No RHC 81.451-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/8/2017, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que não é típica a conduta de inserir, em currículo Lattes, dado que não condiz com a realidade (clique aqui).
Informações do inteiro teor:
A plataforma Lattes é virtual e nela o usuário, mediante imposição do “login” e senha, insere as informações. Não se trata de um escrito palpável, ou seja, um papel do mundo real, mas de uma página em um sítio eletrônico.
Nesse sentido, embora possa existir “documento eletrônico”, não está ele presente no caso concreto, porquanto somente pode ser assim denominado aquele constante de página ou sítio na rede mundial de computadores que possa ter sua autenticidade aferida por assinatura digital.
A regulamentação que garante a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica se dá pela Medida Provisória n. 2.200-2, de 24 de agosto de 2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) e a responsabilidade por essa base é da Autarquia Federal, o ITI – Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, ligado à Presidência da República.
Reitere-se que, na hipótese, não se pode ter como documento o currículo inserido na plataforma virtual Lattes do CNPq, porque desprovido de assinatura digital e, pois, sem validade jurídica. Mas ainda que pudesse ser considerada a sua validade, para fins penais, tem-se que, como qualquer currículo, seja clássico (papel escrito) ou digital, o Currículo Lattes é passível de averiguação, ou seja, as informações nele contidas deverão ser objeto de aferição por quem nelas tem interesse, o que denota atipicidade.
Nesse sentido, a doutrina afirma que “havendo necessidade de comprovação – objetiva e concomitante -, pela autoridade, da autenticidade da declaração, não se configura o crime, caso ela seja falsa ou, de algum modo, dissociada da realidade”.
Confira a ementa do HC:
PROCESSUAL PENAL. INSERÇÃO DE DADO FALSO EM CURRÍCULO LATTES. FALSIDADE IDEOLÓGICA. ATIPICIDADE. OCORRÊNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PECULATO-FURTO POR OMISSÃO RELEVANTE. DESCRIÇÃO FÁTICA INSUFICIENTE. INÉPCIA DA DENÚNCIA.
1-Documento digital que pode ter a sua higidez aferida e, pois, produzir efeitos jurídicos, é aquele assinado digitalmente, conforme a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil).
2-O currículo inserido na página digital Lattes do CNPq não é assinado digitalmente, mas decorrente da inserção de dados, mediante imposição de login e senha, não ostentando, portanto, a qualidade de “documento digital” para fins penais.
3-Além disso, como qualquer currículo, material ou virtual, necessita ser averiguado por quem tem nele tem interesse, o que, consoante consagradas doutrina e jurisprudência, denota atipicidade na conduta do crime de falsidade ideológica.
4-A consumação do crime de peculato-furto por meio de omissão (crime comissivo por omissão) é excepcional e, como tal, há de constar na denúncia narrativa de como a atuação do recorrente ou, melhor, de como a sua falta de ação deu causa à figura do ilícito penal.
5-Descrição, na espécie, insuficiente que limita-se a fazer constar ser o recorrente Procurador-Geral da Universidade, o que, por óbvio, não é possível aceitar. Inépcia da incoativa.
6-Recurso provido para para trancar a ação penal quanto ao crime de falsidade ideológica, por falta de justa causa, ante a constatada atipicidade e para declarar nula a denúncia, por inépcia, no tocante ao crime de peculato, sem prejuízo de que outra peça acusatória seja apresentada com observância da lei processual penal.
(STJ, Sexta Turma, RHC 81.451/RJ, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, julgado em 22/08/2017)
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