Da leitura do art. 158 do Código de Processo Penal, observa-se que todo delito que deixar vestígios dependerá de exame de corpo de delito para a constatação de sua materialidade: “Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.”
Aliás, como expresso no dispositivo supra, nem mesmo a confissão do acusado poderá suprir a ausência do exame de corpo de delito.
Em caso de já terem desaparecido os vestígios do crime, a prova testemunhal poderá suprir sua falta, mas somente quando não for possível a realização do exame (art. 167 do CPP).
Como é sabido, o conjunto probatório é de extrema importância no processo penal. As provas são utilizadas para comprovar ou refutar a versão apresentada pela acusação na peça exordial, servindo para o convencimento do Juiz ou dos jurados.
Como regra, a materialidade de uma infração penal é comprovada por meio de exames periciais e prova testemunhal, com a observância dos princípios do devido processo legal e garantindo ao acusado seu direito de defesa.
Não se pode confundir o exame de corpo de delito com as perícias em geral. O exame de corpo de delito é a perícia feita sobre os elementos que constituem a própria materialidade do crime, enquanto as demais perícias são realizadas em outros elementos que afetam apenas o convencimento do juiz (LOPES JR, 2014).
A falta de comprovação da materialidade da infração, quando indispensável o exame do corpo de delito (direto ou indireto), leva à nulidade do processo ou, ainda, à absolvição, em razão da presunção de inocência. Ora, se não há provas suficientes para a condenação, a absolvição é medida que se impõe, com fulcro no art. 386, VII, do CPP.
É essencial que o Estado, seja durante o inquérito policial, seja durante o processo, preserve as normas que ele mesmo instituiu. Assim, não é concebível que a autoridade policial e o órgão acusador, representantes do Estado na persecução criminal, descumpram as formalidades referentes à realização do exame de corpo de delito. No processo penal, tais formalidades constituem direitos intrinsecamente ligados ao devido processo legal.
Ainda, destaca-se que o exame de corpo de delito também diz respeito às qualificadoras e causas de aumento de pena de um crime (furto qualificado mediante rompimento de obstáculo, por exemplo – art. 155, §4º, I, do CP).
Urge destacar que a exigência do exame do corpo de delito não tem relação exclusiva com o direito de defesa, pois também pode oferecer suporte à denúncia.
Ademais, a ausência do corpo de delito constitui nulidade, nos termos do art. 564, III, “b”, do CPP:
Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: […]
III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: […]
b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167;
Se o exame de corpo de delito não é realizado, há nítido prejuízo à defesa, porque ocorre uma desconsideração do meio legalmente exigido para demonstrar a materialidade do crime.
Sobre essa nulidade, cita-se uma decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:
[…] 1. O crime de lesões corporais, por se inserir dentre aqueles que deixam vestígios, tem sua materialidade submetida à comprovação por meio de exame de corpo de delito, conforme o regramento inserto no artigo 158, do CPP. 2. O suprimento de tal requisito, na forma do art. 167, CPP, somente é admitido em caráter excepcional e desde que, por razões naturais, tenham desaparecido os vestígios. Portanto, a inércia do Estado ou o não comparecimento da vítima ao local do exame, tempestivamente, não suprem a exigência legal, máxime quando vacilante a prova testemunhal coligida e não encontrada a Guia do mencionado atendimento em nosocômio público. […] (TJ/DF, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais, Acórdão n.288647, 20040910095173APJ, Rel. Sandoval Oliveira, julgado em 16/10/2007)
Referência:
LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
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