o cumprimento da ordem de serviço e a juntada da diligência realizada nos autos da investigação criminal defensiva, recomenda-se a elaboração de um relatório que aborde a utilidade dos respectivos resultados.
Referência:
BULHÕES, Gabriel. Manual prático de investigação defensiva: um novo paradigma na advocacia criminal brasileira. Florianópolis, SC: EMAIS, 2019.
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