Tive sorte ao fracassar nos meus primeiros meses de Advocacia. Calma! Você não leu errado. Realmente foi sorte.
Logo após pedir exoneração do cargo de Defensor Público, resolvi desistir do concurso de Juiz do Distrito Federal, mesmo tendo sido aprovado na primeira fase em uma excelente colocação. Simplesmente não fui fazer as outras fases do certame.
O fato de ter feito a primeira fase do concurso da Magistratura em Brasília algumas semanas antes de pedir exoneração me fez refletir sobre muitas coisas. Percebi que Brasília é o lugar que tem a concorrência mais feroz para quem deseja ingressar na Advocacia. Por esse motivo, querendo ver o pior cenário possível para um iniciante, decidi me mudar para Brasília, morando lá por exatamente um ano.
Além de ter uma grande quantidade de Advogados, há um mercado extremamente qualificado. Muitos são ex-Ministros de algum Tribunal ou aposentados em alguma carreira jurídica.
Lembro-me de ter feito uma reunião em um escritório de Brasília para oferecer uma parceria. O sócio desse escritório me disse: “vamos conversar sim. Estamos sempre abertos para novas parcerias. Fulano de tal (ex-Ministro do STF) estava aqui ontem para fecharmos uma parceria muito interessante”. Em suma, percebi que seria difícil me destacar em um ambiente de profissionais com marcas consolidadas.
Fui para Brasília conhecendo apenas uma pessoa. Trata-se de um dos grandes Advogados da cidade, chamado Wilfrido Nunes, que tive o prazer de conhecer durante um jantar em Gramado (onde moro atualmente). Poucas semanas antes de me mudar para Brasília, o Dr. Wilfrido me deu vários conselhos. Morando em Brasília, tive a honra de encontrá-lo várias vezes e aprender mais em trinta minutos de conversa do que em cinco anos de graduação.
Fiquei um mês inteiro preparando a abertura do escritório, que era no Edifício Terra Brasilis, ao lado da Catedral e perto dos Ministérios. Tive muitas preocupações tolas, como a escolha de papel de parede, máquina de café, tapetes etc. Por que foram preocupações tolas? Simplesmente porque essas coisas não trazem clientes.
Na primeira semana, fiquei empolgado. Apesar do trânsito para ir do local em que morava (SMPW) até o escritório, estava animado para acordar terrivelmente cedo, passar o dia inteiro no escritório e voltar para casa muito tempo depois do horário comercial.
No primeiro dia, o telefone não tocou. Ninguém bateu na porta. A sala ficava longe do térreo, precisamente no quarto andar. Seria impossível alguém “estar passando na frente” e notar que poderia precisar de um Advogado.
Não desanimei, mas continuei pensando em coisas desnecessárias. Pensei em envelopes com logotipo, organização dos livros na estante e tudo mais. Novamente, ninguém me disse que isso jamais traria algum cliente, tampouco tive a percepção da desnecessidade dessas preocupações.
Na primeira semana, nada aconteceu, assim como no primeiro mês, bimestre, trimestre… Com muitas despesas e sem receita (ou perspectiva de que alguém entraria em contato para me contratar), fiquei extremamente desanimado, como muitos leitores podem estar neste momento. Aliás, é para vocês que escrevo este texto.
Pensei em fazer concurso de novo, mas sabia que somente tomaria posse em um cargo em aproximadamente um ano, caso tivesse êxito em todas as fases. Não dava para esperar tanto assim para ganhar um centavo que fosse. Da mesma forma, não era o que eu queria.
Nesse momento, pensei em inúmeras loucuras. Fiquei muito perto de ter uma depressão. Será que cheguei a ter depressão? Não sei, pois já estava economizando o máximo possível e não consegui consultar um profissional.
A ideia de voltar para algum cargo público ganhava força. Imagino que esse é o sentimento que muitos têm quando iniciam na Advocacia e não conseguem os resultados esperados. Entretanto, eu sentia um peso enorme por já ter conquistado o cargo e aberto mão dele.
Lembrei-me de como era a vida enquanto atuava como Defensor Público. Acordava cedo, saía de casa antes das 9h, almoçava com pressa (e de terno), voltava depois das 18h com um malote cheio de processos para trabalhar à noite e nunca conseguia ter tempo para a minha família.
Como disse em outro texto (clique aqui), durante o meu tempo de Defensoria Pública, o excesso de trabalho fez com que eu deixasse de ligar para o meu irmão ao saber da notícia de que ele seria pai. Poucas semanas depois, ainda sem ter ligado para ele, fui informado do acidente no qual ele faleceu. Eu havia prometido para muitas pessoas (inclusive para mim) que não voltaria a trabalhar tanto e que faria tudo que fosse possível para trabalhar com qualidade e resultados, e não com uma grande quantidade de serviços e “vendendo” horas de trabalho. Somente assim conseguiria dar a atenção que minha família merece. Aliás, não vejo as mensagens privadas que me enviam exatamente porque tento passar o máximo possível de tempo (quando não estou trabalhando ou estudando) com a minha família.
Assim, percebi que fazer concurso não era uma boa opção. Na verdade, nem era uma opção viável. A única opção era continuar e fazer dar certo aquilo que foi o meu objeto de desejo por muitos anos: dar certo na Advocacia.
Até falhar nos quatro primeiros meses de Advocacia, eu achava que sabia tudo. Passei no concurso ainda durante a faculdade, fui primeiro colocado em todas as provas de estágio e achava que as provas da graduação eram incrivelmente fáceis.
Com essa mentalidade ridícula (depois descobri que era o “mindset fixo”. Sugiro a leitura do livro Mindset, de Carol S. Dweck), pensei que algo estava errado, mas o problema não era comigo. Eu me achava bom demais para estar errado.
Em uma análise rápida, culpei o mercado jurídico, o cenário político (era a época do impeachment de Dilma) e econômico (crise terrível no país), a falta de apoio da OAB, o trânsito, o calor, a falta de um bom livro sobre determinado tema, o fato de não conhecer ninguém na cidade, a falta de um estágio em algum escritório de Advocacia durante a graduação, a burocracia para abrir uma empresa no país, o cabelo que crescia muito rápido, a dúvida sobre deixar barba ou não, o vizinho que fazia muito barulho, o pé que eu torci e muito mais. É exatamente o que parece: coloquei a culpa do meu fracasso em muitas pessoas e coisas, mas não em mim.
Por algum motivo, vi algumas publicações na internet feitas pelo Flávio Augusto da Silva, um dos grandes empresários brasileiros. Naquele momento, eu ainda estava condicionado a anos de masturbação de currículo Lattes com inúmeras pessoas dizendo que não se deve ler um livro de alguém que não tenha doutorado e não seja professor de alguma universidade de ponta. O Flávio Augusto não era nada disso, mas, felizmente, abri uma exceção.
Comprei o livro Geração de valor e vi o quanto ele falava sobre assumirmos a responsabilidade por nossos fracassos. Perdoem a vulgaridade, mas, para refletir com fidelidade a impressão que tive do livro, posso dizer que seria como se alguém botasse o dedo na minha cara e dissesse: “se você é um merda, a culpa é sua”.
Comecei a ver que a responsabilidade era totalmente minha. Vi que eu não tinha a mínima ideia do que estava fazendo. Até então, pensava que poderia atuar tranquilamente como clínico geral e que os clientes surgiriam de algum lugar automaticamente, mesmo se eu estivesse escondido em uma sala no quarto andar de um prédio. Errado!
Pensava que o fato de ter um e-mail com o nome do escritório poderia me ajudar a prospectar clientes. Imaginava que o fato de ter mestrado e ser ex-Defensor Público ajudaria a atrair potenciais clientes. Tudo errado!
Dessa forma, percebi que eu estava totalmente desinformado. Queria agir e precisava fazer isso urgentemente, mas não sabia como.
Sabendo que a responsabilidade era totalmente minha, percebi que eu não era tão esperto quanto imaginava e que havia muitas coisas sobre as quais nunca tinha ouvido falar.
Virei muitas noites estudando tudo que encontrava sobre empreendedorismo, marketing pessoal e de conteúdo, prospecção, negociação, networking e tudo que fosse útil para começar a ter clientes.
Eu sabia de duas coisas: a culpa era minha e precisava começar a ter lucro rapidamente. Dessa forma, a solução era me preparar da forma mais rápida possível. Quando não há uma forma de voltar atrás, o único caminho é para frente.
Consumi todos os materiais disponíveis na internet, adquiri os principais livros de marketing jurídico (principalmente os da Lara Selem e do Felipe Asensi), comecei a encontrar muitos Advogados para fazer parcerias, aprendi que precisaria me especializar em apenas uma área, comecei a publicar textos e vídeos, passei uma madrugada inteira aprendendo a fazer o meu site (este que você está vendo. Somente contratei uma empresa para melhorar o site depois de um ano de publicações) e fiz muitas outras coisas motivadas por aquele fracasso inicial e pela certeza de que nada mudaria se eu não agisse.
Depois que as coisas começaram a dar certo, esqueci totalmente a ideia de fazer concurso público e decidi voltar para o Rio Grande do Sul. Em Brasília, estávamos longe das duas famílias (minha, que é do Rio de Janeiro, e da minha esposa, que é do Rio Grande do Sul).
No Rio Grande do Sul, morei perto de Porto Alegre e mantive a ideia de que deveria continuar agindo no sentido de tudo aquilo que eu havia aprendido em inúmeros livros, artigos e vídeos e que tinha testado em Brasília.
O excesso de publicações e a formação de boas parcerias fez com que eu começasse a trabalhar no que atualmente faço de forma exclusiva na Advocacia: consultas, consultorias e pareceres. Fazendo tudo isso por videoconferência, passei a “descumprir” o horário comercial. Posso folgar na segunda-feira, trabalhar em casa, na praça, enquanto visito os meus pais no Rio de Janeiro ou em qualquer outro lugar. Inclusive parei de usar terno, algo que abomino (respeito quem gosta de usar terno). Confesso: frequentemente, trabalho de pijama enquanto os meus cachorros se aninham no meu colo.
Em seguida, vim para Gramado, onde moro há dois anos.
Conquistei muitos dos meus objetivos na Advocacia: liberdade geográfica e de horários, atendimento quase que unicamente de Advogados (o papo é muito mais técnico), mais tempo para a minha família e outras coisas que deixarei para listar em outro momento.
O mais curioso é que a minha vida se transformou totalmente depois daquele fracasso dos quatro primeiros meses. Aquilo foi fundamental para mudar a minha mentalidade.
Quando calculo o tempo, acho incrível que tudo tenha mudado tão rapidamente. Pedi exoneração do cargo de Defensor Público no final de janeiro de 2015. Agora, escrevo este texto no dia 24 de maio de 2019, ou seja, cerca de quatro anos após aquela sensação de impotência dos primeiros meses de Advocacia em Brasília.
Não sei se consegui, mas as duas lições que eu gostaria de deixar para você são as seguintes:
- o que você está passando agora na Advocacia ou em qualquer outro desafio vai te preparar para tudo que virá pela frente;
- tudo pode mudar em pouquíssimo tempo. Aquele meu fracasso inicial foi há apenas 4 anos. Um ano após passar por tudo aquilo, minha vida era totalmente diferente e eu já conseguia dar risada de todo o desespero que tive no início.
Por fim, deixo como sugestão alguns vídeos e artigos sobre o meu início na Advocacia privada: