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Evinis Talon

Dirigir sem habilitação (CNH) é crime? E se ocorrer um acidente?

28/07/2024

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Afinal, dirigir sem Permissão para Dirigir ou Habilitação é crime?

Inicialmente, devemos observar que o art. 309 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) define o seguinte crime:

Art. 309. Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano:

Penas – detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

Aparentemente, seria possível supor, pela primeira parte do artigo, que é crime dirigir sem CNH. Entretanto, existem vários pontos importantes que demonstram que a resposta não é tão simples.

Observa-se, em primeiro lugar, que o crime consiste em dirigir veículo automotor em via pública, ou seja, não é em qualquer local ou via, não abrangendo, por exemplo, o interior de um sítio.

Ademais, somente é crime se dirigir sem permissão ou habilitação e gerar perigo de dano, haja vista a parte final do art. 309 do CTB. Dessa forma, dirigir devagar, sem risco, mesmo que não tenha CNH, não é crime.

Nesse sentido, a jurisprudência:

APELAÇÃO CRIMINAL – DIRIGIR SEM HABILITAÇÃO – CRIME DE PERIGO CONCRETO – DELITO FORMAL – PERIGO DE DANO EVIDENCIADO. O crime previsto no art. 309 do CTB é delito formal e de perigo concreto, para sua configuração é necessário que o agente esteja conduzindo o veículo automotor de forma anormal, perigosa, trazendo potencialidade lesiva à incolumidade pública. (TJ-MG – APR: 10327180024876001 MG, Relator: Paulo Cézar Dias, Data de Julgamento: 30/07/2019, Data de Publicação: 09/08/2019)

E se, dirigindo sem CNH, o indivíduo se envolver em um um acidente? Esse fato é suficiente para compreender que se trata do crime descrito no art. 309 do CTB? Existe uma interessante decisão do TJRS no sentido de que não:

APELAÇÃO CRIME. DIRIGIR SEM HABILITAÇÃO. ART. 309, DO CTB. INSUFICIÊNCIA DO CONJUNTO PROBATÓRIO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA MANTIDA. Para a configuração do delito, é necessário que o acusado esteja trafegando de forma imprudente, em excesso de velocidade ou realizando manobras perigosas. No caso em questão, não há provas suficientes de que o réu gerou perigo de dano ao conduzir o veículo sem possuir habilitação para tanto, pois, muito embora tenha se envolvido em um acidente, não há nada que comprove ter ele dirigido sem a devida habilidade. Impositiva a absolvição do réu. RECURSO IMPROVIDO. (TJ-RS – RC: 71008626772 RS, Relator: Luis Gustavo Zanella Piccinin, Data de Julgamento: 08/07/2019, Turma Recursal Criminal, Data de Publicação: 24/07/2019)

Por outro lado, o TJDFT já considerou a colisão com outros veículos um elemento para configurar o dano concreto e, por conseguinte, o crime do art. 309 do CTB:

APELAÇÃO CRIMINAL. DELITO DE TRÂNSITO. DIRIGIR VEÍCULO AUTOMOTOR, EM VIA PÚBLICA, SEM A DEVIDA PERMISSÃO PARA DIRIGIR OU HABILITAÇÃO (ARTIGO 309 DA LEI Nº 9.503/1997). AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DANO CONCRETO VERIFICADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Comprovado que o réu conduziu veículo sem habilitação e, conquanto não seja necessária a existência de dano concreto para a caracterização do crime previsto no artigo 309, da Lei de Trânsito, mas, sim, da possibilidade de causar dano concreto às vítimas e à coletividade, ante a direção de veículo automotor por condutor não habilitado, deve ser mantida a condenação, sobretudo no caso, em que verificado dano concreto, em face da colisão com outros veículos. 2. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF 07063918120218070014 1703874, Relator: DEMETRIUS GOMES CAVALCANTI, Data de Julgamento: 18/05/2023, 3ª Turma Criminal, Data de Publicação: 30/05/2023)

Quanto ao perigo de dano concreto, diferentemente ocorre em relação ao art. 310 do CTB, que diz:

Art. 310. Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança:

Penas – detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou a seguinte tese no recurso repetitivo 901:

É de perigo abstrato o crime previsto no art. 310 do Código de Trânsito Brasileiro. Assim, não é exigível, para o aperfeiçoamento do crime, a ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na conduta de quem permite, confia ou entrega a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou ainda a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança.

Também foi aprovada, em 2016, a súmula 575 do STJ, que diz: “Constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art. 310 do CTB, independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo.”

Em outras palavras, temos as seguintes conclusões:

– Dirigir sem CNH não é crime, salvo se for em via pública e gerando perigo de dano.

– É crime permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, mesmo que não ocorra lesão ou perigo de dano concreto, pois se trata de crime de perigo abstrato.

Por fim, vale destacar a súmula 664 do STJ: “É inaplicável a consunção entre o delito de embriaguez ao volante e o de condução de veículo automotor sem habilitação.”

Basicamente, significa que, se uma pessoa dirigir embriagada e não tiver habilitação, responderá pelos dois crimes, e não apenas por um deles, haja vista que o princípio da consunção não se aplica nesse caso.

Da mesma forma, o TJSP já decidiu que não há consunção entre os crimes de dirigir sem habilitação e desobediência em virtude de fuga da abordagem policial. Assim, responderia pelos dois crimes:

(…) Com relação ao crime de desobediência, réu que confessou que fugiu da abordagem policial. Da mesma forma, crime de dirigir sem habilitação, gerando perigo de dano configurado. Crimes autônomos, que tutelam bens distintos com prática e consumação em momentos distintos. Penas fixadas no mínimo. Impossível a substituição da reprimenda corporal por restritiva de direitos, pelo fato de já ter sido condenado pelo crime de roubo. Sentença reformada. Recurso provido. (TJ-SP – APR: 00220492620168260050 São Paulo, Relator: Andrade Sampaio, Data de Julgamento: 09/10/2018, 9ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 11/10/2018)

12 teses do STJ sobre Crimes de Trânsito

É atípica a conduta contida no art. 307 do CTB quando a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor advém de restrição administrativa (Informativo 641 do STJ)

 

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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