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Evinis Talon

Carta aos novos Advogados e Advogadas

22/06/2017

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Carta aos novos Advogados e Advogadas

Você venceu! Superou as estatísticas que demonstram um alto índice de reprovação e foi contra a pretensão daquele colega de faculdade que sempre perguntava as suas notas nas provas, desejando, silenciosamente, que as dele fossem superiores às suas. Acredite: por mais legal que você pareça, havia alguém torcendo contra você.

Provavelmente, você perdeu noites de sono estudando e outras noites aguardando a nota. Investiu bastante em livros e/ou cursos, perdeu momentos de convivência com a sua família e, eventualmente, sofreu com alguma reprovação anterior.

Assim, em primeiro lugar, parabéns pela aprovação no exame da Ordem dos Advogados!

Valorize sua vitória e comemore muito, porque você merece. Aliás, não publiquei este texto no dia da divulgação de sua nota, porquanto não queria preocupá-lo com algumas das coisas que abordarei adiante.

Durante algum tempo, optei por não comemorar vitórias. Pensava que “cumprir obrigações” não era algo que merecia comemoração. Assim, por exemplo, deixei de participar da minha formatura na graduação, pois pensava que quem ingressa num curso tem a obrigação de conclui-lo.

Todavia, num determinado ano, quando eu já era professor de um curso de graduação em Direito, o governo federal mudou as regras do FIES. Metade dos meus alunos trancaram a matrícula. Percebi ali que a conclusão de qualquer etapa merece ser comemorada, porque perdemos muito – e muitos – no caminho.

Depois, com mais maturidade e sofrendo alguns golpes da vida, percebi que cada momento feliz deve ser extremamente comemorado. A lembrança mais forte que eu tenho do meu falecido irmão é justamente um churrasco de comemoração que fizemos após minha aprovação no concurso para Defensor Público.

Então, repito: comemore! No futuro, você precisará das lembranças dessa comemoração durante os momentos difíceis.

Enquanto você comemora, outros colegas permanecem calados, pois não passaram no exame da OAB. Estão questionando se não possuem conhecimento e se algum dia passarão. Talvez estejam com dificuldades financeiras e esperavam a aprovação no exame para, finalmente, começarem a trabalhar.

Aqui começa o seu múnus como Advogado(a).

Você precisa dizer a eles que marcar X e elaborar respostas de questões dissertativas não produzem sucesso profissional. Que nada está perdido, pois uma prova é apenas uma prova. Ela não define o que somos, tampouco o que sabemos.

No último exame da OAB, vi respostas das provas dissertativas que possuíam mais complexidade que o gabarito utilizado pelos examinadores. E esses candidatos foram reprovados. Inseriram respostas mais completas, profundas e detalhadas que aquelas previstas nos espelhos de correção, trataram de questões (especialmente nulidades) que nem passaram pela mente dos examinadores, mas não foram aprovados, porque “pensar além” não gera pontuação.

Nessa situação, a injustiça se soma à tristeza pela reprovação. Ainda assim, ainda há muito caminho pela frente.

Aqui vai um segredo (não conte para ninguém): a minha pior nota durante a graduação foi em Direito Penal, disciplina que hoje leciono em vários cursos de pós-graduação e sobre a qual já publiquei três livros em 2017.

Dessa forma, deixo a pergunta: se alguém foi reprovado no exame da OAB, o que impede que essa pessoa se torne um(a) grande Advogado(a)? A minha resposta: nada impede!

Ultrapassado o desafio do exame da OAB, é possível afirmar: os verdadeiros desafios começam agora!

Como Advogado(a), você será um incômodo para muitos.

Alguns Juízes e Promotores entenderão que você apenas pretende atrapalhar os andamentos dos processos. Para muitos deles, um processo é apenas um amontoado de folhas. A convivência deles com as partes se limita aos poucos minutos de audiência. Você, por outro lado, receberá ligações de madrugada, nos feriados e no final de semana. Nessas ligações, você ouvirá, por exemplo, mães desesperadas em razão da prisão do filho, doentes (ou seus parentes) que precisam postular judicialmente um medicamento ou a internação em UTI para que tenham alguma chance de permanecerem vivos e vítimas de violência doméstica que se consideram sem saída. Todavia, para alguns, tudo isso continua sendo um monte de folhas A4…

Para alguns Advogados mais antigos na atividade, ora você será considerado um adversário que não pode ter espaço no mercado, ora um sujeito inexperiente que nem merece atenção.

Não se assuste se você for preterido e humilhado. Quase ninguém gosta de Advogados.

Tem-se notícia, por exemplo, de um evento sobre investigação criminal que será realizado com muitas autoridades (Juízes, Promotores, Delegados etc.), mas sem Advogados(as) entre as duas dezenas de palestrantes. Portanto, somos tolerados apenas quando a lei exige (e olhe lá!).

Para não ser apenas o mensageiro das notícias ruins, deixo alguns conselhos nesse início de jornada.

Seja ético acima de tudo. Felizmente, a ética ainda vale mais que ter um parente na área jurídica.

Não se acomode. É decepcionante ver colegas que, após um sucesso em algum período da carreira, decaem vertiginosamente, acreditando que os méritos passados ainda fazem parte do presente.

Não tenha medo de pedir ajuda. No Direito – especialmente na área criminal, que tutela a liberdade –, é preferível “se humilhar” perante um colega a correr o risco de perder noites de sono em razão de uma atuação desidiosa num processo.

Não seja capacho de ninguém. Você é tão Advogado quanto aquele que advoga há décadas. Se um Advogado mais experiente – lembrando que idade não significa experiência na Advocacia, mas apenas tempo de vida – tiver a ousadia de solicitar que você faça alguma audiência ou “abrace um processo” – sempre odiei essa expressão –, decline desse favor. Diga o valor dos honorários que você cobrará por esse “pretenso favor” e aguarde a resposta. Tenho o hábito de dizer que não se presta um favor por meio daquilo que fazemos para sobreviver. Daí porque tirar dúvidas também é consulta, passível de cobrança de honorários.

Tenha sentimento de pertencimento a tudo que a Advocacia representa. A Advocacia é muito mais que prestar serviços em troca de honorários. Você agora faz parte de uma classe que tem um papel fundamental no Estado Democrático de Direito. Lute pela Advocacia e pelo direito de defesa tanto quanto você luta pelos direitos de seus clientes.

Se você deseja continuar na Advocacia, boa sorte! Caso pretenda permanecer na Advocacia apenas pelo tempo necessário para ser aprovado em um concurso público, boa sorte também! As duas opções são excelentes, desde que, de fato, sejam opções, e não apenas pressão de terceiros para que você escolha o futuro aparentemente mais seguro e cômodo. Não siga a boiada, pois, ao final, sabemos que o matadouro é o destino de todos, dividindo espaço com – e cometendo um – papelão (perdão pela piada, mas a carne é fraca).

Que comecem os jogos.

Inverno gaúcho de 2017.

Evinis Talon, seu colega de Advocacia.

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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