STJ: o dolo eventual permite o concurso formal impróprio
No AgRg no REsp 2.052.416-SC, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que “o dolo eventual é compatível com o reconhecimento de desígnios autônomos, justificando a aplicação do concurso formal impróprio”.
Informações do inteiro teor:
A questão em discussão consiste em saber se a prática de dois homicídios com dolo eventual configura concurso formal impróprio.
O Tribunal de origem aplicou a regra do concurso formal próprio entre os crimes de homicídio praticados pelo sentenciado, sob o fundamento de que “não se pode, por completa ausência de prova nesse sentido, afirmar que ele tinha desígnio autônomo com relação à cada uma das vítimas que acabou atingindo”. Na hipótese, embora a Corte a quo tenha reconhecido a possibilidade de se aferir desígnios autônomos mesmo nas condutas movidas por dolo eventual, concluiu que não foi comprovado que o acusado tinha assentido com a produção de cada resultado individualmente.
Contudo, no caso, o Conselho de Sentença reconheceu, de forma expressa, a prática de dois homicídios dolosos, ao responder afirmativamente aos quesitos relativos à existência de dolo eventual em relação a cada uma das vítimas fatais. Tal conclusão revela que o agente, ao praticar a conduta, previu como possíveis os resultados de morte e, ainda assim, assumiu o risco de produzi-los, nos termos do art. 18, inciso I, segunda parte, do Código Penal.
Quanto ao assunto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, quando o agente, ainda que mediante uma única conduta, anui com a produção de múltiplos resultados, revela-se caracterizada a existência de desígnios autônomos, o que impõe o reconhecimento do concurso formal impróprio.
Nesse sentido, conforme assentado no julgamento do HC 191.490/RJ, “A expressão ‘desígnios autônomos’ refere-se a qualquer forma de dolo, seja ele direto ou eventual. Vale dizer, o dolo eventual também representa o endereçamento da vontade do agente, pois ele, embora vislumbrando a possibilidade de ocorrência de um segundo resultado, não o desejando diretamente, mas admitindo-o, aceita-o” (Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 9/10/2012).
Dessa forma, partindo da moldura fática fixada pelo Tribunal do Júri – que reconheceu a prática de dois homicídios dolosos, ambos por dolo eventual -, impõe-se, por consequência lógica e jurídica, a aplicação da regra do concurso formal impróprio, nos termos do art. 70, caput, parte final, do Código Penal. Isso porque, ao admitir e aceitar os dois resultados letais, ainda que decorrentes de uma só conduta, o agente evidenciou a existência de desígnios autônomos, afastando a possibilidade de incidência da forma benéfica do concurso formal próprio.
Portanto, a aplicação do concurso formal impróprio revela-se não apenas adequada, mas necessária à correta individualização da pena, em consonância com o que restou soberanamente decidido pelo Tribunal do Júri e com a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS:
Legislação
Código Penal (CP), art. 18, I e art. 70
Falo mais sobre esse assunto no Curso Talon. Clique aqui para saber mais.
Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – Edição nº 860, de 02 de setembro de 2025 (leia aqui).
Leia também:
STJ: recusa pacífica de alimento pelo detento não gera falta grave (Informativo 792)
STJ: posse e distribuição de pornografia infantil são crimes autônomos