Na edição dessa semana da Pesquisa Pronta do Superior Tribunal de Justiça, a Quinta Turma do STJ decidiu que não há consunção entre dois crimes em que os bens jurídicos tutelados são distintos (REsp 1.856.202).
Confira a ementa:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DELITOS DOS ARTS. 29, § 1º, III, DA LEI 9.605/98 E 296, § 1º, III, DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICABILIDADE, IN CASU. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE ENTRE OS BENS JURÍDICOS TUTELADOS PELOS ILÍCITOS. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. O acórdão regional está em harmonia com o entendimento desta Corte Superior de Justiça, no sentido de que não há consunção entre dois crimes em que os bens jurídicos tutelados são distintos.
2. No caso em tela, os tipos penais dos arts. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 e 296, § 1º, III, do código penal tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1856202/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 28/02/2020)
Leia a íntegra do voto do Relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca (acesse a íntegra do acórdão):
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA (Relator):
O agravo regimental não merece acolhimento.
Dessume-se das razões recursais que o agravante não trouxe elementos suficientes para infirmar a decisão agravada, que, de fato, apresentou a solução que melhor espelha a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria.
Portanto, nenhuma censura merece o decisório ora recorrido, que deve ser mantido pelos seus próprios e jurídicos fundamentos, in verbis (e-STJ fls. 364/367):
No que se refere à aplicação do princípio da consunção, o Tribunal Regional de 3ª Região assim se pronunciou:
A despeito da posição adotada pela magistrada sentenciante às fls. 118v-l 19 da r. sentença e em consonância com o apelo ministerial neste ponto, não há de se falar em conflito aparente de normas entre os tipos penais descritos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (uso indevido de anilhas do IBAMA falsificadas por adulteração) e no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente), a resultar em equivocada absorção do primeiro (suposto delito-meio) pelo segundo (pretenso delito-fim), sendo de rigor o seu afastamento.
Cumpre observar que os tipos penais em epígrafe tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção (g.n.): (e-STJ fl. 217 – grifo nosso)
Observa-se que o entendimento do Tribunal de origem está em harmonia com a jurisprudência desta Corte firme no sentido de que não há consunção entre dois crimes em que os bens jurídicos tutelados são distintos. A propósito: AgRg no AREsp n. 1035520/PA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe 28/6/2018 e RECURSO ESPECIAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 29, DA LEI N. 9.605/1998 e REsp n. 1745308/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, DJe 14/5/2019, esse assim ementado:
CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 299 DO CP. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. CASO CONCRETO. IMPOSSIBILIDADE. CONDUTAS AUTÔNOMAS SEM QUALQUER RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO ENTRE SI. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A manutenção em cativeiro de pássaros da fauna silvestre brasileira ameaçados de extinção em desacordo com a licença obtida constitui conduta delituosa prevista no art. 29 da Lei n. 9.605/1998. 2. A inserção de informação diversa da que deveria constar no registro para constituição da empresa “Criatório Soberano”, bem como em vários outros documentos amolda-se ao tipo penal previsto no art. 299 do Código Penal. 3. Impossibilidade de absorção do crime de falsidade ideológica pelo crime ambiental, em face da autonomia das condutas, praticadas de forma distinta e em períodos diversos. 4. Recurso especial provido para reformar a sentença de primeiro grau e condenar os réus pelo crime do art. 299 do Código Penal, com retorno do autos ao juiz de primeiro grau com o fim de aplicação da pena. Além disso, a alteração da conclusão a que chegou o TRF/3ª Região acerca da autonomia entre as condutas depende de nova incursão no acervo fático-probatório dos autos, providência inviável na estreita via do recurso especial, a teor da Súmula n. 7 desta Corte. Nessa linha: AgRg no AREsp n. 1545504/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, DJe 12/12/2019. A verificação do dolo na conduta também atrai o óbice do Enunciado n. 7 da Súmula desta Corte. […]
Com essas considerações, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
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