Pena restritiva de direitos: falta grave e conversão
Inicialmente, observa-se que as faltas leves e médias – assim como as respectivas sanções – são especificadas pela legislação local, conforme o art. 49 da Lei de Execução Penal. O poder disciplinar será exercido pela autoridade administrativa (art. 47 da LEP), não havendo previsão legal da necessidade de remessa ao Juiz.
Por outro lado, em relação às faltas graves, inclusive em caso de pena restritiva de direitos, o administrador do estabelecimento prisional deve representar ao Juiz da execução penal, conforme o art. 48, parágrafo único, da LEP: “Nas faltas graves, a autoridade representará ao Juiz da execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, §§ 1º, letra d, e 2º desta Lei.”
Salienta-se que o parágrafo único do art. 57 da LEP dispõe que às faltas graves serão aplicadas as sanções previstas no art. 53, III a V, da LEP, dentre elas o isolamento na própria cela ou em local adequado e a inclusão em regime diferenciado.
No que concerne à conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade, prevê o art. 181, §§ 1º, alínea “d”, 2º e 3º, da LEP:
Art. 181. A pena restritiva de direitos será convertida em privativa de liberdade nas hipóteses e na forma do artigo 45 e seus incisos do Código Penal.
§ 1º A pena de prestação de serviços à comunidade será convertida quando o condenado:
a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido, ou desatender a intimação por edital;
b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que deva prestar serviço;
c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe foi imposto;
d) praticar falta grave;
e) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa.
§ 2º A pena de limitação de fim de semana será convertida quando o condenado não comparecer ao estabelecimento designado para o cumprimento da pena, recusar-se a exercer a atividade determinada pelo Juiz ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras “a”, “d” e “e” do parágrafo anterior.
§ 3º A pena de interdição temporária de direitos será convertida quando o condenado exercer, injustificadamente, o direito interditado ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras “a” e “e”, do § 1º, deste artigo.
Resumindo todas as hipóteses anteriores, o art. 44, §4º, do Código Penal, menciona que a pena restritiva de direitos será convertida em pena privativa de liberdade quando houver o seu descumprimento injustificado.
Assim, se é fixada uma pena de prestação de serviços à comunidade, caso o apenado não compareça para iniciar o serviço ou, comparecendo, negue-se a prestá-lo, é cabível a conversão em pena privativa de liberdade, desde que se constate que tais condutas foram injustificadas. Logo, se não comparecer em razão de uma internação médica, por exemplo, a conduta será justificável, não podendo ocorrer a conversão.
Ainda, é importante mencionar que as hipóteses de faltas graves nas penas restritivas de direitos estão elencadas no art. 51 da LEP:
Art. 51. Comete falta grave o condenado à pena restritiva de direitos que:
I – descumprir, injustificadamente, a restrição imposta;
II – retardar, injustificadamente, o cumprimento da obrigação imposta;
III – inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.
Da mesma forma, considera-se falta grave a prática de fato definido como crime doloso (art. 52, caput, primeira parte, da LEP). Como a lei não faz distinção, entende-se que tal dispositivo é aplicável tanto aos condenados a uma pena privativa de liberdade como aos que cumprem pena restritiva de direitos, ainda que seja necessário compatibilizar, no caso da prestação de serviços à comunidade, com o art. 181, §1º, “e”, da LEP, que prevê a conversão quando ocorrer a condenação (e não apenas pela prática do crime, como afirma o art. 52 da LEP).
Uma indagação que poderia surgir seria a seguinte: poderia o juízo da execução penal determinar ao condenado uma pena mais gravosa do que aquela que lhe foi imposta na sentença condenatória? Noutras palavras, se a sentença determinou o cumprimento de pena restritiva de direitos, poderia o Juiz da execução penal, em caso de falta grave, convertê-la em pena privativa de liberdade? Haveria ofensa à coisa julgada?
Sobre esse tema, duas decisões do Tribunal de Justiça de Minas Gerais apontam o entendimento pacífico da jurisprudência, que é no sentido da possibilidade de conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade:
[…] O descumprimento injustificado da pena restritiva de direitos imposta ao agravante, enseja na conversão desta em privativa de liberdade, nos termos do artigo 44, § 4º do CP e artigo 181, § 1º, D da LEP. (TJ/MG, Primeira Câmara Criminal, Agravo em Execução Penal 1.0024.16.007343-3/001, Rel. Des. Edison Feital Leite, julgado em 03/04/2018)
[…] Tendo o reeducando praticado novo crime durante o cumprimento da pena restritiva de direitos consistente na prestação de serviços à comunidade, impõe-se a conversão da sanção substitutiva em reprimenda privativa de liberdade, nos termos do art. 181, § 1º, alínea “e”, c/c o art. 52, caput, ambos da Lei de Execução Penal. […] (TJ/MG, Sexta Câmara Criminal, Agravo em Execução Penal 1.0231.13.026340-4/001, Rel. Des. Rubens Gabriel Soares, julgado em 06/02/2018)
Nesse caso, entendo que não há violação à coisa julgada quando o Juiz da execução penal converte a pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade, diante da prática de alguma falta grave. A questão é simples: na sentença, o Magistrado não fixa diretamente uma pena restritiva de direitos, mas sim uma pena privativa de liberdade (inclusive definindo o regime inicial), substituindo-a, condicionalmente, por pena(s) restritiva(s) de direitos. Logo, não haveria ofensa à coisa julgada em caso de conversão em pena privativa de liberdade.
Por derradeiro, seria possível indagar se o reconhecimento de falta grave (com as consequências legais) na pena restritiva de direito seria uma metapunição (punição dentro de uma punição). Sobre esse tema, escrevi um texto anteriormente (clique aqui).
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