Decisão proferida pela Sétima Turma do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF4) no ACR 00014390220074047001, julgado em 31/07/2012 (leia a íntegra do acórdão).
Confira a ementa:
EMENTA: PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. LAUDO APRESENTADO EM JUÍZO CÍVEL. AVALIAÇÃO DE DEBÊNTURES. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO. É atípica a conduta do acusado que, na condição de perito contratado pelo devedor em Execução Fiscal, elabora laudo pericial avaliando debêntures oferecidas em garantia, pois se trata de manifestação opinativa, que não vincula o Juízo. (TRF4, ACR 0001439-02.2007.4.04.7001, SÉTIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, D.E. 27/08/2012)
Leia a íntegra do voto:
VOTO
Em suas razões de apelação, Ossami Sakamori aduz, preliminarmente, a nulidade da sentença por violação ao princípio da correlação entre a acusação e a sentença. Quanto ao mérito, pede a absolvição pela atipicidade da conduta, pois ausentes as elementares típicas intrínsecas ao crime de falsidade ideológica. Subsidiariamente, requer a redução da pena ao patamar mínimo e a vinculação da pena de multa ao salário mínimo vigente na data dos fatos.
Conforme a denúncia, em 06-10-2004 foi feita indicação por Linete Bartalo 220 debêntures da Companhia Vale do Rio Doce, Série Única, Código ISIN – BRVALEDBS028 nos autos de Execução Fiscal nº 2003.70.01.010753-0 na Vara de Execuções Fiscais da Subseção Judiciária de Londrina, em que a Fazenda Nacional move em face de Linete Bartalo, tendo juntado nesse ato laudo de atualização monetária de debêntures da Companhia Vale do Rio Doce elaborado por Ossami Sakamori.
Narra ainda a exordial que o cálculo apresentado por Ossami, com base na cotação da Bolsa de Valores de São Paulo do dia 19-08-2004, atribuiu a cada debênture o valor de R$ 147,00 (cento e quarenta e sete reais). Contudo, diante da informação do Banco Bradesco S/A, descobriu-se a tentativa de fraude pelo acusado, na medida em que ” debêntures da Companhia Vale do rio Doce não se equivalem a ações, não são conversíveis em ações, são negociáveis apenas ao portador e possuem valor ‘simbólico’ equivalente a R$ 0,02 (dois centavos de real) cada”).
De início, cumpre afastar a alegação de nulidade por ofensa ao princípio da correlação entre a acusação e a sentença.
Pelo que se vê dos autos, não houve condenação por fato não descrito na denúncia. Na realidade, a denúncia imputou a Ossami a confecção de documento particular ideologicamente falso com o escopo de prejudicar a Fazenda Pública. E o juízo monocrático condenou o réu às penas previstas no art. 299 do Código Penal, em obediência ao princípio da correlação entre a acusação e a sentença e aos princípios do contraditório e da ampla defesa, consequentemente, ao devido processo legal.
O crime de falsidade ideológica se refere ao conteúdo do documento, sendo esse o cerne da controvérsia. Questiona-se se o laudo de avaliação de debêntures da Cia Vale do Rio Doce, nomeadas à penhora, apresenta valores inverídicos a maior.
De acordo com a Defesa, a conduta seria atípica, pois ausentes as elementares típicas do crime de falsidade ideológica, na medida em que o laudo pericial elaborado pelo réu foi elaborado em conformidade com as informações obtidas em prospecto de emissão de debêntures oriundo da própria Companhia Vale do Rio Doce.
De fato, cuida-se de laudo particular elaborado pelo réu a pedido de Linete Bartalo, o qual se utilizou do prospecto oriunda da Companhia Vale do Rio Doce para justificar o oferecimento de debêntures como garantia à execução, nos autos da Execução Fiscal nº 2003.70.01.010753-0 em trâmite na Vara de Execuções Fiscais da Subseção Judiciária de Londrina. O acusado foi contratado por Linete e não como perito do Juízo, não vinculando, pois, o Juízo da Execução a corroborar o teor do laudo pericial.
O laudo pericial, tido como contrafeito, é, de fato, uma manifestação particular opinativa sobre o valor de um título, o que não configura o crime em pauta.
Nesse sentido, o próprio Juízo, Vara das Execuções Fiscais de Londrina/PR, em que foram oferecidas as debêntures indeferiu o pedido de comunicação de supostas irregularidades ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal (fls. 172), evidenciando ausência de lesão.
Assim, considerando que o acusado não foi contratado como perito do Juízo da 3ª Vara de Execuções Fiscais de Curitiba, a manifestação opinativa não vinculava o referido Juízo à sua conclusão.
Impõe-se a reforma da sentença, para que o acusado Ossami Sakamori seja absolvido, com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo.
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