STJ: o comportamento da vítima não pode agravar a pena por homicídio
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no AgRg no AREsp 1759537/PB, decidiu que o comportamento da vítima não pode ser utilizado para aumentar ou diminuir a pena-base.
De acordo com o STJ, “se não restar evidente a interferência da vítima no desdobramento causal (…) essa circunstância deve ser considerada neutra”.
Confira a ementa relacionada:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. DECISÃO AGRAVADA. INTEMPESTIVIDADE DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTOS. IMPUGNAÇÃO. AUSÊNCIA. SÚMULA N. 182 DO STJ. RECEBIMENTO DO RECURSO ESPECIAL COMO HABEAS CORPUS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL OU REGIMENTAL. ILEGALIDADES FLAGRANTES CONSTATADAS. CORREÇÃO POR ESTA CORTE SUPERIOR EM ATUAÇÃO SPONTE PROPRIA (ART. 654, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL). DOSIMETRIA. ART. 121, § 2.º, INCISO IV, DO CÓDIGO PENAL. CULPABILIDADE. CAPACIDADE DO AGENTE E CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE. ELEMENTOS DO TIPO PENAL. COMPORTAMENTO DA VÍTIMA. VALORAÇÃO EM DESFAVOR DO CONDENADO. DESCABIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE OFÍCIO.
1. O princípio da dialeticidade, positivado no art. 932, inciso III, do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 3.º do Código de Processo Penal, impõe ao recorrente o ônus de demonstrar o desacerto da decisão agravada, impugnando todos os fundamentos nela lançados para obstar sua pretensão.
2. No caso concreto, as razões do agravo regimental não refutaram as afirmações da decisão agravada, no sentido de que a suspensão dos prazos processuais prevista no art. 220 do Código de Processo Civil e regulamentada pela Resolução CNJ n. 244, de 19/09/2016, não era aplicável aos processos criminais, em razão do princípio da especialidade, bem assim de os prazos processuais penais seriam contínuos e peremptórios, por força do art. 798 do Código de Processo Penal. Na verdade, sequer mencionaram os fundamentos, os quais foram os alicerces utilizados para se concluir no sentido da intempestividade do agravo em recurso especial. Aplicação da Súmula n. 182 do Superior Tribunal de Justiça.
3. Não tem amparo legal ou regimental o pedido de que, caso se mantenha a decisão julgou intempestivo o agravo em recurso especial, seja o apelo nobre julgado, de ofício, como pedido de concessão de habeas corpus. Nos termos do art. 654, § 2.º, do Código de Processo Penal, o habeas corpus de ofício é deferido por iniciativa dos Tribunais quando detectarem ilegalidade flagrante. Não se presta como meio para que a Defesa obtenha pronunciamento judicial acerca do mérito de recurso que não ultrapassou os requisitos de admissibilidade.
4. Constatação da existência de ilegalidades flagrantes, a serem reparadas, sponte propria, por esta Corte Superior, e não por força de acolhimento de pedido ou recurso defensivo, nos termos do art. 654, § 2.º, do Código de Processo Penal.
5. A negativação do vetor referente à culpabilidade teve por fundamento o fato de que o Agravante, mesmo sendo capaz e consciente da ilicitude, teria optado por atentar contra a vida humana.
Entretanto, tais elementos são inerentes ao tipo penal doloso de homicídio, não autorizando a exasperação da pena-base.
6. É assente o entendimento de que “o comportamento da vítima é circunstância judicial ligada à vitimologia, que deve ser necessariamente neutra ou favorável ao réu, sendo descabida sua utilização para incrementar a pena-base. Com efeito, se não restar evidente a interferência da vítima no desdobramento causal, como ocorreu na hipótese em análise, essa circunstância deve ser considerada neutra” (HC 541.177/AC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 04/02/2020, DJe 12/02/2020).
7. Agravo regimental não conhecido. Indeferido o pedido de que o recurso especial seja recebido como habeas corpus (Petição n. 831592/2020). Habeas corpus concedido, de ofício, a fim de afastar a negativação da culpabilidade e do comportamento da vítima, ficando as penas redimensionadas nos termos do voto. (AgRg no AREsp 1759537/PB, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2020, DJe 18/12/2020)
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