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Evinis Talon

STJ: o crime de uso de documento falso pode ser absorvido pelo crime de descaminho

12/07/2019

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Decisão proferida pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça no REsp 1378053/PR, julgado em julgado em 10/08/2016 (leia a íntegra do acórdão).

Confira a ementa:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. RITO PREVISTO NO ART. 543-C DO CPC. DIREITO PENAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. DESCAMINHO. USO DE DOCUMENTO FALSO. CRIME-MEIO. ABSORÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1. Recurso especial processado sob o rito do art. 543-C, § 2º, do CPC e da Resolução n. 8/2008 do STJ. 2. O delito de uso de documento falso, cuja pena em abstrato é mais grave, pode ser absorvido pelo crime-fim de descaminho, com menor pena comparativamente cominada, desde que etapa preparatória ou executória deste, onde se exaure sua potencialidade lesiva. Precedentes. 3. Delimitada a tese jurídica para os fins do art. 543-C do CPC, nos seguintes termos: Quando o falso se exaure no descaminho, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido, como crime-fim, condição que não se altera por ser menor a pena a este cominada 4. Recurso especial improvido. (REsp 1378053/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/08/2016, DJe 15/08/2016)

Leia a íntegra do voto:

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator):

O presente recurso especial, submetido ao rito dos recursos repetitivos, versa sobre questão de direito comum a inúmeros recursos especiais que se encontram represados na origem: a aplicação do princípio da consunção quando a falsificação de de papéis públicos é meio ou fase necessária ao descaminho, crime de menor gravidade.

Elizabeth Silva Menezes Rios, ora recorrida, foi denunciada pela prática do delito previsto no art. 293, § 1º, inciso III, alínea a, do Código Penal, por apresentar Declaração de Bagagem Acompanhada – DBA, com selo de autenticação falso, a Policias Rodoviários Federais, no Município de Santa Terezinha de Taipu/PR, para internalização de mercadorias oriundas do Paraguai (fls. 76/79).

A inicial acusatória foi rejeitada, nos termos do art. 395, inciso III, do CPP, pela incidência do princípio da consunção, por constituir o falso elemento para ilusão tributária, nela exaurindo a sua potencialidade lesiva (fl. 117), sendo então absorvido pelo tipo penal de descaminho, em relação ao qual foi aplicado o princípio da insignificância (fls. 115/118).

Interposto recurso em sentido estrito, este restou improvido com os seguintes fundamentos (fls. 155/159):

Trata-se de recurso criminal em sentido estrito, interposto pelo Ministério Público Federal, em face de decisão que rejeitou denúncia em desfavor de ELIZABETH SILVA MENEZES RIOS, por considerar que o delito de uso de documento com selo falsificado a ela atribuído visava exclusivamente a prática de descaminho, devendo por este ser absorvido. Segundo consta, a denunciada teria apresentado uma Declaração de Bagagem Acompanhada (DBA) com selo autenticador falso perante os agentes da Policia Rodoviária Federal em Santa Terezinha de Itaipu/PR, para internalizar alguns produtos estrangeiros. Consoante informações prestadas pela Receita Federal do Brasil (Auto de Infração e Apreensão n° 12457.004685/2008-40 – ‘INQ3’ – evento 01 do autos 5001004-95.2011.404.7002), o montante de tributos federais (II e IPI) em tese suprimidos é de R$ 262,37 (duzentos e sessenta e dois reais e trinta e sete centavos). Diante da pequena soma de tributos supostamente iludidos, o Ministério Público Federal requereu o arquivamento do feito com relação ao delito previsto no artigo 334 do Código Penal (‘PEDIDO D2’ – evento 01 do processo 5001004-95.2011.404.7002), por aplicação do princípio da insignificância jurídica. Na mesma ocasião, em razão do uso de selo inautêntico, a acusação ofereceu denúncia contra a ré pela prática do delito previsto no artigo 293, §1°, inciso III, do Estatuto Repressivo (‘INIC1’- evento 01 do processo 5001004-95.2011.404.7002). Todavia, o magistrado de origem rejeitou a exordial, por entender que o uso da Declaração de Bagagem Acompanhada com selo falsificado tinha por finalidade única a prática do descaminho, sobre o qual incidiu o princípio da insignificância (evento 05 do processo 5001004-95.2011.404.7002). Insurge-se o recorrente contra a rejeição da peça acusatória, sustentando a inaplicabilidade do princípio da consunção ao caso (evento 01 do processo originário). Pois bem. Da análise dos documentos juntados aos autos eletrônicos, tenho que o magistrado singular agiu bem ao rejeitar a inicial. Em primeiro lugar, resta evidente, já nesta fase de recebimento da denúncia, que a conduta supostamente praticada por EL1ZABETH SILVA MENEZES RIOS visava facilitar a importação das mercadorias adquiridas no Paraguai. Desse modo, para analisar a aplicabilidade do princípio da consunção ao presente caso, deve ser verificada a potencialidade lesiva do documento espúrio, porquanto o crime de falsidade somente pode ser absorvido se sua aptidão de causar dano exaurir-se no crime final (descaminho), para o qual supostamente estaria voltado o dolo do agente. Nesse contexto, constato que a DBA apresentada para os fiscais aduaneiros no dia 10-4-2008 está preenchida em nome da denunciada, com a data correspondente ao dia anterior (‘INQ3’ – evento 01 do processo 50010049520114047002). Considero, assim, que não há possibilidade de lesão autônoma à fé pública, uma vez que referida declaração teve por finalidade única a importação das mercadorias ali relacionadas e naquela data específica. Destarte, a aptidão lesiva da Declaração de Bagagem Acompanhada com selo autenticador ilegítimo exaure-se totalmente no suposto crime de descaminho. Por conseguinte, sendo atípico o delito previsto no artigo 334 do Código Penal, não há justa causa para apuração do crime-meio. As duas Turmas criminais deste Regional vêm firmando entendimento no sentido de que não remanesce a possibilidade de punição pelo uso de DBA ilegítima quando este tem por fim a prática de descaminho cuja tipicidade é afastada: […] Ressalto, ainda, que não merece prosperar a alegação recursal de que somente um crime com pena abstrata mais severa poderia absorver o de menor gravidade. (e-STJ FI.158) O Superior Tribunal de Justiça sinaliza há muito tempo sobre a viabilidade de crime de maior gravidade ser absorvido por outro mais leve se neste exaurir sua potencialidade lesiva, segundo se extrai da Súmula 17, que preconiza que ‘quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido’ Quanto à possibilidade de crime de descaminho absorver o falso, o Superior Tribunal de Justiça também já se manifestou: […] Este Regional, do mesmo modo, já se pronunciou pela possibilidade de crime mais gravoso ser absorvido por outro de menor severidade quando for meio para a perfectibilização do delito visado: […] Por todo o exposto, afastada a tipicidade do delito de descaminho, não remanesce a persecução penal pelo crime-meio, quando este é considerado antecedente lógico do crime contra a Administração Pública e não apresenta potencialidade lesiva autônoma. Desse modo, se o uso da Declaração de Bagagem Acompanhada falsa exauriu no descaminho, e se este foi arquivado por atipicidade, deve ser mantida a rejeição da denúncia quanto à suposta falsidade. Nesses termos, voto no sentido de negar provimento ao recurso criminal em sentido estrito. […]

Realmente, a apresentação da Declaração de Bagagem Acompanhada (DBA) com selo falso possuía o único objetivo de atestar a regularidade tributária das mercadorias apreendidas pela fiscalização aduaneira, assim exaurindo seu potencial lesino no crime final de descaminho, sem autônomos riscos sociais, sem cabimento de autônoma persecução criminal.

Resolve-se o conflito aparente de normas indicado pelo critério da consunção, de modo que um tipo descarta o outro porque consome ou exaure o seu conteúdo proibitivo, isto é, porque há um fechamento material (ZAFFARONI, Eugênio Raul. Manual de Direito Penal: parte geral. São Paulo: RT, 1997, p. 738).

Noutras palavras, verifica-se, no caso, que o conteúdo de injusto principal consome o conteúdo de injusto do tipo secundário porque o tipo consumido constitui meio regular (e não necessário) de realização do tipo consumidor (SANTOS, Juarez Cirino. Direito penal: parte geral, 6ª ed., Curitiba: ICPC, 2014, p. 418), sendo irrelevante que a pena em abstrato cominada ao tipo consumido seja superior àquela imposta ao tipo consumidor.

Sobre a matéria, esta Corte já se pronunciou no sentido de não ser obstáculo para sua aplicação a proteção de bens jurídicos diversos ou a absorção de infração mais grave pelo de menor gravidade (REsp 1294411/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 10/12/2013, DJe 03/02/2014) .

Em casos análogos, o Superior Tribunal de Justiça adotou a orientação de que o delito de uso de documento falso, cuja pena em abstrato é mais grave, pode ser absorvido quando não constituir conduta autônoma, mas mera etapa preparatória ou executória do descaminho, crime de menor gravidade, no qual o falso exaure a sua potencialidade lesiva. A esse respeito:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO E DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. NÃO EXAURIMENTO DA POTENCIALIDADE LESIVA DO PRIMEIRO. ÓBICE DA SÚMULA N.º 7/STJ. RECURSO IMPROVIDO. 1. Admite-se que uma infração penal de maior gravidade, quando utilizado como simples instrumento para a prática de delito menos grave, assim entendido em razão da pena abstratamente cominada, seja por este absorvido. 2. Desconstituir o entendimento do Tribunal de origem, de que o delito de falso teria sido absorvido pelo crime de descaminho por ser meio necessário para sua execução, exaurindo a falsidade sua potencialidade lesiva na conduta perpetrada pelo réu que objetivava apenas a prática da infração fiscal, exige o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, inviável na via eleita ante o óbice da Súmula 7/STJ. 3. Não consubstanciando conduta autônoma, mas crime-meio, é inviável o prosseguimento da persecução em relação ao uso de documento falso, na medida em que esgotada a sua potencialidade lesiva no descaminho. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1274707/PR, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado em 01/10/2015, DJe 13/10/2015)

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ACÓRDÃO A QUO QUE APLICOU O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ENTENDIMENTO QUE GUARDA CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. 1. A aplicação do princípio da consunção pressupõe a existência de ilícitos penais (delitos-meio) que funcionem como fase de preparação ou de execução de outro crime (delito-fim), com evidente vínculo de dependência ou subordinação entre eles; não sendo obstáculo para sua aplicação a proteção de bens jurídicos diversos ou a absorção de infração mais grave pelo de menor gravidade (REsp n. 1.294.411/SP, Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 3/2/2014). Precedentes. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1425746/PA, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 20/06/2014)

No mesmo sentido, mutatis mutandis, a Súmula 17 do STJ, segundo a qual Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido.

Assim, delimito a tese jurídica para os fins do art. 543-C do CPC, nos seguintes termos: Quando o falso se exaure no descaminho, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido, como crime-fim, condição que não se altera por ser menor a pena a este cominada.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso especial.

Comunique-se, imediatamente, ao Presidente do STJ e dos Tribunais Regionais Federais, Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal e dos Territórios, encaminhando-lhes cópia do presente acórdão, nos termos dos arts. 543-C, § 7º, do Código de Processo Civil e 5º da Resolução n. 8/2008 do STJ.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de pós-graduação com experiência de 11 anos na docência, Doutorando em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca – cursando), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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