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Evinis Talon

A LEP como tabela FIPE da execução penal

18/04/2017

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A LEP como tabela FIPE da execução penal

A tabela FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) tem a função de definir preços médios de veículos no mercado nacional. Atua como um parâmetro para as negociações.

Entretanto, normalmente, a tabela FIPE é vista como o valor máximo que poderia ser pago por determinado veículo, considerando o ano do modelo, estado de conservação etc. Em outras palavras, na prática, compradores e vendedores consultam o valor da tabela FIPE e, em seguida, fazem a negociação por um percentual dessa tabela, cobrando um valor razoavelmente inferior. É raro ver alguém que compra ou venda um veículo pelo valor igual ou superior ao da tabela FIPE. O vendedor sempre recebe menos pelo seu veículo do que aquilo que está previsto na tabela FIPE.

O que isso tem a ver com a Lei de Execução Penal (LEP)? Tudo!
A LEP atua como a tabela FIPE da execução penal. O Estado nunca fornece os direitos de igual ou melhor forma que a prevista na LEP. O cumprimento é sempre abaixo do previsto, o que gera prejuízo sempre ao apenado, e nunca ao Estado. O apenado é uma espécie de vendedor do veículo na aplicação da LEP como se fosse uma tabela FIPE, pois sempre sairá no prejuízo.

Assim, em que pese o art. 112 da LEP preveja a progressão de regime após o cumprimento de um sexto da pena, dificilmente o apenado progredirá quando implementar esse requisito temporal. O direito sempre é deferido após o cumprimento de um sexto da pena e muitas semanas ou meses.

O art. 126 da LEP disciplina a remição da pena, por trabalho ou estudo. Ocorre que os estabelecimentos prisionais não oferecem vagas de trabalho, tampouco disponibilizam meios para que o apenado estude no interior do cárcere. Para piorar a situação, muitos juízes, julgando “de acordo com a consciência” e considerando requisitos subjetivos de difícil percepção, impedem que os apenados busquem trabalhem e/ou estudem no ambiente externo.

Outro grande exemplo da fipetização da LEP está no art. 117, que disciplina as hipóteses de possibilidade de recolhimento do beneficiário do regime aberto em residência particular. Apesar da clareza desse dispositivo legal, muitos Juízes interpretam o art. 117 como o máximo (a tabela FIPE) da hipótese de cumprimento domiciliar da pena. Significa que os Magistrados cobram outros requisitos não previstos nesse nítido dispositivo legal.

Nesse sentido, é comum ver Juízes que indeferem o cumprimento domiciliar da pena no caso do art. 117, I, da LEP, fundamentando na gravidade do crime. Outros negam a aplicação do art. 117, I, da LEP, com base no fato de que muitas outras mulheres que estão presas não estão usufruindo desse direito. Novamente, o que está na LEP é um direito que serve apenas de parâmetro, pois o cumprimento é sempre em um percentual muito menor (quantitativa e qualitativamente) que o previsto.

O art. 12 da LEP, que prevê a assistência material ao preso, funciona, da mesma forma, como o máximo que o Estado pode fazer pelo preso (provisório ou definitivo). O fornecimento da alimentação é o máximo. Temos outros graus de menor cumprimento, como o fornecimento de alimentação com a validade vencida, armazenada em condições indevidas ou, como em vários presídios, a disponibilização de água contaminada por fezes de pombos. Mas a LEP é apenas a tabela FIPE do fornecimento da alimentação ao preso…

E o art. 14 da LEP? Esse dispositivo prevê o atendimento médico, farmacêutico e odontológico. Contudo, quase nunca há atendimento no interior do cárcere. Os agentes penitenciários precisam levar os apenados ao hospital público, o que, em virtude do baixo efetivo de pessoal, pode demorar meses ou se tornar desnecessário em razão do falecimento do preso.

O art. 56 da LEP prevê recompensas ao apenado que apresentar bom comportamento. Em suma, são os elogios e as concessões de regalias. Entretanto, quantas vezes essas recompensas são concedidas aos apenados que comprovadamente – conforme o atestado de conduta carcerária – apresentam bom comportamento? Como é um direito, aplica-se a tabela FIPE da LEP. Por outro lado, quando o apenado pratica uma falta grave, rapidamente é instaurado o procedimento administrativo disciplinar, com o isolamento preventivo do apenado (art. 60 da LEP). Para o apenado, cumpre-se uma parte da tabela FIPE da LEP; contra o apenado, o máximo que a lei permite.

O art. 80 da LEP prevê que cada comarca terá um Conselho da Comunidade. Entretanto, faz-se uma leitura de “em cada comarca” como “no máximo em cada comarca”. Quantas comarcas no Brasil não têm Conselho da Comunidade? Aliás, quando o art. 66, IX, da LEP, prevê que o Juiz deve compor e instalar o Conselho da Comunidade, criando um dever para o Magistrado que atua na execução penal, muitos Juízes interpretam esse dispositivo legal como o máximo a que são obrigados (novamente a tabela FIPE). Preferem permanecer na indiferença, não frequentarem as reuniões do Conselho e, onde não há Conselho, deixar tudo como está.

Esses são apenas alguns dos exemplos de fipetização da Lei de Execução Penal. Para o apenado, a LEP não funciona como um catálogo de direitos e deveres, mas sim como um rol de deveres e um teto de direitos que poderão alcançar em situações excepcionalíssimas.

Obs.: no meu Tratado de Execução penal, vou abordar mais detalhadamente essa fipetização da Lei de Execução Penal.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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