STJ

Evinis Talon

STJ: a instauração de procedimento investigativo contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente, configura a infração penal de denunciação caluniosa

28/09/2019

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Decisão proferida pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça no .AgRg no REsp 1471751/GO, julgado em 17/05/2016 (leia a íntegra do acórdão).

Confira a ementa:

PROCESSUAL PENAL E PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. LAVRATURA DO TERMO CIRCUNSTANCIADO DE OCORRÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. AFASTAMENTO. 1. De acordo com a descrição típica da conduta incriminada no art. 339 do Código Penal, “dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente”, basta para a persecução daquele ilícito. 2. Consta dos autos que os recorridos deram causa à instauração de investigação policial contra as vítimas, imputando-lhes crime de ameaça de que os sabiam inocentes. O Tribunal a quo, por meio do acórdão proferido, entendeu que o simples registro do TCO não é apto a configurar o delito, uma vez que a autoridade policial não havia realizado nenhum ato investigatório ou qualquer diligência para apurar a infração de ameaça noticiada. 3. Ocorre que, pela leitura do acórdão recorrido, os supostos autores do “crime de ameaça”, ao tomarem conhecimento do TCO instaurado, encaminharam-se espontaneamente à delegacia, e lá alegaram inocência e apresentaram um CD, com gravações que, em tese, comprovariam a inexistência das supostas ameaças, que tinham sido acusados de cometer. Diante da mídia retro mencionada, continua a Corte de origem, o delegado de imediato convenceu-se da inveracidade do delito de ameaça e logo instaurou inquérito para averiguar a denunciação caluniosa, ou seja, a autoridade policial, ouvindo as vítimas e assistindo às gravações levadas por elas, convenceu-se de que não houve o crime de ameaça. Dessa forma, não há como se afastar a prática do delito de denunciação caluniosa (art. 339 do CP), uma vez que houve mobilização policial, desde o registro do TCO até a análise do vídeo pela Autoridade Policial. 4. Ademais, a jurisprudência desta Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a instauração de procedimento investigativo contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente, configura a infração penal de denunciação caluniosa (art. 339 do CP). Precedente: RHC 56.564/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 20/10/2015, DJe 10/11/2015. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1471751/GO, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 25/05/2016)

Leia a íntegra do acórdão:

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA (Relator):

O agravo regimental não merece acolhida.

Com efeito, dessume-se das razões recursais que o agravante não trouxe elementos suficientes para infirmar a decisão agravada, que, de fato, apresentou a solução que melhor espelha a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria.

Portanto, nenhuma censura merece o decisório ora recorrido, que deve ser mantido pelos seus próprios e jurídicos fundamentos, in verbis:

 […]

O recurso merece acolhida.

Primeiramente, ressalto que a questão suscitada no presente recurso não demanda o reexame de provas, mas somente a valoração jurídica do fatos já delineados pelas instâncias ordinárias, não sendo a hipótese de incidência da Súmula 7 do STJ.

No presente caso, observa-se que o Tribunal a quo, ao absolver os recorridos pela infração ao art. 339 do Código Penal, assim consignou, no que interessa (e-STJ fls. 305/306):

[…]

Pois bem. No caso em tela, a autoridade policial não efetivou nenhum ato investigatório, não realizou qualquer diligência para apurar a infração de ameaça noticiada. Apenas registrou, em 15/01/2009, os termos circunstanciados de ocorrência, em que Márcio Moreira dos Santos e Vicente de Paulo Américo atribuíram a Deiber Ribeiro de Carvalho e Deiber Ribeiro de Carvalho Filho o crime de ameça (fls. 18/25).

Oportuno esclarecer, neste ponto, que Deiber e Deiber Filho ficaram sabendo dos TCO’s consoante informações prestadas em juízo, CD de fls. 87), e, espontaneamente, compareceram à delegacia alegando inocência, apresentando à autoridade policial um CD {fls. 41)com gravações que, em tese, comprovariam a inexistência das ameaças.

Diante da mídia retro mencionada, o delegado de imediato convenceu-se da inveracidade do delito de ameaça e logo instaurou inquérito para averiguar a denunciação caluniosa (fls. 02).

Nesse contexto, não fora efetivamente deflagrado procedimento de investigação para o crime de ameaça, “não se podendo considerar os meros atos investigatórios isolados (…) proporcionados pelo simples registro de uma ocorrência” (In Código penal comentado, Guilherme de Souza Nucci. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 930).

De tal sorte, inexistindo instauração de investigação policial, não se há falar em denunciação caluniosa, vez que a Administração da Justiça, bem juridicamente protegido pelo dispositivo legal em comento, não foi afetada.

[…]

De acordo com a descrição típica da conduta incriminada no art. 339 do Código Penal, “dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente”, basta para a persecução daquele ilícito.

Ora, consta dos autos que os recorridos, em 15/01/2009, deram causa à instauração de investigação policial contra as vítimas Deiber Ribeiro de Carvalho e Deiber Ribeiro de Carvalho Filho, imputando-lhes crime de ameaça de que os sabiam inocentes.

O Tribunal a quo, por meio do acórdão proferido, entendeu que o simples registro do TCO não é apto a configurar o delito, uma vez que a autoridade policial não havia realizado nenhum ato investigatório ou qualquer diligência para apurar a infração de ameaça noticiada.

Ocorre que, pela leitura do trecho transcrito acima, os supostos autores do “crime de ameaça”, ao tomarem conhecimento do TCO instaurado, encaminharam-se espontaneamente à delegacia, e lá alegaram inocência e apresentaram um CD, com gravações que, em tese, comprovariam a inexistência das supostas ameaças, que tinham sido acusados de cometer.

Diante da mídia retro mencionada, continua a Corte de origem, o delegado de imediato convenceu-se da inveracidade do delito de ameaça e logo instaurou inquérito para averiguar a denunciação caluniosa, ou seja, a autoridade policial, ouvindo as vítimas e assistindo às gravações levadas por elas, convenceu-se de que não houve o crime de ameaça.

Dessa forma, não há como se afastar a prática do delito de denunciação caluniosa (art. 339 do CP), uma vez que, conforme relatado pelo Ministério Público Federal, “resta claro que houve mobilização policial, desde o registro do TCO até a análise do vídeo pela Autoridade Policial”.

Ademais, a jurisprudência desta Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a instauração de procedimento investigativo contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente, configura a infração penal de denunciação caluniosa (art. 339 do CP).

Abaixo, o seguinte julgado:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA NÃO CONSTATADA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. 1. O trancamento de ação penal constitui “medida excepcional, só admitida quando restar provada, inequivocamente, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático-probatório, a atipicidade da conduta, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade, ou, ainda, a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito” (HC 281.588/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 05/02/2014) e que “só deve ser adotada quando se apresenta indiscutível a ausência de justa causa e em face de inequívoca ilegalidade da prova pré-constituída”. (STF, HC 107948 AgR/MG, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 14.05.2012). 2. De acordo com a descrição típica da conduta incriminada no art. 339 do Código Penal, dar causa à instauração de investigação policial contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente, basta para a persecução daquele ilícito. 3. Caso em que se comunicou crime de menor potencial ofensivo, com a lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência, que, após o encaminhamento ao Juizado Especial, foi arquivado por ausência de constatação do injusto penal apontado. 4. Ao provocar a instauração de procedimento investigativo em desfavor de seu ex-companheiro, imputando-lhe o crime de invasão de domicílio, a recorrente incorreu, em tese, na conduta descrita na infração penal de denunciação caluniosa, sendo descabido falar em ausência de justa causa para a deflagração da ação penal, fundada na suposta ausência de elemento objetivo para a tipificação. 5. Recurso ordinário em habeas corpus desprovido. (RHC 56.564/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 20/10/2015, DJe 10/11/2015) (grifos nossos).

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, para, afastada a absolvição dos recorridos do ilícito previsto no art. 339 do CP, restabelecer a sentença condenatória, determinando ao Tribunal a quo que prossiga no julgamento da Apelação n. 92896-55.2010.8.09.0044 (201090928963).

Publique-se. Intime-se.

Com essas considerações, nego provimento ao agravo regimental. É como voto

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Evinis Talon é Advogado Criminalista com atuação no Brasil inteiro, com 12 anos de experiência na defesa penal, professor de cursos de mestrado e doutorado com experiência de 11 anos na docência, Doutor em Direito Penal pelo Centro de Estudios de Posgrado (México), Doutorando pela Universidade do Minho (Portugal – aprovado em 1º lugar), Mestre em Direito (UNISC), Máster en Derecho Penal (Universidade de Sevilha), Máster en Derecho Penitenciario (Universidade de Barcelona), Máster en Derecho Probatorio (Universidade de Barcelona), Máster en Derechos Fundamentales (Universidade Carlos III de Madrid), Máster en Política Criminal (Universidade de Salamanca), especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direito Constitucional, Filosofia e Sociologia, autor de 7 livros, ex-Defensor Público do Rio Grande do Sul (2012-2015, pedindo exoneração para advogar. Aprovado em todas as fases durante a graduação), palestrante que já participou de eventos em 3 continentes e investigador do Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) de Portugal. Citado na jurisprudência de vários tribunais, como TRF1, TJSP, TJPR, TJSC, TJGO, TJMG, TJSE e outros.

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