STJ: é nula a quebra de sigilo fiscal que não demonstra o fumus commissi delicti
No HC 598.051-SP, julgado em 02/03/2021, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é nula a quebra de sigilo fiscal que não demonstra o fumus commissi delicti, mas, ao contrário, busca colher mínimos elementos necessários à investigação.
Informações do inteiro teor:
Segundo a doutrina, o processo penal já configura, em si mesmo, uma pena para o réu. Os rigores da persecução penal são deveras estigmatizantes, daí a necessidade de cuidado no seu trato. Desde que se optou por um modelo de Estado de cariz democrático, em que se assinala a dignidade da pessoa humana como seu fundamento, toda intervenção na esfera íntima do cidadão deve ser encarada como exceção. Somente se justifica tal procedimento em caso de necessidade e atendendo-se aos requisitos legais, faticamente demonstrados.
No caso, cuida-se de procedimento investigatório criminal em curso no Ministério Público Federal para elucidação de crime de evasão de divisas, perpetrado por meio de contas CC-5. O requerimento ministerial (decretação de quebra de sigilo fiscal com o fim de colher mínimos elementos necessários à investigação) e a decisão que determinou a quebra de sigilo fiscal dos investigados carecem de fundamentação.
A decisão de quebra do sigilo fiscal não se lastreou nos requisitos de cautelaridade. O acórdão do habeas corpus impetrado perante o TRF também foi proferido com argumentos vagos, sem amparo em dados fáticos que pudessem dar azo a procedimento tão drástico, com a invasão da intimidade do cidadão.
Não se pode aceitar também o argumento constante do parecer do Ministério Público Federal de que “não há outra linha de investigação possível”. Fosse assim, as portas estariam abertas para o poder estatal devassar a intimidade de todos, sem peias. Deve-se partir do fato para se alcançar a autoria. Não se admite investigar a vida dos cidadãos para, a depender da sorte, encontrar algum crime.
Sobre o tema, este Superior Tribunal é extremamente rigoroso na preservação dos direitos e garantias fundamentais ao afirmar que “O direito aos sigilos bancário e fiscal não configura direito absoluto, podendo ser elidido se presentes indícios ou provas que o justifiquem, desde que devidamente demonstrados na decisão do Magistrado. Decisão, in casu, sem fundamentação, em flagrante violação ao art. 93, inciso IX, da Constituição Federal.” (HC 17.911 / SP – Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, DJ 4.3.2002).
Portanto, a quebra violou o comando constitucional de motivação das decisões judiciais, conforme dispõe o art. 93, IX, da Constituição Federal. A disciplina sobre as informações fiscais é clara: em princípio, o acesso é vedado; salvo, se concorrem os requisitos próprios de cautelaridade. Não foi declinado o fumus commissi delicti, pelo contrário, decretou-se a quebra a fim de buscá-lo. Não se delineou qual teria sido a suposta conduta de cada um dos pacientes, de forma a legitimar a medida extrema.
Por fim, registre-se, se ao longo das investigações surgirem elementos a corporificar o fumus commissi delicti e indícios de autoria, aí sim, também a depender de acurada fundamentação, será possível efetivar-se a medida constritiva.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS:
LEGISLAÇÃO
Constituição Federal (CF), art. 93, IX
Quer saber mais sobre esse assunto? Conheça aqui todos os meus cursos.
Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – Edição extraordinária nº 17 – veja aqui.
Leia também:
STJ: é nula intimação em nome de advogado que não atua mais no feito