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Evinis Talon

STF: o fato de o réu turbar o andamento processual, ocultando-se para não ser citado, justifica a decretação da prisão preventiva para garantir a aplicação da lei penal

30/11/2019

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Decisão proferida pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal no HC 115907, julgado em 03/09/2013 (leia a íntegra do acórdão).

Confira a ementa:

EMENTA HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DE APLICAÇÃO DA LEI PENAL. OCULTAÇÃO DO PACIENTE. CITAÇÃO REALIZADA. MOTIVOS CESSADOS. SÚMULA 691/STF. AFASTAMENTO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Em casos teratológicos e excepcionais, como o dos autos, viável afastar o óbice da Súmula 691 desta Suprema Corte. Precedentes. 2. O fato de o paciente turbar o andamento processual, ocultando-se para não ser citado, além de reprovável, justifica a decretação da prisão preventiva para garantir a aplicação da lei penal. 3. A posterior citação do paciente conjugada com a falta de elementos indicativos de risco à aplicação da lei penal induz à superação dos motivos da segregação cautelar do paciente. 4. Substituição da prisão preventiva pelas medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. 5. Ordem concedida. (HC 115907, Relator(a):  Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 03/09/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-207 DIVULG 17-10-2013 PUBLIC 18-10-2013)

Leia a íntegra do voto da Ministra Rosa Weber:

VOTO A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): O presente habeas corpus foi impetrado contra decisão de indeferimento de liminar exarada pela Ministra Assusete Magalhães no HC 257.897/SP, em trâmite no Superior Tribunal de Justiça.

Cumpre registrar, desde logo, que, à falta de pronunciamento final do colegiado do Superior Tribunal de Justiça, a pretensão do Impetrante esbarraria na Súmula nº 691/STF – segundo a qual “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”.

Todavia, a compreensão expressa em tal verbete sumular tem sido abrandada em julgados desta Corte em hipóteses excepcionais, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder na denegação da tutela de eficácia imediata. Nesse sentido, v.g, as seguintes decisões colegiadas: HC 84.014/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 25.6.2004; HC 85.185/SP, Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 1º.9.2006; e HC 88.229/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, julgado em 10.10.2006.

Na espécie, entendo que, excepcionalmente, o óbice deve ser afastado.

Em síntese, busca-se a liberdade do paciente porquanto cessado o motivo determinante da decretação da prisão preventiva, consubstanciado na garantia da aplicação da lei penal pela reiterada ocultação com vista a dificultar a citação.

A prisão cautelar do paciente foi decretada pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de São João da Boa Vista-SP com fundamento exclusivo na garantia de aplicação da lei penal, verbis :

“(…) Analisando as provas existentes nos autos, concluo que a prisão preventiva do acusado Antônio Jamil Alcici é necessária para a garantia da aplicação da lei penal.

(…)

Nesse caso, a prisão preventiva é necessária para a garantia de aplicação da lei penal, diante das manobras empreendidas pelo acusado para não ser citado, inclusive nos endereços em que fora localizado em outros processos. A certidão de fls. 237 atesta a evasão, notando-se que ele já foi citado no endereço constante no mandado de fls. 229, no âmbito da ação penal nº 2009.61.27.001204-0 (fls. 221/222)”.

Ao indeferir o pedido de revogação da prisão preventiva, o magistrado federal esclareceu que:

 “(…) A despeito dos argumentos lançados nos autos às fls. 305- 318, não se verificam condições pessoais favoráveis ao requerente.

Inicialmente, resta deixar consignado que bons antecedentes e primariedade não impedem a decretação da prisão preventiva. (…)

No mais, como já se disse, em diferentes feitos, sejam de natureza penal, sejam de natureza fiscal, o acusado fornece diversos endereços e em diversas cidades, em que poderia ser encontrado, não sendo efetivamente localizado em nenhum deles.

Apesar disso, em seu pedido de reconsideração, o requerente alega que possui residência fixa, comprovada por meio de contrato de compra e venda do imóvel onde residiria com sua família.

Para tanto, junta aos autos um contrato de compromisso de venda e compra (instrumento particular) de um imóvel localizado no loteamento Chácaras Boa Vista, em Mogi Mirim, datado de 1996.

E junta, ainda, uma declaração firmada por Eliane Christina Vischi afirmando que o mesmo reside em sua propriedade, localizada na Rua Antonio Soares Oliveira, 761, Chára Boa Vista, em Mogi Mirim (fl. 332), seguida de uma conta de energia elétrica emitida em nome dessa declarante que sequer foi paga pelo requerente, como se infere do recibo de fl. 335 (conta paga por Leonardo Stefanini).

Não se sabe se esse endereço é o mesmo do contrato de compra e venda e, em caso positivo, já não mais pertenceria ao requerente mas a terceira pessoa, sendo que não há prova de que o requerente resida nesse endereço.

Ressalte-se, ainda, que o requerente se apresenta como autônomo, e que prestaria serviços a empresa sediada em Piracicaba, de modo que já antecipa suas frequentes viagens a trabalho.

Há de se ponderar, por fim que, para comprovar exercício de atividade lícita, junta aos autos declaração firmada por seus filhos, na qualidade de sócios da empresa OVNIS COMÉRCIO DE APARAS DE PAPEL LTDA, de que o mesmo presta serviços como autônomo da área comercial.

Assim, com base nos documentos juntados, não se pode afirmar indene de dúvidas que o requerente possui residência fixa e que possua bons antecedentes, de modo que imperiosas a manutenção da prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal, nos termos do artigo 312 do Código Adjetivo Penal”.

Esse entendimento foi corroborado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região na denegação do writ impetrado contra a decisão de segregação cautelar. Confira-se a ementa do julgado:

“PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA INICIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PACIENTE. ALEGAÇÃO DE FALTA DE JUSTA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. PRISÃO PREVENTIVA. OCULTAÇÃO PARA NÃO SER CITADO. GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL. ORDEM DENEGADA. 1. Alegação de que denúncia é inepta e ilegitimidade passiva do paciente. 2. Denúncia preenche os requisitos do art. 41 do CPP. Descrição de conduta que, em tese, se adequa ao tipo descrito no art. 1º da Lei nº 8.137/90, c.c. arts. 29 e 71, do Código Penal. Apontados indícios suficientes de autoria por parte do ora paciente. 3. Direito de defesa deve ser exercido no âmbito da ação penal. Exercício da ampla defesa e do contraditório garantidos ao paciente. 4. O trancamento da ação penal é medida excepcional por meio do writ, adotada apenas quando das provas documentais aduzidas com a impetração comprove-se, de plano, ou a atipicidade da conduta, ou a ausência de justa causa para a ação penal, ou alguma causa extintiva da punibilidade ou, enfim, as circunstâncias que excluam o crime. Circunstâncias não demonstradas no caso. 5. Habeas corpus é via estreita. Incabível dilação probatória. 6. Primariedade, profissão lícita e residência fixa são insuficientes para autorizar a concessão da liberdade. Não demonstração no caso. 7. Paciente se ocultou reiteradamente para não ser citado. Necessidade de segregação cautelar embasada na garantia da aplicação da lei penal. Precedentes do STJ. 8. Ordem denegada”.

A esse respeito, transcrevo excertos do voto condutor do acórdão:

 “(…)

E, no que se refere à atividade lícita e residência fixa, cabe ressaltar que, por si sós, não são suficientes a autorizar a concessão da liberdade.

Nesse sentido, verifica-se das informações prestadas pela autoridade coatora que o indeferimento da liberdade provisória foi embasado na necessidade de assegurar a aplicação da lei penal, em face da reiterada ocultação do paciente para não ser citado na ação penal de origem.

Destaco trecho da informação, em que a autoridade coatora esclarece os fundamentos que embasaram a decisão de indeferimento da liberdade ao paciente:

‘A denúncia ofertada pelo representante do Ministério Público Federal foi recebida por este Juízo em 18/02/2011, com expedição de carta precatória, em 17/03/2011 para citação e intimação do réu para responder à acusação, tendo sido expedidos ofícios solicitando as certidões de antecedentes criminais do réu.

A carta precatória citatória retornou sem cumprimento (juntada em 29/06/2011). Determinou o Juízo, em 22/07/2011 que fosse deprecada a citação do réu para a Comarca de Itapira, devendo consignar na carta precatória, caso verificado a tentativa do réu de se ocultar, fosse a citação feita por hora certa.

Expedida a carta precatória em 29/08/2011, aquela retornou mais uma vez negativa, com certidão do senhor oficial de justiça de estar o réu em lugar incerto e não sabido.

O Ministério Público Federal requereu fosse decretada a prisão preventiva do réu, tendo o Exmo. Sr. Dr. Gilberto Mendes Sobrinho proferido a seguinte decisão, em 12/12/2011:

‘(…)’

Foi expedido mandado de prisão preventiva em 31/01/2012, tendo o Ministério Públido Federal fornecido novo endereço para tentativa de cumprimento do mandado de prisão expedido.

Foi certificado nos autos às fls. 299, que após a audiência de interrogatório do réu realizada em 24/05/2012, nos autos nº 0001008- 37.2003.403.6127 foi dada voz de prisão ao réu, dando-se cumprimento ao mandado de prisão nº 001 e 002, nestes autos expedidos.

Em 25/05/2012 foi juntada aos autos petição do réu, requerendo a revogação da prisão preventiva, tendo sido expedido mandado de citação e intimação em 24/05/2012, cumprido na mesma data nas dependências deste Fórum Federal.

Manifestou-se o MPF, em 25/05/2012, pela manutenção da prisão preventiva, tendo o Juízo proferido a seguinte decisão:

‘(…)’

Em 31 de maio de 2012 determinou o Juízo que se aguardasse o prazo para defesa do réu, tendo sido certificado nos autos, em 13/06/2012 que não houve apresentação de defesa escrita pelo réu (certidão de fls. 446)

Em 13/06/2012, tendo em vista que o réu, devidamente citado e intimado, e apesar de ter constituído advogado não apresentou defesa escrita, foi nomeada advogada para apresentação de defesa escrita em favor do réu. Essas as principais ocorrências do processo” (fls. 1391/1403).

(…)

Assim, verificada que a questão foi bem apreciada, não tendo o impetrante, nesta ação de habeas corpus, trazido elementos que contradigam a conclusão alcançada pelo juízo de primeiro grau, não se verifica o apontado constrangimento ilegal ao direito de liberdade, na medida em que a decisão que indeferiu o pedido de liberdade provisória ostenta fundamentos suficientes, bem como a denúncia não é inepta, não tendo sido demonstrada ausência de justa causa à persecução penal, não cabendo o trancamento da ação penal”.

A seu turno, o Superior Tribunal de Justiça, em decisão monocrática da Ministra Assusete Magalhães, indeferiu o pedido liminar porque “Na hipótese, ao menos em sede de cognição sumária e em princípio, não se detecta manifesta ilegalidade, apta a ensejar o deferimento da medida de urgência, devendo a matéria ser deslindada pelo Colegiado, após prestadas as informações e processado o feito”.

Como se observa, a prisão preventiva do paciente foi decretada após duas tentativas frustradas de citação, realizadas pelo Juízo deprecado da Comarca de Itapira-SP. Após, o Ministério Público Federal forneceu novo endereço para cumprimento do mandado de prisão, efetivado depois do interrogatório do acusado em processo criminal diverso – Ação Penal 0001008.37.2003.403.6127 –, em trâmite na 1ª Vara da Subseção de São João da Boa Vista-SP.

O fato de o paciente turbar o andamento processual, ocultando-se para não ser citado, além de reprovável, justifica a decretação da prisão cautelar para garantir a aplicação da lei penal.

Todavia, no dia da prisão, ocorrida em 24.5.2012, o paciente foi devidamente citado, com o regular prosseguimento da instrução criminal.

Nessas condições, não considero explícita a intenção do paciente em se furtar à ação da Justiça, notadamente porque realizada sua citação em outro processo criminal, em trâmite no mesmo Juízo Federal, com o seu comparecimento espontâneo a fim de ser interrogado, momento em que cumprido o decreto prisional.

Agregue-se o fato de que ausentes outros elementos indicativos de risco à aplicação da lei penal pelo paciente, sendo imperioso reconhecer que cessaram os motivos determinantes para a segregação cautelar.

A propósito, ao cumprir a liminar anteriormente deferida, o Juízo Federal da 8ª Vara da Subseção Judiciária de Campinas-SP pormenorizou as medidas cautelares impostas ao paciente, de modo que arbitrou o valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) a título de fiança e impôs a obrigação de comparecimento em juízo mensalmente, durante todo o curso da ação penal.

Prestada a fiança, o paciente, em 24.12.2012, foi colocado em liberdade, tendo comparecido à 6ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Ribeirão Preto-SP para prestar compromisso no dia 26.12.2012.

Inviável concluir que o paciente em liberdade poderia apresentar risco à aplicação da lei penal, sobretudo pela sua manifesta intenção de comparecer a todos os atos do processo, colaborando com a Justiça, compromisso condizente com sua conduta após solto.

Assim, não mais necessária a prisão preventiva, entendo ser o caso de excepcional superação da Súmula 691/STF, nos termos da liminar anteriormente deferida, confirmando a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal (fiança e comparecimento periódico em juízo).

Ante o exposto, impõe-se a concessão da ordem, ratificando os termos da liminar deferida.

É como voto.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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