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Evinis Talon

STF: a habitualidade delitiva revela reprovabilidade suficiente a afastar a aplicação do princípio da insignificância

05/05/2020

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Decisão proferida pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal no HC 133956 AgR, julgado em 21/06/2016 (leia a íntegra do acórdão).

Confira a ementa:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. DESCAMINHO. VALOR INFERIOR AO ESTIPULADO PELO ART. 20 DA LEI 10.522/2002. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. HABITUALIDADE DELITIVA. REPROVABILIDADE DA CONDUTA. 1. A pertinência do princípio da insignificância deve ser avaliada considerando os aspectos relevantes da conduta imputada. 2. A habitualidade delitiva revela reprovabilidade suficiente a afastar a aplicação do princípio da insignificância (ressalva de entendimento da Relatora). Precedentes. 3. Agravo regimental conhecido e não provido. (HC 133956 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 21/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 22-08-2016 PUBLIC 23-08-2016)

Leia a íntegra do voto da Relatora Min. Rosa Weber:

VOTO

A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Ao analisar o pedido inicial, neguei seguimento ao habeas corpus em decisão monocrática assim exarada:

“(…).

Extraio do ato dito coator:

“PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. REITERAÇÃO DELITIVA. INSIGNIFICÂNCIA. VETORES NÃO PREENCHIDOS.
1. Segundo a jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, tratando-se de criminoso habitual, ainda que o valor do tributo seja inferior ao patamar estipulado no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, deve ser afastada a aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho, previsto no art. 334 do Código Penal.
2. Na hipótese vertente, não há que se falar em reduzido grau de reprovabilidade no comportamento do agente, visto que o agravante registra a existência de procedimentos administrativos em seu desfavor, concernentes à prática do mesmo delito, o que configura a reiteração delitiva. Precedentes.
3. Agravo regimental desprovido.”

De início, registro que, no julgamento dos HC’s 123.108/MG, 123.533/SP e 123.734/MG, todos de relatoria do Ministro Roberto Barroso, o Plenário deste Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento de que a aplicação do princípio da insignificância deve ser feita caso a caso, envolvendo juízo mais abrangente do que a análise específica do resultado da conduta. Nesse contexto, “indispensável averiguar o significado social da ação, a adequação da conduta, a fim de que a finalidade da lei fosse alcançada”.

O presente habeas corpus diz com a aplicação ou não do princípio da insignificância ao crime de descaminho, em que o tributo elidido corresponde ao valor total de R$ 2.483,26 (dois mil, quatrocentos e oitenta e três reais e vinte e seis centavos), conforme apontado no acórdão exarado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Com efeito, para crimes de descaminho, a jurisprudência predominante deste STF, considerava, de início, para avaliação da insignificância, o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais), o mesmo previsto no art. 20 da Lei 10.522/2002, que determina o arquivamento de execuções fiscais de valor igual ou a ele inferior. Confira-se:

(…).

Como o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para o arquivamento de execuções fiscais estabelecido pela Lei 10.522/2002 foi majorado para R$ 20.000,00 (vinte mil reais) pelas Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda, este Supremo Tribunal Federal passou a considerá-lo para efeito de aplicação do princípio da insignificância. Da minha relatoria, colaciono julgado … (HC 120.438/SC, de minha relatoria, 1ª Turma, DJe 12.3.2014).

Nesse mesmo sentido: HC 118.067/RS, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 10.4.2014, HC 120.139/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma, DJe 31.3.2014 e HC 118.000/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, DJe 17.9.2013.

Na espécie, como enfatizei, a soma dos tributos não recolhidos perfaz a quantia de R$ 2.483,26 (dois mil, quatrocentos e oitenta e três reais e vinte e seis centavos), o que está a ensejar, porque supostamente não ultrapassado o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), o reconhecimento da atipicidade material do delito de descaminho, à luz do princípio da insignificância.

Por outro lado, aponta o ato dito coator que o paciente é “infrator contumaz e com personalidade voltada à prática delitiva, não há como aplicar ao caso o princípio da insignificância, sob pena de incentivar o descumprimento da norma legal”

Nesse contexto, a diretriz firmada pelo Plenário desta Suprema Corte, por ocasião do julgamento dos HC’s 123.108/MG, 123.533/SP e 123.734/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 1º.02.2016, é no sentido de que a reincidência ou a prática reiterada e contumaz de determinados delitos afasta a aplicação do princípio da bagatela.

Extraio do acórdão exarado no HC 123.108/MG:

“PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME DE FURTO SIMPLES. REINCIDÊNCIA.
1. A aplicação do princípio da insignificância envolve um juízo amplo (“conglobante”), que vai além da simples aferição do resultado material da conduta, abrangendo também a reincidência ou contumácia do agente, elementos que, embora não determinantes, devem ser considerados.
2. Por maioria, foram também acolhidas as seguintes teses: (i) a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto; e (ii) na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio da insignificância por furto, em situações em que tal enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do CP no caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade.
3. No caso concreto, a maioria entendeu por não aplicar o princípio da insignificância, reconhecendo, porém, a necessidade de abrandar o regime inicial de cumprimento da pena.
4. Ordem concedida de ofício, para alterar de semiaberto para aberto o regime inicial de cumprimento da pena imposta ao paciente.”

A despeito da minha visão diversa – se a insignificância afeta a chamada tipicidade material, vale dizer, implica atipicidade da conduta, antecedentes criminais, por maior gravidade que ostentem, não se mostram aptos a inibir a aplicação do princípio no caso concreto, uma vez pertinentes a categoria dogmática estranha à tipicidade –, acato, em atenção ao princípio da Colegialidade, a firme orientação do Plenário deste STF no que não admite a aplicação do princípio da bagatela em casos de habitualidade delitiva.

Ante o exposto, nego seguimento ao presente habeas corpus (art. 21, § 1º, do RISTF).”

Observo que, nas razões do agravo, o Agravante se limita a repisar os argumentos da exordial do habeas corpus, a atrair a regra do art. 317, § 1º, do RISTF (“A petição conterá, sob pena de rejeição liminar, as razões do pedido de reforma da decisão agravada”), o que impede por si só o provimento do recurso. Precedentes: AI-AgR 699.776/RS, Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe 19.9.2008 e o HC-AgR 97.742/PI, Min. Joaquim Barbosa, DJe 5.2.2010.

Neguei seguimento ao habeas forte na firme orientação do Plenário deste Supremo Tribunal Federal no que não admite a aplicação do princípio da bagatela nos casos de habitualidade delitiva, em jogo, no caso, o crime de descaminho.

O ato apontado como coator, exarado pelo Superior Tribunal de Justiça, ressaltou que “não há que se falar em reduzido grau de reprovabilidade no comportamento do agente, visto que o agravante registra a existência de procedimentos administrativos em seu desfavor, concernentes à prática do mesmo delito, o que configura a reiteração delitiva”.

Guarda, portanto, a decisão exarada pelo Superior Tribunal de Justiça estrita consonância com o entendimento sufragado pelo Plenário desta Suprema Corte, que, no julgamento dos HC’s 123.108/MG, 123.533/SP e 123.734/MG (DJe 1º.02.2016), assentou o entendimento de que a aplicação do princípio da insignificância deve ser feita caso a caso, envolvendo juízo mais abrangente do que a análise específica do resultado da conduta. Naquela oportunidade, a diretriz firmada pelo Plenário é no sentido de que a reincidência ou a prática reiterada e contumaz de determinados delitos afasta a aplicação do princípio da bagatela.

Repiso que a despeito da minha visão diversa – se a insignificância afeta a chamada tipicidade material, vale dizer, implica atipicidade da conduta, antecedentes criminais, por maior gravidade que ostentem, não se mostram aptos a inibir a aplicação do princípio no caso concreto, uma vez pertinentes a categoria dogmática estranha à tipicidade –, acato, em atenção ao princípio da Colegialidade, a firme orientação do Plenário deste STF no que não admite a aplicação do princípio da bagatela em casos de habitualidade delitiva.

Registro, ainda, em situação análoga à dos autos, o julgamento do HC 133.736-AgR/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 18.5.2016, assim ementado:

“Agravo regimental em habeas corpus. 2. Descaminho. 3. Princípio da insignificância. Incidência da Portaria n. 75/2012. Impossibilidade de aplicação. Reiteração delitiva. 4. Precedentes no sentido de afastar o princípio da insignificância a reincidentes ou de habitualidade delitiva comprovada. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. ”

Nessa linha, preconiza o parecer ministerial, “considerando que o ora agravante é infrator contumaz, aplica-se o entendimento dessa Corte no sentido de que a reiteração do delito de descaminho não viabiliza o reconhecimento da insignificância, independentemente de estar configurada a reincidência”.

Nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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