Notícia publicada no site do Senado Federal no dia 25 de julho de 2019 (leia aqui).
Um projeto de lei que está em tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado dá às comissões parlamentares de inquérito (CPI) o poder de celebrar a colaboração premiada. O PL 4.137/2019, de autoria do senador Jorge Kajuru (PSB-GO), altera a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850, de 2013) para adicionar as CPIs como outro agente da negociação com o delator, papel que hoje é realizado apenas pelos delegados de polícia e pelo Ministério Público.
A atual legislação define que o juiz pode conceder perdão judicial ou reduzir a sentença de réus que contribuírem voluntariamente para a investigação. Por isso, por meio de delações premiadas foi possível conseguir uma maior colaboração dos acusados, que passaram a delatar coautores e dar informações relevantes para a polícia e para o Ministério Público. A prática é muito utilizada em grandes investigações como a Lava Jato, que já conta com mais de 20 acordos de delação.
Segundo Kajuru, devido à capacidade de investigação criminal das CPIs, é importante que elas possam também utilizar esse recurso.
“As CPIs produzem, assim como a polícia, um inquérito, em que podem sugerir indiciamentos ao MP. É comum o compartilhamento de provas entre a polícia, MP e CPIs, com o fim de tornar investigações mais eficientes. Muitas vezes o MP se vale de CPIs para ter acesso a sigilos bancários, fiscais ou telefônicos, uma vez que CPIs têm poder para quebrá-los. O Brasil só tem a ganhar com essa alteração”, explica o senador na justificativa do projeto.
O texto ressalta que a medida será um avanço, pois os delatores podem preferir conversar com parlamentares em vez de falar ao Ministério Público ou a delegados. Também lembra que as CPIs podem ter acesso a informações que facilitem a criação de acordos entre as partes. A utilização desse recurso jurídico por parte do Congresso reforçaria, então, o caráter fiscalizador do Parlamento.
O PL ainda aguarda a apresentação de emendas na CCJ. Se aprovado, será enviado à Câmara dos Deputados.
Deste modo, a Lei nº 12.850/2013 passa a viger com as seguintes alterações:
“Art. 4º (…)
§2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, e comissão parlamentar de inquérito, ambos com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). (…)
§6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor, ou entre o colegiado de comissão parlamentar de inquérito, o investigado ou acusado e seu defensor, com a manifestação do Ministério Público. (…)
§9º Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público, pelo delegado de polícia responsável pelas investigações ou por comissão parlamentar de inquérito que investiga o fato. (…)
“Art. 6º (…)
II – as condições da proposta do Ministério Público, do delegado de polícia ou da comissão parlamentar de inquérito; (…) (NR)
“Art. 7º (…)
§4º O juiz decidirá sobre o acesso aos autos de membros de comissão parlamentar de inquérito.” (NR)
Justificação (leia a íntegra do Projeto):
Obs.: o texto abaixo foi retirado do Projeto de Lei. Não foi escrito pelo Prof. Evinis Talon.
As colaborações premiadas foram um avanço inegável no ordenamento jurídico brasileiro. Graças a elas foi possível mudar os incentivos para que investigados e acusados delatassem coautores e partícipes, oferecessem informações sobre o crime, produto ou proveito auferidos, bem como sobre a eventual localização de vítimas.
Agentes com capacidade de investigação criminal podem ser os negociadores de tais acordos: o delegado de polícia e o Ministério Público (MP). O juiz não interfere e os homologa. Há, contudo, outro ator com capacidade de investigação criminal em nosso ordenamento jurídico: as comissões parlamentares de inquérito (CPI). Produzem, assim como a polícia, um inquérito, em que podem sugerir indiciamentos ao MP. É comum o compartilhamento de provas entre a polícia, MP e CPIs, com o fim de tornar investigações mais eficientes. Muitas vezes o MP se vale de CPIs para ter acesso a sigilos bancários, fiscais ou telefônicos, uma vez que CPIs têm poder para quebrá-los, pois composta de agentes como poderes de investigação próprios das autoridades judiciais (art. 58, § 3º da Constituição).
O Brasil só tem a ganhar com essa alteração. O investigado ou acusado pode ter interesse em conversar com parlamentares, e não com a polícia ou o MP. A CPI pode vir a ter acesso a informações que levem a uma proposta mais vantajosa de acordo para ambos os lados. Investigados ou acusados, assim, poderão deixar de usar reiteradamente habeas corpus para permanecerem calados perante colegiados parlamentares. Haverá incentivos para o comparecimento. Seria mais uma instância de investigação com a qual seria possível celebrar acordos e reduzir penas. Em todo o caso, deve haver manifestação do MP.
Outro efeito colateral positivo será tornar as CPIs mais técnicas e menos políticas. Por exemplo, acordos de delação premiada demandam sigilo. É direito do colaborador previsto em lei. Isso dá mais legitimidade e seriedade a essa função fiscalizatória fundamental do Parlamento. Se, por outro lado, tal função não for bem usada, e as CPIs explorem publicamente colaboradores e outras pessoas envolvidas – o que constitui crime na Lei nº 12.850, de 2013 –, o instituto tenderá a cair em desuso, pois não haverá incentivos de quem quer que seja para celebrar acordos dessa natureza no futuro. O acordo de colaboração demanda a concordância da defesa em todos seus termos.
Estamos convencidos de que se trata de um grande avanço em nossa legislação, para o qual solicitamos o apoio dos colegas Parlamentares.
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