STJ: ofendido pode se habilitar em mandado de segurança postulando restituição de valores em caso de furto
No AREsp 1.700.368/CE, julgado em 18/6/2024, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que não é adequada a decisão que impede a habilitação do ofendido em mandado de segurança, cujo propósito afeta seus interesses, sendo imperativa a formação do litisconsórcio passivo necessário.
Informações do inteiro teor:
As garantias constitucionais do devido processo legal, do exercício do contraditório e da ampla defesa, sob o prisma da defesa, também deve ser considerada sob a perspectiva do ofendido/vítima, tendo em vista o inafastável interesse no resultado advindo do processo instaurado.
Nesta perspectiva, a vítima participa ativamente ao ser ouvida, ao apresentar elementos de prova ou sugerir diligências, bem como ao atuar em favor da reparação dos danos sofridos em decorrência da conduta criminosa.
Nessa linha, as alterações do Código de Processo Penal, expressaram a crescente intenção do legislador de confiar papel relevante ao ofendido seja na fase inquisitorial, seja na fase acusatória da persecução penal.
Noutro viés, a jurisprudência do STJ e do STF, em regra, não admitia intervenção de terceiros em ação de mandado de segurança, assim como em habeas corpus. Contudo, ao longo dos anos, o entendimento desta Corte e do Supremo Tribunal Federal passou a flexibilizar a intervenção de terceiros em sede de habeas corpus, para permitir a participação do querelante no julgamento do writ.
Dessarte, se na hipótese de utilização da ação de habeas corpus, na qual se tutela o direito constitucional de locomoção, a jurisprudência excepcionalmente tem admitido a possibilidade de intervenção, a mesma compreensão pode ser aplicada ao mandado de segurança, uma vez que o direito a ser discutido se refere à tutela dos interesses legítimos da vítima, no caso, a reparação de danos.
Na situação em análise, a ação constitucional na origem, ao impugnar decisão que indeferiu restituição de valores oriundo de furto milionário, ensejou a ampliação do direito de participação da vítima (Banco Central) no feito mandamental cujo propósito afeta seus interesses legítimos de ressarcimento dos danos em decorrência do crime praticado.
Afastar a vítima da discussão que busca delimitar ou condicionar seu direito de participar ativamente nos feitos que afetam seus interesses viola exatamente o referido direito de participação.
Ademais, diversamente do que ocorre com o habeas corpus, no mandado de segurança existe norma autorizativa de intervenção de terceiros, devendo ser afirmado, por isso, a sua admissibilidade.
Nessa esteira, a observância do devido processo legal perpassa pelo atendimento do art. 24 da Lei n. 12.016/2009, materializando-se com a formação do litisconsórcio passivo necessário (art. 47 do CPC/1973 e art. 114 do CPC/2015), assegurando ao Banco Central o exercício do contraditório na defesa dos seus interesses no bojo do pedido de restituição de valores arrecadados com a alienação antecipada de bens adquiridos com produto do furto milionário do qual figura como vítima.
Em um ordenamento jurídico que, proclama e fomenta a atuação do ofendido na persecução penal, não se mostra adequado obstar a sua habilitação em mandamus cujo propósito afeta esfera de interesses da vítima, de modo que é imperativa a formação do litisconsórcio passivo necessário, sob pena de nulidade.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS:
LEGISLAÇÃO
Lei n. 12.016/2009, art. 24
Código de Processo Civil (CPC), art. 114
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Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – Edição nº 817 – leia aqui.
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